Zanteo 22/05/2023
Bom, mas poderia ser melhor
É uma premissa excelente, mas acho que a execução não foi uma das melhores, pelo menos em grande parte.
Gabriel é um menino órfão que completa a maioridade e se vê compelido a deixar o abrigo.
As primeiras 40 e tantas páginas são aquelas que nos introduzem ao Gabriel e àqueles que estavam ao seu entorno, como, por exemplo, a Natasha, sua então namorada.
Conforme dito, Gabriel deve deixar o abrigo, mas uma coisa muito delicada faz essa despedida ser algo muito mais complicado de se lidar.
Mas tenho duas coisas pra salientar:
1 - Após a fatídica cena envolvendo Natasha, acho que faltou um pouco de tato da autora em trazer aquelas observações a respeito da violência, acho que ficou meio jogado, faltou trazer uma coisa mais contextualizada. Não foi ruim, pelo contrário, achei interessante o narrador "romper a quarta parede", mas acho que poderia ter sido melhor trabalhado, porque do jeito que foi dá a impressão de que está acontecendo uma cena e de repente todo mundo congela e aparece alguém explicar o que está acontecendo olhando diretamente pra plateia, o que eu acho q foge um pouco do conceito do romance. Mas, afinal, foi pertinente.
2 - A linguagem usada nos diálogos é um tanto incoerente. Demorei um pouco a assumir que aquelas falas eram do Gabriel. Claro, eu não estava esperando que ele só falasse gíria, mas as frases e expressões empregadas nos diálogos não correspondem aos personagens, especialmente quanto ao Gabriel. O vernáculo utilizado é muito formal em sua maioria, o que torna o texto um tanto impessoal e desvinculado da personagem. Fiquei tentando imaginar uma situação da vida real Gabriel olhando para um salão e dizendo "é possível promover uma grande festa", não sei, pra mim não casa a fala com a personagem, pois faltou trazer um pouco mais de coloquialidade e verossimilhança, considerando a construção do personagem como um menino órfão de 18 anos da periferia de São Paulo dos anos 90.
Voltando ao que interessa, poder acompanhar a trajetória de Gabriel é realmente muito interessante.
A segunda metade do livro é muito mais cativante do que a primeira, talvez por já estarmos familiarizados tanto com as personagens quanto com a escrita da autora.
As personagens não são mal-construídas, por outro lado, acho que poderiam ter sido melhor aprofundadas. A bem da verdade o único que a gente consegue realmente entender ou ao menos compreender os pensamentos e atitudes é o Gabriel, pelo menos até antes de chegar no final, quando tudo é trazido à baila.
Final este que foi avassalador e pra mim o ápice da história. A condução das revelações foi excelente, bem escrito, bem contextualizado e, lógico, MUITO emocionante.
Não acho o Gabriel uma pessoa arrogante, mas claramente ele era alguém inconstante e desequilibrado, e o bonito do livro é que conseguimos entender por que ele agia daquela forma. Conseguimos compreender quais são as circunstâncias em que ele toma as atitudes que tomava e se comportava daquele jeito.
Enfim, é uma premissa excelente, a história é sensível e interessante, mas alguns detalhes na execução e na escrita me impediram de me apaixonar pelo livro.
Mas, não posso deixar de parabenizar a autora pela ideia e pela sensibilidade em retratar essa história, trazendo a trajetória de Gabriel que sem dúvidas representa a vida de muitos que ainda hoje percorre caminhos semelhantes e estão expostos às mesmas mazelas.
Ah, sim, eu achei muito intrigante o nome do livro, mas com o decorrer da leitura a gente percebe que a autora possivelmente se inspirou tanto pela música "Maior Abandonado" quanto pela vida do seu compositor, nosso Cazuza.