cecis 30/09/2023
Lindo lindo lindo
Quando criança nunca li esse livro, mas durante a leitura vi como teria sido importante fazê-la antes e hoje. Porém, minha experiência foi o que tinha que ser, então fico feliz de pelo menos ter lido essa obra prima.
Lygia Bojunga, primeiro livro dessa autora que leio e QUE SENSIBILIDADE essa mulher tem pra escrever pensamentos que poderiam passar na cabeça de uma criança. Ela conseguiu fazer isso com tanta naturalidade, transformar dúvidas que qualquer criança poderia ter e mostrar que está tudo bem ter esses pensamentos. NÃO tem nada de errado em pensar assim e NÃO tem nada de errado em apenas ser uma criança alegre que questiona aquilo que está ao seu redor, até porque você está descobrindo o mundo.
Uma coisa muito legal no livro é que eu não sei até que ponto é metáfora ou é realidade. Acho muito lindo a maneira como Lygia escreve os pensamentos de Raquel, juntando sua imaginação com o real e misturando tudo até você achar que a vida é assim, uma fantasia. Sendo que nada verdade, é a maneira como Raquel enxerga o mundo, como muitas crianças veem as suas vidas.
Ao Lygia dar voz aos pensamentos de uma criança e destinar isso para outras, ela está permitindo que elas questionem e que vejam que CRIANÇA TAMBÉM É GENTE e que precisam ter voz e vez em várias coisas de sua vida. Acho que a parte em que ela deixa isso mais claro é quando vai na "CASA DE CONSERTOS", em que Lorelai é uma menina que participa de várias tarefas da casa e pode dar sua opinião em alguns assuntos. Ela não precisa esperar virar gente grande pra ter sua opinião levada em conta. Achei isso tão lindo e sensível, porque muitas crianças são invisibilizadas por seus pais, como Raquel era, e têm seu brilho sendo apagado à medida em que crescem.
E o mais interessante são as 3 vontades que hora enchem e hora esvaziam na vida de Raquel. A vontade de escrever, de ser garoto e de ser gente grande. Ao decorrer da história, Raquel vai percebendo que se ela fosse menino poderia fazer tudo o que quisesse e não viveria de acordo com a vontade dos outros, tendo que se portar como menina e só fazer "coisas de garota". Ela vê como os meninos são livres para fazer o que der na telha e não são questionados, mas sim apoiados em suas decisões, diferente das meninas. Porém, no final do livro vê que, assim como Lorelai, ela também pode gostar de ser uma menina e fazer o que quiser, pois não existe isso de "coisa de menino e coisa de menina", você pode querer ser e fazer o que quiser. GENTE esse livro foi publicado em 1976 e trouxe essas reflexões tão essenciais para a vida de muitas meninas. LYGIA AQUI VOCÊ FOI TUDO.
Além disso, a vontade de virar gente grande era mais por não ter voz em sua família e ter que engolir tudo o que pediam ela pra ser e fazer. Sendo que ninguém se importou em perguntar " mas por que você pensa assim?" "por que não quer fazer isso?". Era literalmente só perguntar pra Raquel que ela respondia, porque criança é inteligente, criança tem voz. E como elas vão mostrar seus sentimentos e pensamentos quando não são permitidas pra fazer isso? Aqui penso que Lygia quis mostrar isso, que só porque você é uma criança não significa que sua opinião não importa. Sei que tem coisas que criança não tem maturidade e discernimento para decidir, isso é óbvio, mas nem por isso devem ser caladas de expressar suas vontades, mesmo que elas não venham a ocorrer. O importante é dar voz, é permitir se expressar e tentar DIALOGAR com elas.
E por fim a vontade de escrever. Que poético todo esse cenário em que Raquel se encontrava. Talvez muito do que ela pensou era o reflexo da vida de Lygia, mas isso já foi um pensamento meu. Porque muitas vezes não se entende a razão das pessoas escreverem, entretanto, não precisa de sentido. Se você quer escrever, ESCREVA. Nem todos precisam entender seus pensamentos, mas nunca deixe de se expressar pela escrita porque não te compreendem. Continue criando seu universo.
Eu amei fazer essa leitura, mas por enquanto foi tudo isso que consegui passar para palavras. Contudo, sei que tem tantas outras reflexões que Lygia colocou em seu livro e fica até complicado de querer transcrever tudo. Que livro fantástico!