Resenhas - Os Militares e a Crise Brasileira

João Moreno 11/07/2021

Forças Armadas ou Partido Militar?
Livraço, pois nos livra da ignorância e da consciência ingênua a respeito do papel das Forças Armadas na condução da política brasileira.

Os quatorze artigos mais a introdução e a entrevista - incrível - de Héctor Saint-Pierre dimensionam o problemão no qual estamos inseridos. Problemão este que se apresenta de várias formas:

Aprendemos que as Forças Armadas são autônomas e imunes ao controle civil. A sua formação histórica; a genealogia de seus militares; a educação; a ideologia; a forma como enxergam a si, o brasileiro e a política; a geopolítica e a inserção do país numa divisão internacional do trabalho; o capitalismo periférico dependente; as doutrinas; os aparelhos e os novos instrumentos de guerra (apreendidos da doutrina norte-americana em sua luta contra o terrorismo/expansão imperialistas) etc etc. Todas essas questões põe em dúvida o tal do "profissionalismo" das FA, a suposta defesa à Constituição e o que, de fato, o art. 142 significa ou como ele é interpretado por esses atores políticos.

Ressalto que, apesar de não haver um consenso, o livro ilumina-nos (ou traz hipóteses) quanto ao papel de Bolsonaro e do alto comando de generais do Exército, formados na Aman na década de 1970, que o circunda: Partido Militar; Consórcio de Militares, Bolsonaro como projeto dos generais, o golpe que já foi dado etc são interpretações que extrapolam as interpretações e cotidianas (por isso necessárias).

Pra finalizar, vale ressaltar que os artigos, apesar de curtos, discutem uma quantidade vasta de temas, funcionando como numa espécie de "dossiê". Há desde artigos que dão uma 'aula' de Brasil contemporâneo (1) a textos que discutem o marxismo cultural (2);
e reprodução de valores (3); política indigenista (4) etc.

Referências

(1) "Pandemia e necropolítica Brasileira: as forças repressivas e a gênese contínua do capital";
(2) "Da linha dura ao marxismo cultural. O olhar imutável de um grupo de extrema direita da reserva sobre a vida política brasileira (Jornal Inconfidência, 1998-2014) e "Bolsonaro, quartéis e marxismo cultural: a loucura com método");
(3) "Pensando a educação de militares na democracia";
(4) "Bolsonaro e os índios".

site: https://literatureseweb.wordpress.com/2021/07/21/forcas-armadas-ou-partido-militar-um-resumo-de-os-militares-e-a-crise-brasileira-organizado-por-joao-roberto-martins-filho/

Leandro.Santana 03/09/2023

Os Militares e a Crise Brasileira - João Roberto Martins Filho - Editora Alameda
Independentemente de preferências políticas, alguns fatos da história brasileira são indiscutíveis:

a) desde a proclamação da República, as FFAA estiveram envolvidas nas principais crises institucionais da nação (fim da Primeira República, instauração do Estado Novo, renúncia de Getúlio Vargas, suicídio de Getúlio Vargas, tentativa de impedir a posse de JK, fim da Segunda República, entre outras de menor repercussao). Para alguns seu papel foi de salvadora da nação, para outros simplesmente golpismo. Seja como for, é uma participação completamente desproporcional comparando-se com qualquer democracia saudável;

b) desde o início da Terceira República, os militares vinham adotando uma postura discreta e dedicando-se principalmente à sua função natural: a defesa nacional. Sua participação política ocorreu pontualmente, como na resistência à instauração da Comissão Nacional da Verdade. Porém, desde 2016, sua postura mudou, incluindo tweets ameaçadores e “limítrofes com a ilegalidade” até a sua adesão ao governo da hora, em 2019, como se um partido político fosse. A título de exemplo, "dos 17 participantes da 304ª Reunião do Alto Comando do Exército, realizada em 5 de fevereiro de 2016, apenas dois não assumiram a partir de 2019 funções de características políticas”.

Mais uma vez, essa atuação é recheada de ameaças veladas à ordem institucional, como foi ao longo do tempo.

É justamente esse o tema do livro organizado por João Roberto Martins Filho, que em uma série de artigos de diferentes autores, com diferentes perspectivas, analisa o envolvimento dos militares nas mais recentes crises institucionais.

Obviamente, o livro traz alguns posicionamentos críticos muito claros à atuação dos militares, em alguns casos bem mais extremos do que a minha própria opinião, mas isso vem acompanhado de dados consistentes e referencial teórico adequado. Sem dúvida uma leitura proveitosa diante do cenário político atual.