lucasfrk 22/09/2024
História da eternidade ? comentário
História da Eternidade, de Jorge Luis Borges, é uma incursão profunda e labiríntica no tempo, no infinito e na linguagem. Publicada em 1936, um ano após a célebre História Universal da Infâmia, a obra com título paradoxal se apresenta como uma antologia de ensaios que se entrelaçam numa rede de ideias sobre a natureza do tempo, a história e a criação literária ? exigindo então uma leitura atenta e reflexiva. Ao invés de seguir uma linha linear e histórica, Borges procura elaborar uma espécie de ?biografia da eternidade?, desafiando a noção tradicional de tempo como uma cadeia ordenada de eventos, bem como propondo uma visão mais cíclica. Essa perspectiva é evidente em temas recorrentes como o eterno retorno, o infinito, a repetição e a imortalidade.
A coletânea traz sete ensaios: i) História da eternidade, que explora de forma abrangente as noções de tempo e de eternidade; ii) As ?kenningar?, que faz uma análise da poesia islandesa; iii) A metáfora, onde há uma reflexão de seu poder imagético, bem como sobre a natureza da linguagem e sua capacidade de criar mundos; iv) A doutrina dos ciclos, uma exploração da ideia de tempo cíclico e do eterno retorno; v) O tempo circular, que realiza uma análise das diferentes concepções de tempo presentes na história da filosofia; vi) Os tradutores d?as mil e uma noites, onde é feita uma reflexão sobre a tradução e a interpretação de textos antigos; e vii) Duas notas, em que ocorre discussões sobre temas diversos, como a memória e a identidade.
Dialogando com filósofos como Platão e Agostinho, com poetas como Francisco de Quevedo, e com pensadores modernos como Schopenhauer, Nietzsche e Russell, Borges explora a capacidade da linguagem de criar mundos, de transcender o tempo e o espaço. Através da análise das ?kenningar?, metáforas da poesia islandesa antiga, ele demonstra como a linguagem pode condensar o infinito numa única expressão. No entanto, o autor também reconhece os limites da linguagem, sua dificuldade de capturar a totalidade da experiência. Através de suas análises autênticas e provocativas, o autor procura questionar as noções convencionais sobre o tempo, a história e a realidade.
Como mostram as duas epígrafes, Borges é um autor de referências, e aqui ele recorre a recursos retóricos de modo a convencer o leitor de suas ideias (a utilização da segunda pessoa da narração, a inserção dele próprio no texto, as metáforas e as comparações são alguns exemplos). Desta forma, sua opinião vai sendo colocada de maneira sutil, visto que ele não busca uma definição correta e/ou definitiva de eternidade, mas sim apresenta teses para que o leitor tome um posicionamento. Ademais, na última parte do primeiro ensaio, Borges, depois de apresentar vários pontos de vista ? e a sua própria, ainda que nas entrelinhas ? define a eternidade numa forma de escrita elegante, utilizando metáforas e comparações, sendo escrito de maneira quase onírica. Nessas pouco mais de cem páginas, fica notório a imensidão imaginativa desse escritor argentino.