Coruja 01/08/2022Não tinha ouvido falar desse livro antes dele aparecer em pré-venda, mas assim que bati o olho, a poeticidade do título me chamou a atenção. E o subtítulo também, claro, afinal, se tenho uma fraqueza bem conhecida, são livros que falam de livros. Assim é que coloquei
O Infinito em um Junco na minha lista de “fiquei curiosa” e esperei pela oportunidade de folheá-lo e assim determinar seu nível de prioridade de aquisição.
Não precisei de muitas páginas para perceber que a obra de Vallejo se encaixava em várias das minhas preferências. É, como já dito, um livro sobre livros; especificamente, sobre a evolução do design dos livros e da escrita - das tabuletas de argila e caracteres cuneiformes, passando por papiros e hieróglifos, pergaminhos, alfabeto fenício, inclusão das vogais e, enfim chegando aos códices encadernados, num formato que usamos até hoje. É também uma amálgama de diversos ensaios sobre bibliotecas, literatura e o papel do aprendizado e ensino ao longo dos séculos, com memórias pessoais, numa espiral de digressões que me fez pensar muito nos debates do clube do livro de que participo.
Isso porque no clube - que já tem mais de uma década de funcionamento - costumamos usar as leituras como trampolim para outros debates e tangentes diversas que, num primeiro momento, podem parecer ter nada a ver com o título da vez. Foi assim que chegamos de 20.000 Léguas Submarinas para atentados terroristas e colonialismo; Robinson Crusoé para direitos humanos e relativismo cultural e Um Estudo em Vermelho para definições de justiça e vingança e o papel do Estado nesse embróglio.
Vallejo faz esse mesmo tipo de encadeamento de ideias, saindo de um fato/dado histórico para referências que, podem parecer não ter nada a ver com o assunto, mas fazem todo o sentido quando você reflete mais um pouco sobre suas palavras. Algumas críticas que li antes de pegar o livro torciam o nariz para esses desvios, em especial aqueles que envolviam reminiscências da autora, mas eu gosto dessa forma de contar histórias, dessas narrativas da qual rebentam outras mais, dessa mistura de macro e micro-história, do universal ao pessoal e vice-versa.
O Infinito em um Junco se divide, ostensivamente, em duas partes culturais: gregos e romanos. Ela vai e vem, contudo, entre várias culturas, tanto ocidentais quanto orientais, e não tem problemas de pular entre Antiguidade e idade contemporânea - tudo isso usando a Biblioteca de Alexandria e Homero como pontos de partida, chegando até Umberto Eco e Fahrenheit 451. Há muita informação preciosa, curiosidades fascinantes e uma paixão pulsante pelo mundo literário em cada novo tópico tecido nessa bela colcha histórica.
As digressões de Vallejo são às vezes imprevisíveis (de tatuagens a cicatrizes! Fiquei uns bons minutos digerindo essa imagem) e, por isso mesmo, deliciosas. O estilo dela me lembrou demais o Manguel - leitores que tenham se apaixonado por Encaixotando minha Biblioteca provavelmente vão se encantar com esse aqui. Enfim, aos amantes de livros - não apenas como um veículo de narrativas, mas também como objeto em suma -,
O Infinito em um Junco é imperdível. Definitivamente, um candidato a lista dos melhores do ano cá no Coruja.
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O Infinito em um Junco, da espanhola Irene Vallejo, mistura memórias afetivas e dados históricos para contar a história do livro como objeto.