Toni 18/04/2024
Leituras de 2023
Agora agora [2022]
Carlos Eduardo Pereira (RJ)
Todavia, 2022, 216 p.
Semifinalista do prêmio Jabuti deste ano, "Agora agora" poderia ser chamado de um tour de force, se essas expressões gringas cafonas tivessem ainda qualquer valor ou se ainda carecêssemos de termos estrangeiros para falar do que é nosso. Troquemos, então, o francesismo por algo mais brasileiro: o romance é uma viagem interior arretada, tanto no que diz respeito à construção formal, quanto aos desdobramentos da narrativa. Um livro em que título e epígrafe anunciam um paradoxo incontornável: todo viver agora, no presente, é uma justaposição de camadas do passado — muitas vezes construído pelo encadeamento de micro e macro violências.
As trajetórias de 3 homens negros de uma mesma família, pertencentes a gerações diferentes, ao longo dos séculos 20 e 21: esta seria, trocando em miúdos, uma sinopse possível para o livro. Três Jorges — avô, filho e neto — são narrados por este último em seu aniversário de 45 anos (idade-marco na vida dos protagonistas). O avô era maquinista, filho de ex-escravizada, dono de um bar só para pretos, pugilista com um pendor para o teatro. O segundo, Jorge Filho, trabalha como encarregado de obra em uma empreiteira e como faz-tudo (eletricista, pintor, pedreiro etc) nas folgas e finais de semana. Sua verdadeira paixão, no entanto, é por sua escola de samba Unidos da Saudade em Nova Friburgo, e pela tradição carnavalesca do Rio.
Por fim, Jorge Neto, o narrador responsável por articular aquelas 2 vidas e a sua, é um professor que resolve não trabalhar ou sair de casa neste dia em que completa 45 anos. Em meio a um caudal de notícias e fatos que reproduzem no presente da narrativa sensação análoga àquela urgência exaustiva que nos acostumamos a encarar com preocupante normalidade, Pereira constrói outras leituras dessa urgência social, moldada, na verdade, por traumas sistêmicos e pactos desumanizadores escancarados. Não há nada latente em “Agora agora”: seu pulso é premente e firme. Ao narrar a depressão do homem negro brasileiro, fala também das injustiças e da tristeza profunda sobre as quais nosso presente se alicerça.