Vício e virtude

Vício e virtude Kent Dunnington




Resenhas - Vício e virtude


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VS06 17/11/2023

Kent Dunnington desafia os modelos tradicionais de vício como uma doença ou uma escolha. O autor usa a filosofia e a teologia para desvendar a natureza do vício e argumenta que ele é fundamentalmente um problema de adoração. A tese de Dunnington é que o vício é uma “crítica cultural incorporada da modernidade” e que é uma adoração falsificada, os adictos seriam os "profetas" modernos, que denunciam a falha moral da sociedade contemporânea.
Ele propõe uma solução baseada nas ideias de Aristóteles e Tomás de Aquino e enfatiza a importância da formação do caráter e do cultivo de virtudes na superação do vício por meio do hábito.
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Roberth 23/08/2024

Uma boa alternativa à perspectiva biomédica padrão do vício!
Este é um livro bem fundamentado, denso, fruto de pesquisa e rigor metodológico, que propõe uma alternativa à perspectiva padrão adotada por grande parte dos tratamentos à adição.

Para o autor, tal perspectiva, ao passo que supervaloriza as questões fisiológicas e médicas, caracterizando a adição como doença que neutraliza um viciado, que sofre diante de sua condição, acaba por negligenciar um aspecto que perpassa pelo hábito enquanto pertencente à esfera moral, o que devolve ao ser humano uma postura mais responsável e ativa diante de decisões práticas do cotidiano, no combate aos vícios e no desenvolvimento de virtudes.

Chamou minha atenção o fato de, desde o início, na preocupação em se partir dos mesmos pressupostos, existir um cuidado especial com conceitos e definições, verdadeiras aulas que, em si, já valem o livro. Utilizar-se destes termos para sustentar uma hipótese tão importante, tal qual a inclusão dos hábitos como ponto também relevante nos processos de intervenção, para além do modelo médico, é uma conquista respeitável, uma vez que os hábitos estão intrinsecamente relacionados ao caráter e ao abandono de vícios.

Destaco os capítulos em que, após dialogar com a filosofia de forma exemplar, o autor também inclui a teologia e a eclesiologia na conversa, trazendo os temas do pecado, da adoração e do papel da igreja ao lidar com a adição. O autor faz isso só ao final pois mantém o mesmo rigor metodológico com termos e definições, apresentando um diálogo lindo e embasado que coroa toda a discussão.

Atribuo como ponto surpreendente e muito positivo a capacidade de suscitar boas reflexões e movimentar o leitor rumo a uma análise mais efetiva dos próprios hábitos, oferecendo ferramentas precisas, não apenas para tal análise, mas também para o desenvolvimento de virtudes.
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Wesley170 19/04/2023

