livmchdo 16/11/2023ATENÇÃO!!!11 BRAZIL MENTIONEDForam mil e quatrocentas páginas em 5 dias e, olha, elas renderam alguns pensamentos.
Sempre prefiro dar um tempo antes de elaborar uma revisão, porque pontuar uma história imediatamente após a leitura pode deixar a euforia da trama encobrir as falhas.
É inegável que a autora tem habilidade na escrita. No entanto, é crucial notar que nossa conexão intensa com a trama é devido ao nosso conhecimento prévio dos personagens e ao vínculo emocional que já existe em nossa mente. Indicar essa história para alguém que não é um fã da saga ou que não está familiarizado com os personagens seria, sem dúvida, uma doidera absurda.
A história em si não se sustenta de maneira autossuficiente; ela depende fortemente do conteúdo dos livros para criar uma divergência canônica, e acredito que isso impossibilite que ela seja uma obra-prima. Contudo, como uma fanfic, ela brilha, sendo indiscutivelmente uma das melhores que já tive o prazer de ler.
Quando comecei a leitura, sabia que seria um reconto do livro da Aia na versão dramione. Minha primeira impressão foi de que a autora iria certamente ignorar a crítica política presente no livro original, e infelizmente, estava certa.
Nossa protagonista, Hermione, está aprisionada após a morte de Harry Potter e a derrota da Ordem da Fênix na guerra. A mente dela está fragmentada, e algumas memórias foram bloqueadas para proteger algo crucial sobre o desfecho do conflito. Nossa trama começa quando Valdemar a coloca num programa de repopulação do mundo mágico, oferecendo-a a Draco Malfoy para gerar um herdeiro, ao mesmo tempo em que ele descobre o que Hermione esconde.
Draco então precisa abusar da Hermione cinco vezes por mês para que eles tenham um filho. Duas vezes por mês ele leva a Hermione para o Valdemar ler a mente dela.
Eu odeio odeio odeio essa parte da narrativa que mistura com o conto da Aia. Essa parte não adiciona crítica política significativa; é mais um recurso narrativo para causar choque e trauma. Poderia ser substituído por outra situação sem comprometer a história. A ausência de interação direta da Hermione com o universo ao seu redor me frustrou. Preferiria ver Draco sendo obrigado a levá-la a eventos, ela envolvida nas tramas para derrubar Voldemort, ao invés de alguém contar o plano depois.
O destaque positivo vai para a caracterização do Draco. Inicialmente retratado como o Alto Comandante, uma figura impiedosa e implacável, capaz de eliminar filas de pessoas sem hesitação. Sua posição como segundo no comando levanta suspeitas, levando muitos a acreditarem que ele almeja substituir Valdemar. Isso resulta em uma constante necessidade de Draco provar sua lealdade, seja por meio de deixar que o Lorde das Trevas o torture ou matando quantas pessoas for.
A percepção de Hermione sobre o sofrimento de Draco se manifesta ao observar os efeitos físicos em seu corpo, evidenciados por tremores constantes, palidez e exaustão. Após os abusos que ele é obrigado a cometer, ele tem diversos mal-estares e vômitos, e também é incapaz de encarar o rosto dela. Essa representação sutil não apenas ilustra o conflito interno de Draco, indicando seu desconforto com a situação, mas também evidencia o cuidado da autora ao evitar uma abordagem óbvia e explícita. O desenvolvimento de seu personagem é verdadeiramente notável, revelando camadas complexas de maneira envolvente.
Essa parte também impressiona pela sua capacidade de criar uma atmosfera envolvente. Eu consigo facilmente visualizar toda a narrativa em minha mente, com uma paleta de cores que se destaca pela sua saturação baixa, predominando tons de verde-escuro, cinza e um azul noturno. A ambientação é rica em detalhes, pintando um quadro vívido que contribui significativamente para a experiência de leitura.
Há muitos elementos interessantes na trama, mas, para o propósito desta review, trinta e três estupros depois, Hermione finalmente engravida. A magia associada à gravidez desencadeia suas memórias, revelando camadas adicionais à história.
Mas não espere coisas mirabolantes; antes mesmo de alcançar as quatrocentas páginas, eu já tinha desvendado praticamente todo o enredo.
Nesta fase, a narrativa dá uma guinada, nos levando de volta aos eventos de três anos antes, aproximadamente um ano antes do desfecho da guerra. A autora escolhe deixar bem explícita os paralelos com a segunda guerra mundial, comparando Voldemort com Hitler diretamente e inclusive mencionando que o EUA não estavam intervindo porque não era cômodo pra eles. Não gostei dessa caracterização porque penso que trazer um paralelo com esse evento tão importante pode acabar trazendo um desserviço recheado de anticomunismo e perigo vermelho. Como isso é uma fanfic, não vou pegar pesado nesse aspecto, mas se fosse uma obra de verdade, vish, eu teria ficado incomodada
A divergência do cânone das histórias originais se inicia no início do livro 6, quando Draco Malfoy assassina Dumbledore antes de revelar informações cruciais sobre as horcruxes. Esse ato resulta em uma Ordem da Fênix desestabilizada, privada de orientações e sem rumo claro.
Hermione assume o papel de curandeira e mestre das poções e defensora fervorosa da crença de que é necessário eliminar o inimigo, independentemente das consequências, motivada pelas perdas e mortes que testemunha. Isso resulta em sua exclusão das decisões cruciais da Ordem, tornando a amizade entre ela, Harry e Rony frágil e complexa.
