wesley.moreiradeandrade 11/01/2017
Ao fazermos a leitura de Os Lusíadas, clássico português de Luís Vaz de Camões, empreendemos uma jornada cheia de obstáculos tais quais os enfrentados por Vasco da Gama em sua viagem rumo às Índias no épico lusitano. Obstáculo do tempo: o poema data do século XVI, época das grandes navegações. Obstáculo da linguagem: por pertencer a um período antigo, os termos empregados por Camões em sua obra necessitam em boa parte do auxílio de um dicionário. Obstáculo das referências históricas e cultura clássica: as diversas alusões aos mitos greco-romanos e a personagens célebres da história pregressa de Portugal pode confundir o leitor menos íntimo a estas informações. Considerando todas estas implicações, o que torna Os Lusíadas uma obra imortal e relevante até hoje é o modo como Camões teceu seu trabalho monumental. Sabendo que a epopeia visa à expressão das conquistas de uma nação e tem na figura do herói aquele que carrega em si as qualidades e a coragem de um povo, fica evidente que Camões tinha um fato ainda muito recente na história portuguesa (a descoberta da rota para as Índias) e também um herói incipiente (Vasco da Gama) e, com tão pouco, teve que valer-se não somente de seu talento de poeta assim como de sua habilidade romanesca para entrelaçar história, mitologia e estilística num trabalho só.
A trama de Os Lusíadas divide-se em três planos: o da viagem em si, liderada por Vasco da Gama; o plano mitológico centralizado no antagonismo de Baco e na interseção de Vênus em favor dos portugueses; o plano histórico, onde os fatos mais importantes da nação de D. Sebastião são recuperados ao longo do poema. Os dois últimos planos muitas vezes gerando maior interesse que a própria viagem, uma vez liderada por Vasco da Gama, um herói que, comparado a Aquiles (de A Ilíada), Ulisses (de A Odisseia) e Enéas (da Eneida), apenas para ficarmos entre os grandes heróis épicos da cultura clássica, pouco age e é constantemente eclipsado por outros personagens da epopeia camoniana.
Mas o protagonista real de Os Lusíadas é justamente a linguagem empregada por Camões, a maneira como o escritor português transformou todos esses elementos em poesia. Longe de querer fazer uma análise formal (já é de conhecimento de boa parte que o poema se estrutura em oitavas com versos decassílabos), o destaque é a carga dramática das situações retratadas, o lirismo e a inventividade dos versos repletos de hipérbatos. Passagens como a morte de Inês de Castro, do Gigante Adamastor, da Ilha dos Amores são sempre lembradas, porém é na fala do Velho do Restelo que Camões deixa entrever que a sua homenagem aos portugueses e as grandes conquistas de sua nação não está isenta de críticas, julgando a cobiça e ambição que levaram a tais empreendimentos. Sinal de coragem de Luís Vaz de Camões em não fazer de Os Lusíadas, um produto meramente ufanista e cego ao imperialismo vigente. Mostrar o homem pleno de suas capacidades de realizar as conquistas e os avanços que deseja, mas cujo afã pode levar à deturpação dos valores humanistas que regeram o pensamento daquela época.
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