Uma nova visão
A adicção se tornou um assunto quase esquecido no meio teológico e pouco comentado no meio filosófico. Grande parte das nossas opiniões sobre o tema se dá tão somente pela chamada opinião cientifica, que caracteriza a adicção como doença, ou a opinião religiosa infundada, que sem nenhum aprofundamento reflexivo sério, rotula como pecado. No geral, parece que a ciência bateu o martelo decisivamente para que a definição de doença seja amplamente aceita, inclusive pela igreja, que por motivos não muito claros desistiu de fazer reflexões bíblicas no que tange a adicção. É uma doença? Quais as evidências cientificas que confirmam essa teoria? É algo que se encontra exclusivamente no campo da moralidade religiosa? Com explicar a experiencia adicta em face da opinião voluntarista? Kent Dunnington, PHD em filosofia, professor em teologia ética e filosofia da adicção, traz de forma aprofundada cada uma dessas indagações respondidas em seu livro Vício e virtude – a adicção sob uma perspectiva teológica.
O autor desenvolve o tema de forma muito ordenada e coerente. Inicialmente ele desmistifica a adicção como doença e mostra que só é possível fazer essas afirmações com alguns pressupostos científicos que não foram muito bem elaborados para a definição em questão. Em uma das suas melhores desconstruções da adicção como doença, ele demonstra que para chegar a essa conclusão é pressuposto alterações estruturais no cérebro do adicto, que ele refuta argumentando que tais alterações também ocorrem nos cérebros de musicistas e que isso não os torna doentes e nem retira a voluntariedade do músico ao tocar um instrumento. Outro pressuposto descontruído, é o de que se trata de uma doença simplesmente porque ela tem bases genéticas, ignorando o fato de que predisposição genética também não anula o ato voluntário do agente, pois até mesmo crianças, que cientificamente herdam genes dos seus pais que influenciam o pensamento e a ação, não são consideradas doentes por seus comportamentos alegres ou religiosos que foram herdados.
O tratamento que normalmente é oferecido para adictos é o medicamentoso, sendo esse influenciado pela definição de adicção como doença. Kent argumenta que essas intervenções medicamentosas não são apoiadas por evidências, levando em consideração que a maioria dos adictos param de praticar as suas adicções em um contexto livre de influências médicas, passando a levar uma vida normal, até mesmo, livre de recaídas. Um dado interessante que o livro nos traz é que o índice de remissão (recuperação) é significativamente menor em um contexto de tratamento médico se comparado com a população em geral, a maioria da qual não procura tratamento. Os dados também demonstram que o baixo índice de recuperação está em desacordo com uma evidência que o autor considera a mais abrangente: essas pesquisas são realizadas com pacientes que obtiverem tratamento, ignorando a população significativamente maior de pessoas adictas que se recuperaram e nunca procuraram um tratamento. Ou seja, os dados claramente demonstram que os índices de recuperação são maiores do que os relatados pelas organizações de saúde e que o tratamento da adicção como doença não pode ser fundamentada no sucesso do tratamento médico, que de fato é inferior ao índice de recuperação da população em geral.
O autor sugere que para deixamos de acreditar em supostas dicotomias levantadas por uma falta de compreensão da adicção, devemos recuperar a categoria da adicção como um hábito. Com as mais diversas citações de filósofos e teólogos, em especial Aristóteles e Tomás de Aquino, ele argumenta que a adicção se enquadra na categoria de hábito e faz reflexões incríveis sobre a deliberação do comportamento, a voluntariedade da ação e as suas aplicações em um contexto de adicção devem formar um panorama em que o agente determina racionalmente que um comportamento deve ser rejeitado e, ainda assim, se envolve no comportamento, agindo contrário a sua escolha e juízo racional, inclusive, após anos sem o uso da substância adictiva, o que torna tudo ainda mais intrigante. Ainda de acordo com a argumentação, a categoria de hábito é aquela que intermedia o determinismo causado pela definição de doença e o voluntarismo dado como resposta rápida aqueles que não aprovam essa definição. Dessa forma, a recuperação, conforme definida por Kent, consiste no desenvolvimento de novos hábitos com um trabalho interno necessário para esse desenvolvimento. Outros aspectos no livro são: adicção e intemperança, em que incluem definições dos prazeres sensoriais e os bens morais; Adicção e modernidade – o adicto como profeta involuntário; o tédio moderno e a solidão moderna.
Além do pensamento da adicção na categoria de hábito, o autor nos propõe uma compreensão antiga e correta da adicção como pecado, o que aumenta ainda mais o nosso entendimento sobre o comportamento adictivo. É argumentado que essa categoria não implica em uma postura moralista e nem voluntarista, mas que se harmoniza com o ensino de agostinho de escravidão da vontade humana, que por sinal, é muito bem exposta pelo autor utilizando-se de outras citações. Dessa forma, na teologia agostiniana, podemos ser incapazes de não pecar e, ainda assim, ser considerado agindo voluntariamente em nosso pecado. Da mesma forma que a categoria de hábito intermedia o determinismo da definição doença e o voluntarismo oposto, a doutrina do pecado faz a mediação entre o pelagianismo extremamente voluntarista, por um lado, e o maniqueísmo determinista, por outro lado. Dessa forma, Dunnington demonstra que a abordagem da adicçaõ como pecado pode ser acomodada a experiência do adicto e o discurso da adicção.
Nos últimos capítulos do livro, Kent aponta a adicção como uma adoração falsificada e uma busca de encontrar no imanente aquilo que só pode ser encontrando no transcendente. De acordo com ele, ser um adicto é entrar em uma relação com a substância na qual tudo na vida só faz sentido quando ela o acompanha e da significado a todas as outras coisas. A proposta é de que apenas caridade, que é o amor completo, obsessivo e real a Deus, pode ordenar todos os nossos atos para o seu fim e se impor sobre todos os outros hábitos adictivos. A busca adicta por algo maior do que qualquer coisa que está no seu cotidiano se encerra quando ele entra em um relacionamento com o Deus transcendente que dá significado e ordena todas as demais afeições. O papel da comunidade cristã e o que os adictos buscam nos grupos de doze passos, que não é encontrado na igreja, é explorado nesses capítulos finais dessa obra necessária para os nossos dias de relativização e cientificismo desordenado e infundado.

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Rafael1548 27/06/2023

Fantástico
" A força escravizante adicção, argumentei, reside em sua promessa perversa de capacitar um agente moral a integrar e organizar sua vida em torno de um fim arrebatador. Mas a promessa da adicção é desmascarada como uma mentira à medida que o agente passa a reconhecer que sua adicção exige que ele rejeite projetos e compromissos que sabe que devem ser inclusos em uma vida que valha a pena, uma vida digna. A adicção ludibria o agente porque fornece um simulacro de uma vida plena, ordenada e coerente. Mas o adicto deve rejeitar seu comportamento adicto precisamente porque a adicçáo fornece meramente um simulacro do que ele sabe ser seu verdadeiro fim. "

Essa obra graciosa vi no perfil do meu professor de seminário Thiago Rossi.

A obra, que a priori era uma monografia (por isso que digo para fazer bem feito os escritos individuais) trata da visão da adicção ("""vício """) como HÁBITO, fugindo de uma mera ação do sujeito ( que muitas vezes é anulada pelo vício) ou como doença (que é reduzir a coisa a mera observância de remédios).

Tendo por base os escritos de Aristóteles e Tomás de Aquino (aqui tem coragem), o autor busca expor a adicção como uma adoração errada e, última análise, pecado. Por fim traça a perspectiva bíblica para essa situação.

A Igreja possui o poder que muda vida: a pregação do Evangelho. E a verdade do Evangelho diz que somos pecadores arrependidos e em constante transformação pela graça e santificação no Espírito Santo. Eu trabalho em posto de saúde onde o consumo de remédios "controlados" saem com muita constância e ouso a dizer que muitos (quiçá TODOS) daqueles usuários precisam de arrependimento.

Mas a pergunta que posso lançar é: por que clinicas de reabilitação são tão lotadas e as igrejas não oferecem isso? Será que o Evangelho (que Paulo afirma dizer que é o poder de Deus) não pode nos livrar da pornografia, da masturbação, da glutonaria e do culto a nós mesmo?

Nós fomos chamados para uma viva esperança no qual, ainda que o pecado esteja intimamente ligado a nós, será para sempre arrancado. O corpo de morte será arrancado de nossas almas.
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