Antonio 14/07/2021
O Duplo
Encontrar alguém exatamente igual a você no ponto de ônibus! O que se pode pensar, ou fazer com isso?
W: Valéria e Valentina, de Isaac Rosa e Olívia Rosa. Este romance juvenil (ou YA, como se diz) traz o conhecido tema do DUPLO, usado por escritores como Edgar Allan Poe (William Wilson), Robert Louis Stevenson (O Médico e o Monstro) e José Saramago (O homem duplicado). E como será que o autor espanhol Isaac Rosa se saiu nessa tarefa?
Os autores e obras citadas mostram que há, em tese, dois caminhos a seguir: o duplo é a divisão de uma pessoa em duas, ou seja, uma pessoa que tem duas personalidades opostas; ou o duplo é uma cópia do original, uma outra pessoa, e nesse caso tudo é uma questão de interpretar o que esse duplo significa.
Isaac Rosa não escreveu sozinho, mas com sua filha adolescente, Olivia Rosa, e também por isso o resultado é uma escrita tipicamente juvenil. Valéria, de 15 anos, vê o seu duplo – uma menina exatamente igual a ela – do outro lado da rua, no ponto de ônibus. Esse acontecimento, extraordinário, pois não se trata de alguém parecido, mas idêntico, gera uma narrativa em três etapas: 1) Aproximação, que é difícil, pois Valéria é fechada e tímida; 2) Reconhecimento e as suposições, quando as duas vão se questionar como esse fato pode ser explicado (seriam irmãs gêmeas? Esperamos que não!); 3) Obtenção de vantagens, pois as duas meninas, praticamente da mesma idade, percebem que podem “usar” as qualidades que uma tem e a outra não, trocando de papéis quando isso é conveniente.
Não há a menor dúvida de que a terceira etapa é a mais perigosa. Até que ponto se pode tirar proveito de uma pessoa-réplica, sem que os outros percebam? E se perceberem, qual vai ser a reação?
Valéria-tímida & Valentina-valente, como o nome indica. A capa do livro é como uma carta de baralho com a dama-de-copas, pois ao virá-la de ponta-cabeça a visão continua sendo a mesma. E é esse espelho que nos provoca tanto fascínio. Ter um duplo não só no reflexo, mas na vida, seria extremamente conveniente em várias situações e, talvez, uma fonte de autoconhecimento. Mas, como se disse, isso também pode ser perigoso.
A narrativa prende a atenção com várias surpresas e, pelo menos no quesito de criar uma narrativa envolvente, o autor não fica atrás dos autores citados (Poe, Stevenson, Saramago). Claro que se trata de um livro juvenil bastante acessível, com uma escrita quase naturalista, e não propriamente ‘literária’; mas o desenvolvimento do enredo é bastante eficaz, trazendo à tona aspectos psicológicos que o tema do duplo suscita.
Há outro fator de surpresa para os leitores: o livro tem dois narradores. Um deles é Valéria, mas quem será o outro? Parece uma amiga da protagonista, com quem ela divide a tarefa, mas esse é mais um detalhe intrigante a ser adivinhado pelo leitor. Fique atento!
W: Valéria e Valentina, ótima leitura para as férias, que vai prender muito a sua atenção.
site: https://www.blogselivros.com.br/w-valeria-e-valentina/