spooky buk 19/03/2018
Só magia TOP!
Esse livro inteiro foi narrado, dentro da minha cabeça, pelos comediantes do programa Choque de Cultura. Não é à toa que a autora se apresenta como uma das pessoas integradas ao grupo responsável pelas péssimas condições do jornalismo brasileiro recente. Refere-se ao "doutor" Roberto marinho como homem visionário, que praticamente inventou a tv no Brasil. Diz ter colocado online a página da revista Época "para o mundo, mas ESPECIALMENTE para o DOUTOR Roberto..."
Fala um monte de besteira o tempo inteiro, num desespero constrangedor pra se validar como profissional, jornalista, cientista e até filósofa! Com expectativas de validação do tipo "Morei nos Estados Unidos nesse ano, então sei do que estou falando..." ou então explicando coisas ridículas como se fosse uma especialista, do tipo "Tivemos um encontro tomando café - bebida produzida a partir dos grãos torrados do fruto do cafeeiro...", ou ainda criando aparências de grandes citações e conhecimento técnico pra falar banalidades, do tipo "...como dizia Jacques Derrida (1930-2004), 'Mudemos de assunto'"
É constante e insistente o uso de uma linguagem cuja falta de rigor é uma vergonha pra qualquer jornalista. Um defeito que se torna muito pior ainda quando uma profissional dessas pretende se misturar com a ciência. Um exemplo:
"Para o pai do hipertexto, Ted Nelson, o conceito de texto elástico (stretch text), aquele que se expande e se contrai conforme as solicitações do leitor, faz com que o internauta assuma o comando da ação, trocando filmes, vídeos, diálogos, textos, imagens como se estivesse numa grande biblioteca digital.”
O pai do hipertexto saiu por aí dizendo pros outros que UM CONCEITO (que é uma representação geral e abstrata) tem FEITO coisas com os outros? O conceito de texto elástico está pegando gente na rua e prendendo na frente de um volante? Como é que o conceito vai fazer com que o internauta assuma o comando de alguma coisa?
Quer dizer, é a POSSIBILIDADE do stretch text - é o stretch text EM SI MESMO - que está OFERECENDO A POSSIBILIDADE de que o internauta tome o comando. Mas a autora não sabe escrever direito, então ela acaba dizendo essas coisas, porque quer colocar umas palavras e expressões "impressionantes" no meio do texto "científico" dela; como por exemplo "conceito de".
O vocabulário dela não é o de uma jornalista – muito menos o de uma cientista. É o vocabulário de uma marqueteira, que inclusive assume as horas que passou criando um site que levasse o leitor a “voltar toda hora”. Como era de se esperar, o livro inteiro demonstra e considera ZERO a responsabilidade social do jornalismo.
Ela passa o tempo todo glorificando trabalho escravo. Falando que o jornalista hoje precisa escrever, fotografar, filmar, gravar áudio, diagramar, dirigir o carro, vender o anúncio e preparar o café do chefe sozinho. Repetitivamente dá a entender que não ter vida e adoecer em nome do trabalho é uma coroa de glória.
Conta com orgulho como ela teve uma reunião com algum engravatado (cujo nome ela cita, mas eu não me lembro) lacaio do "Doutor" Roberto, e recebe dele um trabalho monumental acompanhado da frase:
"Mas você só vai ter UM jornalista pra te ajudar"
Então ela conta sobre o jornalista contratado por ela passar o dia trabalhando e ela passar a noite surfando na internet, em chats e brincadeiras divertidas que todo mundo usando a internet em 98 lembra bem – uma atividade que, nas palavras dela, parece coisa de cientista flutuando no espaço pra salvar o mundo.
Nunca somos oferecidos o nome do jornalista que efetivamente trabalhou no site do qual ela se orgulha.
Apesar desses defeitos, o livro propõem questões intrigantes e de muita importância, como por exemplo:
"Como explicar para um diagramador que veio da Veja, trabalhou nas principais revistas, que não podemos ter sombra na web, que a cor precisa ser “chapada”, sem dégradé, para poder carregar rápido e dar uma boa leitura?"
Na hora a nossa criatividade é estimulada e a gente pensa numa resposta perfeita:
"Falando pra ele que na web nós não usamos sombra e que a cor precisa ser chapada, sem dégradé?"
Li o livro inteiro, porque caiu na bibliografia de uma prova que pretendo fazer, mas não recomendo. Do ponto de vista científico, esse livro serve apenas como estudo antropológico de um mal exemplo.
-Destaque para o trecho em que ela relata voltar ao site da revista Época - depois que já tinha sido "desligada" do projeto - e, não encontrando online as edições antigas da revista (das quais ela havia participado) senta pra DENUNCIAR o caso no livro e começa a criticar as mesmas coisas que vinha glorificando; clamando do Ipiranga às margens plácidas que é preciso tirar os sites jornalísticos da mão dos gerentes e dar para os jornalistas de verdade kkkkk