Camila do Projeto Invisível Visível 07/07/2021
Resenha de "A Chama Negra" (#4)
“A Chama Negra”, de Pamela Guerardt, é o segundo livro da Trilogia Lado Fantástico, iniciada com “A Dama Branca”.
Nesta altura da narrativa, já conhecemos razoavelmente os personagens que acompanham a protagonista Lexi; definitivamente já fomos apresentados à sua nova vida e ao lado B da sua família, bem como às outras Damas e amigos. Mas o fato é que, até o início d’A Chama Negra, somente tivemos um vislumbre do Lado Fantástico, havíamos passado quase a totalidade do tempo ainda no lado puro - embora a minha sensação pessoal foi a de que não pareceu ser exatamente assim, afinal, tivemos contato com fadas, sereias, damas, cavalheiros, raposas falantes, ogros, um pégaso, árvores que mudam de lugar de um momento para o outro e até uma avres... Sim, tudo isso aconteceu antes mesmo de conhecermos o Lado Fantástico.
No segundo livro, passamos da história de origem da heroína para uma trama um pouco mais política e de aventura. Após os eventos d’A Dama Branca, sabemos que Lexi já começara a desempenhar suas responsabilidades perante a família real e o povo de Farmedia. Mas existe uma peculiaridade nessa Dama Branca que o povo ainda desconhece - a qual definitivamente tem enorme potencial de uso político nas mãos de alguém com experiência e motivação suficientes. Além disso, como consequência da batalha final contra o vilão Zarak, Lexi tem um assunto familiar pendente de enorme urgência a resolver, o qual não pode aguardar o desenrolar de trâmites diplomáticos que a jovem não possui a menor aptidão inata para desenvolver sozinha. É uma questão de vida ou morte, literalmente. Mas pode ser que haja uma solução. O problema é que a única a acreditar é a própria Lexi, que não é a fonte mais confiável sobre assuntos fantásticos, visto que acabara de tomar conhecimento até mesmo da existência do Manto que separa os dois lados apenas alguns meses antes. É claro que ela não tem repertório suficiente para dizer que alguma lenda pode ou não ser verídica quando até mesmo grandes estudiosos ainda não têm essa perspectiva, então aqueles que cresceram conhecendo o Lado Fantástico permanecem não convencidos. Mas, convencidos ou não, o plano necessário para alcançar o objetivo de Alexia envolve conduzir-nos por uma espécie de excursão ao mundo fantástico, com o fim de contatar os líderes dos diversos povos de Farmedia. Se ainda não tínhamos visto tanto do Lado Fantástico com nossos próprios olhos, se até então tivéramos que obter a maior parte das informações disponíveis através das falas de outros personagens, a partir d’A Chama Negra já não poderemos dizer o mesmo.
Dentre todas as qualidades da escrita de Pam Guerardt, a sua maestria está no desenvolvimento para o clímax na segunda metade do livro, após nos apresentar uma construção inicial da trama que não nos abre brechas para saber com certeza o que está acontecendo ou o que está por vir. Ela conseguiu o feito em “A Dama Branca” e o repetiu aqui. O setup não entrega a história completa e a surpresa é certa; a narrativa, que já é extremamente interessante, instigante e inventiva desde o princípio, em dado ponto toma contornos diferenciados e nos leva ao inimaginado. Da mesma forma que no seu livro de estreia, os indícios estão presentes, mas a montagem do quebra-cabeças é exclusiva dela. O mundo criado nos convida a querer entendê-lo e desvendá-lo mais e mais e é certo que esse conteúdo não se esgotará tão cedo: enquanto a autora estiver disposta haverá o que ser dito.
Dito isso, o ponto de oposição é que nem sempre as explicações e construções sobre esse funcionamento interno me satisfizeram ou convenceram. Porém, até nos momentos em que não necessariamente concordei com o posicionamento conclusivo, continuou sendo claro para mim o quão respeitável é esse cuidado criativo particular e os seus detalhes.
A autora experimentou mais, mostrando a evolução da sua arte. Especialmente os deslocamentos de ponto de vista entre personagens podem captar a atenção dos leitores. Ela também veio trabalhando outros formatos de escrita, apresentando-nos no corpo do seu romance duas entradas de cartas e um conto.
Como não poderia faltar em se tratando da trilogia Lado Fantástico, os conteúdos extra marcam forte presença: dentro do livro físico, estão dispostos uma parte da narrativa original sob o ponto de vista de outra personagem, uma seção de curiosidades e detalhes, organizada em listas por temas, uma letra de música escrita especialmente para a obra (e a forma de acesso ao áudio da música gravada, mas esta está oculta; não procure, pois ela se apresentará na hora certa) e o QR code da famosa playlist dos livros, disponível no Spotify. Externamente ao livro, a fantasia já conta com a própria coleção de roupas e caneca e até com um spin off, o conto “Coração de Rubi”.
“A Chama Negra” está disponível em formato físico no site da autora.
site: https://medium.com/o-invis%C3%ADvel-vis%C3%ADvel/resenha-de-a-chama-negra-4-b0fc4d75beb8