spoiler visualizarYellowPepper 04/11/2023
É atemporal porque é triste
Tenho por mim algo que absorvi dos meus melhores professores. Algo que só depois de me livrar dos preconceitos linguísticos, de leitura e dos meus receios mesmo pude concordar, com movimentos de cabeça e tudo: um clássico é aquilo que consegue fazer você pensar.
E é legal pensar dessa forma, porque assim conseguimos, mesmo não analisando em um curso ou em um artigo redigido, entender porque ainda lemos livros como Ilíada ou Os Sofrimentos do Jovem Werther. Porque é claro que um homem sacudo transando com deusas, lutando em guerras e fazendo de tudo para voltar para sua família nuclear é algo que impressiona as pessoas ainda hoje. ( É brincadeira. As pessoas realmente gostam desse livro atualmente pelo musical)
E esse tal de Werther não foge muito dessa linha. Por que entenda bem, meu leitor meio desocupado: por mais que os seres humanos gostem de se vangloriar das suas conquistas, do seu passado e das suas grandíssimas histórias, as coisas são bem menos glamorosas quando se chega no final do dia e não se consegue dormir pelos pensamentos se atropelando na própria cabeça. Ou quando a coisa que você mais ama na vida simplesmente... Perde o brilho.
O livro é atemporal e é um clássico porque antes de tratar de amor não correspondido, que infelizmente está na nossa sociedade antes mesmo que o A03 sequer tivesse pernas, ele trata da tristeza. Do sofrimento mesmo. De uma pessoa que aos pouquinhos vai perdendo tudo. De pensamentos intrusivos e danosos, de se afastar das pessoas que ama porque acha que não é bom ou está fazendo mal para elas em só existir. De querer mudar, e acabar só caindo no poço cada vez mais e mais.
Claro, Goethe não deveria estar muito preocupado com o dano que um livro assim poderia causar EM FUCKING 1774, então não vamos culpar ele muito pelo final bosta do livro (porque independente da época, foi um final bosta, mas perdoamos o finado véio) e pela onda de suicídios que ocorreram depois da publicação. Mas agora, com toda a internet e o caso não tão recente de 13 Reasons Why, sabemos que essas coisas devem ser tratadas com mais tato. E é bom, porque essas coisas não vão deixar de existir.
A tristeza inerente da humanidade, que muita gente confunde com falta de CLT ou drama, não vai deixar de ser retratada e não vai deixar de existir. Somos tristes porque estamos vivos, porque viver pode ser uma merda em muitos momentos. Porque ser brasileiro, pobre, mulher, negro, indígena, gay, lésbica, bi, trans, trabalhador, desempregado, deficiente, neurodivergente, professor e só LEVANTAR às vezes é demais. O mundo cobra muito da gente, e nem sempre conseguimos dizer " Ah, vai pá 🤬 #$%!& " em troca. Mas isso também não quer dizer que é um final.
Os Sofrimentos do Jovem Werther só não dá jus ao seu nome por conta do seu final. Porque o sofrer aqui seria viver, mas a história inteira gira entorno de um final pacífico e vazio. Na morte não sofremos, porque não sei qual sua religião, mas não acredito que no céu, no vazio do universo ou no limbo precisemos pagar boleto. Ao morrer, o protagonista acaba com seu livro, com sua história e com seu sofrimento.
Mas quem é Werther sem ser jovem e sofrido? É a sina de qualquer um, amig@. Independente da idade, vai haver momentos da sua vida que você nunca vai se sentir mais pequeno, jovem e em sofrimento que esse bananão aqui. E é exatamente isso que nos garante que estamos vivos. Que podemos acordar amanhã e rir da cara do Werther por fazer esse drama todo só pra comer a esposa do outro. Porque somos humanos, estamos vivos, e vamos sofrer, Porque o livro sempre acaba quando não há mais desventuras para contar, e as desventuras podem não ser a coisa mais agradável do mundo. Mas não chega nem perto da dor de terminar um livro e não poder sentir mais nada com ele.
Enfim. Filosofei demais. Werther, saiba que no meu final verdadeiro você não se mata e começa um trisal com a Lotte e o marido gostoso dela. É o que você merecia, mas Goethe tinha que ser dramático. E monogâmico. Triste fim, triste fim.