Celso Niwa 20/06/2023
Cultura em declínio
A cultura não é algo que se apreende completamente, mas é uma perfeição que o indivíduo almeja, aspira, e a vontade pela perfeição deve estar presente no grupo e na sociedade em que ele vive. "Eu sou eu e minha circunstância, se não a salvo, não salvo a mim mesmo", disse Ortega Gasset.
Quando se considera a cultura um bem possível de ser transmitido totalmente pelo Estado e por uma elite separada da sociedade, deixamos de considerar o florescer orgânico de suas partes. Cultura é o cultivo da mente e do espírito, como ensinou Cícero. A cultura abarca a religião, a ciência, a filosofia, a arte, a civilidade, mas, antes de ser um bem possível de ser oferecido ao povo pelo ensino, por políticas públicas e por organizações culturais, a cultura é construída pouco a pouco, através de duras lutas. É uma herança passada de geração em geração, é um modo de viver transmitido principalmente pela família, um núcleo que tem uma ligação profunda com o passado, o presente e o futuro de cada um de seus membros, onde o indivíduo é parte integrante e agente responsável pelo lugar que cada um ocupará na sociedade.
Além disso, existe uma relação entre cultura e religião. Não existe historicamente cultura sem a presença de uma religião, e quanto mais universal for a sua presença em outras regiões, maior será sua agregação cultural, melhor é o desenvolvimento criativo e mais avançada a cultura se torna.
Porém, toda sociedade em nível avançado de cultura acaba por declinar. As classes são resignificadas pela especialização e, junto com isso, surge o fanatismo, o ceticismo, o cientificismo, o materialismo, um romantismo idólatra camuflado pelo culto ao avanço, pela busca de igualdade, não sendo nada mais do que um processo da evolução. Então, os membros que deveriam interagir e articular para a saúde do corpo e a edificação do espírito passam a se ver independentes umas das outras. Ciência, filosofia, religião, artes e política acabam buscando cada vez mais autonomia e, com isso, reduzem o todo pelas suas partes, como um filho rebelde e ressentido que, antes de andar pelo vale de lágrimas, apaga o seu passado rumo a um futuro incerto, mas sem antes requerer uma parte ou toda herança.