Lane 03/07/2012Me chamam de Artêmio Fúria“(...) Amo-te desta maneira inefável que é difícil compreender.”
E com essa frase intensa eu vou tentar colocar em palavras a intensidade que é a leitura deste livro.
Sebastian de Lacy é um menino de 8 anos que enquanto assiste seus pais serem mortos e sua irmã ser seqüestrada por bandidos, se menospreza por fazer xixi na roupa.
Este menino inconformado por ver seu fracasso em conter suas próprias emoções, após ser resgatado de seus infortúnios pelo padre Ciriaco, que o entrega aos cuidados dos índios e de seu irmão Belisário, se afunda no convívio de si mesmo e decide que dedicará a sua vida a vingar a morte de seus pais.
As únicas pessoas que ele deixa aproximar do menino que ele foi um dia é o padre Ciriaco, Dom Belisário e seu peni (que significa irmão na língua indígena) Calvú Manque ( aliás, a amizade entre os dois é algo tão leal e forte que nos leva a profundos questionamentos sobre amizade).
Dessa forma, torturado por seus conflitos internos ele deixa de ser Sebastian de Lacy e passa a ser Artêmio Fúria, um homem loiro de lindos olhos azuis, forte, másculo, viril, violento, temido por seus inimigos e até por seus amigos, de onde provém esse sobrenome Fúria, que significa: ele tem o gênio curto.
Artêmio Fúria gaúcho raro e temido é o protagonista desta trama histórica que narra os fatos a partir de 1790 e é dividido em 3 partes:
- A primeira que fala de Sebastian de Lacy e é marcada pelo menino que um dia o pai mostrou o brasão da família e declarou pra ele que nas suas veias corriam sangue milenar: “Lembra-te de quem tu és” disse seu pai, e como isso ele faz seu juramento de vingança.
- A segunda parte que começa em 1820, onde um homem mutilado no corpo e na alma recupera o que é seu por direito e à medida que avançamos na leitura somos arremessados para a terceira e maior parte desta história.
- Na terceira parte conhecemos a verdadeira história de Artêmio Fúria e Rafaela das Flores e colateralmente o leitor tem um deslumbre sobre a história de um país em estado de revolução. Somos literalmente impelidos a viajar através do tempo indo de encontro a uma perfeita narração de fatos históricos sobre a Revolução de maio de 1810 na Argentina. O contexto, os cenários sócios e políticos de uma geração que buscava sua independência são escritos com tanto esmero e destreza pela autora, que elabora um enredo instigante.
Rafaela Palafox e Binda conhecida como Rafaela das Flores, é uma menina bem nascida, filha única, criada com aparato junto das tias e seus primos, que vê sua realidade mudar quando o pai é exilado por questões políticas. Diante da dura realidade, Rafaela ultrapassa os limites morais da sociedade e trabalha vendendo perfumes para sustento e manutenção de sua família.
Artêmio Furia fica curioso em conhecê-la desde a primeira vez em que a vê saindo de uma loja de perfumes, onde depois ele entra e compra um frasco do perfume e até usa com sua amante. Mas sua curiosidade não é saciada apenas com um frasco de perfume, ele precisa conhecer a autora que criou a essência que cativou seu olfato.
Quando descobre que a moça dos perfumes é Rafaela e que ela é a proprietária de umas terras que precisa de ajuda com o gado, Artêmio que antes tinha negado o pedido de ajuda de seu amigo se prontifica imediatamente.
O encontro dos dois é o marco inicial para uma densa e linda história de amor.
O envolvimento deles é tumultuado, profundo e intenso, Rafaela sabe que Artêmio Fúria será sua ruína social, mas em nenhum momento ela deixa influenciar pelos que os outros dizem. Pra ela o que prevalece é Artêmio Fúria com seu jeito grosseiro, justo, livre de preceitos e preconceitos. De imediato ela se encanta por ele não se opor e apresentar resistência a Mimita, uma menina que tem retardamento mental e que todos a tratam como se ela fosse uma aberração.
Rafaela das Flores é assim, aparentemente fraca, mas corajosa e bondosa, uma mulher que como toda mulher às vezes se sente feia e insegura e que admira o homem de força destemida e compreende o menino que fez xixi nas calças ao ver seus pais serem mortos. Ela ama por completo, se entrega ao Artêmio inteira, não se incomoda com as diferenças entre eles (e são muitas!), não se abala com as dificuldades.
E ela e Artemio se entregam ao amor, a paixão ardente e possessiva, junto com a revolução.
Em cada toque deles eu experimentava uma doçura e era quase como se estivesse entre eles sentindo o ardor e a ânsia incontrolada.
Mas ao tempo em que eu sentia o açúcar, Artêmio embrenhado em sua sofreguidão por vingança, o coloca numa panela e o inflama de tal maneira que senti repulsa por ele e meu coração ficou dilacerado.
O livro não é para corações fracos, seus personagens são fortes, o romance não é o que parece que vai ser, muitas conspirações, várias surpresas no enredo deixam o leitor imerso na leitura.
Ficaram algumas pontas sem se fecharem, no entanto não alteraram o desenvolvimento da história. Outras coisas que eu gostei e achei interessante: o anel de claddaght que é um anel usado na Irlanda e simboliza o amor e amizade e o puma Quinto, que apesar de ser um animal foi um personagem com presença significativa no enredo.
Mas a autora é digna de elogios, e ela resgata o ponto do açúcar e nos faz compreender o personagem e entender como ele pensa e que na verdade ele está é provando seu amor a Rafaela. Sua narrativa é detalhada, ultrapassando o gênero literário, as declarações de amor entre Rafaela e Artêmio são impactantes, o relacionamento deles e a coisa mais bonita, mesmo que triste, as cenas não são efêmeras e ao término do livro foi difícil pra eu dizer adeus ao Sr Fúria e a Rafaela das Flores.
E quando me lembro desta história comovente eu sinto o cheiro de tabaco, suor e cavalo misturado com aroma das rosas, laranjas e bergamota, acariciando minhas narinas e isto pra mim é o cheiro da glória!Rs
“O aroma de uma pessoa esta ligado a sua essência”
E com outra frase termino minha resenha, não dá pra revelar todos os detalhes deste livro, é preciso que cada um leia e experimente a sua emoção diante deste romance.
Recomendado!
Avaliei com 5 estrelas