Rosa Santana 01/03/2023
Condutor de histórias: O LIVRO DOS SONHOS!
?Cada um é testemunha de que há outra vida para o sonhador.?
H. Garro, Todo o mundo (1918)
Admirada com a erudição de Jorge Luis Borges! O autor de ?O Livro dos Sonhos? faz, aqui, um compilado dos sonhos descritos ao longo do tempo, na história da humanidade. Começa por aqueles descritos na Bíblia e segue o sonhar dos homens. Mas há, também, narrativas datadas de antes de Cristo, como os descritos por Homero, na Odisseia: como os dos Hititas, datados do segundo milênio antes de Cristo, entre outros.
Nesse desfile, o autor nos conduz à longínqua caminhada humana no planeta e nos diz o quanto, para eles, era importante sonhar! Mas, sobretudo, mostra as diferenças culturais ao longo do tempo e da dimensão do espaço! Sempre tratando o sonho com o mistério que ele encerra: a alma sai do corpo, enquanto sonhamos? Seu conteúdo é, mesmo, premonitório, digno de credibilidade? Podem eles ser uma forma mediúnica de manter vínculo com pessoas já falecidas a fim de obter algum ensinamento? São transmissões de mensagens das entidades espirituais para o sonhador? Representa um contato do homem com o divino? Em todas essas vertentes, sempre o caráter mágico e mítico das imagens oníricas estudadas pela psicanálise, neurociência, pelas religiões, mas, ainda hoje, sem que se tenha uma palavra final sobre o valor e sobre o caráter delas.
SONHO: até a palavra é, ela mesma, diáfana, vaporosa, e nos remete ao mistério e à insondável caminhada humana pelo planeta!
LIVRO: é o que nos conduz a outras histórias, a outras vidas, a outros sonhos! Assim, O LIVRO DOS SONHOS!
Transcrevo aqui alguns dos que mais gostei e que comprovam minha modesta análise:
A ALMA, O SONHO, A REALIDADE (trecho)
(?) Quando um daíaque sonha que caiu na água, pede ao feiticeiro que pesque seu espírito com uma rede, coloque-o em um recipiente e o devolva. Os santalis falam do homem que adormeceu e sonhou que tinha tanta sede que sua alma, em forma de lagarto, deixou o corpo e meteu-se em uma vasilha para beber; o dono da vasilha, porém, tapou-a, e o homem, impedido de recuperar sua alma, morreu. Faziam-se os preparativos para o enterro quando alguém destapou a vasilha e o lagarto escapou, reintegrou-se ao cadáver, e o morto ressuscitou. Disse que havia caído em um poço em busca de água e que tivera dificuldades para voltar; assim todos o entenderam.?
James George Franzer, O ramo de ouro (1890), in: O Livro dos Sonhos, 109
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QUE PASSE
Ah, Muito bem! Façam entrar o infinito!
Louis Aragon, in: Borges, Jorge Luis, O livro dos sonhos, 119
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ROMÂNTICA
Uma vida desfrutada é um sonho de adolescente realizado na idade madura.
Alfred de Vigny, in: Borges, Jorge Luis, 117
O SONHO DE TCHUANG-tse
Tchuang-tse sonhou que era uma borboleta e não sabia se, ao acordar, se era um homem que tinha sonhado ser uma borboleta, ou uma borboleta que agora sonhava ser um homem.
Herbert Allen Giles, Tchuang-tse (1889). In, Jorge Luis Borges, O livro dos sonhos, pag 129
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TEOLOGIA
(?) a crendice peregrina que encontrei na Asa Menor, entre um povo de pastores que se cobrem com peles de ovelha e que são herdeiros do antigo reino dos Magos. Essa gente crê nos sonhos. ?No instante em que dormes?, explicaram-me, ?conforme tenham sido teus atos durante o dia, irás ao céu ou ao inferno.? Se alguém argumentasse : ?nunca vi partir um homem adormecido; de acordo com minha experiência, permanecem deitados até que os despertem?, responderiam. ?O afã de não acreditar em nada te leva a esquecer tuas próprias noites (quem não terá conhecido sonhos agradáveis e sonhos aterrorizantes?) e a confundir o sono com a morte. Cada um é testemunha de que há outra vida para o sonhador. Para os mortos é diferente o testemunho: eles permanecem convertendo-se em pó?.
H. Garro, Todo o mundo (1918). In: Borges, Jorge Luis; O Livro dos Sonhos, página 157