Um ponto de virada ocorre quando Hermione recebe a missão de lidar com um desertor do lado de Voldemort que quer se aliar a eles como espião. As condições impostas incluem o perdão após o fim da guerra e a entrega de Hermione. O desertor, quem poderia imaginar, é nosso protagonista, Draco! A trama se desenrola a partir desse ponto, exigindo que Hermione conquiste a simpatia de Draco para evitar que ele use a Ordem contra eles mesmos enquanto serve de ponte para receber informações e inteligência. Sua estratégia envolve a leitura intensiva de livros de auto ajuda e psicologia na tentativa de despertar sentimentos em Draco e fazer com que ele dependa dela emocionalmente.
Do ponto de vista de Draco, ele nota que Hermione é uma oclumente natural com habilidades ainda não refinadas. Decidindo treiná-la para se defender caso seja capturada e, assim, evitar expor ambos. A dinâmica entre eles evolui para uma interação que é simultaneamente sensual, protetora e permeada por segundas e terceiras intenções.
No entanto, apesar desse desenvolvimento, senti a falta de uma participação mais ativa de Hermione. Gostaria de ter visto ela ser levada para algumas missões, não todas, mas algumas e que ela tivesse uma interação mais profunda com os outros personagens. Quando ela começou a lutar de maneira semelhante a Draco, ansiava por uma abordagem que deixasse os demais assustados; queria que um Comensal da Morte, ao vê-la em ação, se sentisse amedrontado pela lembrança ao estilo de Draco. Queria cenas em que Hermione e Draco se encontrassem em um campo de batalha, forçando-o a fingir um erro de feitiço, seguido por uma discussão entre eles. Queria testemunhar como ela seria posta de lado pelos outros personagens devido às mudanças em sua dinâmica.
Existe uma cena nesse livro em que o Draco surge e mata todos os Comensais para salvar a Hermione. Meu deus, que cena. Me lembrou muito do Darkling! Contudo, senti um incômodo pelo fato de ele precisar resgatá-la, transformando Hermione na típica mocinha indefesa. Imaginava uma reviravolta em que Hermione, diante do Draco, tomasse as rédeas da situação. Que ela silenciasse a si mesma com um pano na boca e começasse a curar suas próprias feridas, enquanto Draco, ansioso pelo que acontecera, mostrasse toda sua irritação, sabendo que ele não conseguiria ajudar. Queria ver a raiva no rosto dela, incapaz de expressar sua frustração diretamente a Draco e ele continuasse falando, falando. Queria que depois disso, o Draco surpreendesse Hermione ao aprender alguns feitiços de cura para que aquilo nunca acontecesse de novo.
Embora Draco reitere constantemente que Hermione é sua para proteger, eu desejava mais do que um romance obsessivo, mais do que um Smaug guardando a Montanha Solitária. Queria presenciar um verdadeiro conflito de personalidades, com Hermione mais ativa e menos inclinada a crises de pânico. A repetição desses momentos de fragilidade me irritou, especialmente porque contradizem a imagem de adulta calculista que ela mesma retrata em alguns momentos.
Queria ver o Draco assustado com o que a Hermione estava se tornando e vendo ela seguir um caminho parecido com o dele. Queria ter visto, de alguma forma, ele ser obrigado a capturar ela que ela precisasse realmente usar um Avada Kedavra em alguém pra conseguir escapar e ele presenciasse isso. Imagina se a motivação pra ela conseguir usar uma maldição imperdoável fosse olhar nos olhos do Draco vestido de Comensal e tivesse tanto medo que ele fosse morto que ela conseguisse matar alguém. EU QUERIA QUE FOSSE TANTO MAIS! Será o benedito que vou ter que escrever minha própria fanfic de Harry Potter?
Queria ver Draco assustado com a transformação de Hermione, vendo-a encontrar nele a resposta para sua própria dor. Queria que ele testemunhasse ela trilhar um caminho semelhante ao dele, realmente fazendo todas as escolhas difíceis pela Ordem, seja se vendo obrigada a procurar uma Horcrux sozinha e acabar capturada. Ansiava por essa situação em que Hermione precisasse usar, de fato, um Avada Kedavra para escapar, com Draco presenciando essa cena impactante. Imagina a motivação para Hermione recorrer a uma maldição imperdoável: olhar nos olhos de Draco vestido como Comensal, temer tanto que Draco fosse exposto e acabasse morto por causa dela a ponto de ela conseguir matar alguém. EU QUERIA QUE FOSSE TANTO MAIS! Será o benedito que vou ter que escrever minha própria fanfic de Harry Potter?
Ao descobrirmos o que finalmente aconteceu com Herminione na guerra, voltamos então ao presente e agora temos que lidar com todas essas situações. O final da história é extremamente repetitivo e devo dizer que um tanto cansativo. O Draco parece que está preso numa idealização suicida com um misto de sacrifício e a Hermione ou chora ou tem uma convulsão por ter uma crise de ansiedade.
Não vou estragar o final, mas saiba que ele poderia ter sido melhor feito. Um dos defeitos das fanfics é que elas sempre acabam falhando em construir a narrativa desde o começo, mostrar o vilão e a ameaça de uma forma mais sutil pra que a gente realmente sinta que ele é uma coisa importante. No final o Voldemort nem era tão importante assim.
Mas para não dar a impressão de que todas essas observações são apenas fruto de frustração pelo que a história não foi, o desenrolar é verdadeiramente incrível. A narrativa foi impactante e apaixonante, entristecedora e, ao mesmo tempo, memorável. 4,5/5.