Todos nós estaremos bem

Todos nós estaremos bem Sérgio Tavares




Resenhas - Todos nós estaremos bem


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Krishnamurti 01/06/2023

Todos nós estaremos bem – um romance alegórico
O romance “Todos nós estaremos bem” do escritor e jornalista carioca Sérgio Tavares acaba de ser publicado pela Editora Dublinense de Porto Alegre. Tem como pano de fundo o período compreendido entre os anos de 1982 à 1999, época em que no Brasil, deu-se a chamada transição entre o odioso período da ditadura militar (1964-1985) e a dita transição democrática. É obra que se propõe a narrar as desventuras e desesperanças de uma pequena família formada no período histórico compreendido, em meio à uma grande turbulência político social.

Roberto, que se alterna entre protagonista e narrador da trama, é um jovem indiferente a causas políticas e antenadíssimo em ganhar dinheiro, acaba se tornando diretor de importante agência de comunicação que tem sólidas negociações com empresas ligadas ao regime militar e financiam a repressão institucionalizada sobretudo nos anos 60/70. Se envolve, ainda em 1966 (portanto apenas dois anos após o golpe militar que depôs o presidente João Goulart em 31 de março de 1964), com a jovem Lúcia, uma comunista convicta que, por sua vez, e com o tempo, acaba se tornando guerrilheira de um grupo contrarrevolucionário, o MR-8, promotor de sequestros e assaltos a bancos, até ser presa, brutalmente torturada e exilada. Dessa insólita união e, após reviravoltas de encontros e desencontros temporais, nasce uma filha, Karla que acaba por compor o quadro familiar. Basicamente este o enredo com o balizamento temporal necessário para o claro entendimento de uma trama urdida em período histórico tão pequeno e confuso.

Ocorre, entretanto, que o aspecto político e o social estão presentes, sim, mas não chegam a ser fatores exclusivos. Ao empreender, paralelamente, estudos de personalidade, o autor recolhe duas correntes de um ficcionismo de introspecção ligado a fatores externos condicionantes e a moldura do meio físico e do momento histórico tenebroso. As duas tendências conjugam-se. Sob este aspecto, a narrativa está mais para um ficcionismo psicossocial do que mero registro histórico. E é então que, graças ao talento do autor, o supra-real da situação de um casal assim, ou no mínimo o insólito de um par desses, se transfigura em absurdo lógico. A força da sugestão acaba predominando como realidade única impondo um pesado fascínio ao leitor.

Vale acrescentar, à guisa de maior conhecimento sobre o autor, que Tavares é um dos críticos mais atentos à produção contemporânea brasileira, editor do site “A nova crítica” e autor de “Queda da própria altura”, finalista do 2º Prêmio Brasília de Literatura, e “Cavala”, vencedor do Prêmio Sesc Nacional de Literatura, ambos de contos. Também ganhou o Prêmio Fesp de Literatura e vem também organizando o concurso literário nacional “Máquina de Contos”. Nesse seu primeiro romance, ao propor o mistério de uma situação invulgar em capítulos astutamente enredados de forma a compor um ciclo narrativo completo, segue ao mesmo tempo, expondo mistérios das personalidades de suas criaturas. O autor positivamente revela-se narrador consciente dos dramas provocados pela tragédia essencial do ser e pela tragédia da repressão político-social que o violenta, emudece e constrange. A violência “normal” e as violências social, econômica e política, militar e civil, que impõem mordaças e coleiras invisíveis.

Suas criaturas são também, vítimas de cruéis contingências da existência. Da união de Roberto e Lúcia nasce a garotinha Karla que padece de uma leucemia. O pai evidencia, de uma hora para outra, ser portador de uma tara sexual que é exposta de maneira direta, franca, sem rebuços, de uma realidade que desce a detalhes do grotesco onde o lado diabólico do erotismo – a busca ilegítima do prazer – é fuga ao desespero existencial decorrente também da impotência em relação à doença da filha. Talvez busque cegamente uma competição ‘vitoriosa’ com a morte na fugacidade de orgasmos que busca em relações sexuais com homens desconhecidos em hotéis, em coletivos, em sessões de felação em cinemas e com garotos de programa, tudo escondido sob um manto imenso de mentiras e dissimulações. Cai por terra qualquer sentido ético ou moral. E o próprio personagem pensa quando está prestes a ceder a tais inclinações da volúpia: “Dizem que unicamente ao terreno do absurdo pertencem as vontades que contradizem as mais sólidas convicções”. Quanto à Lúcia, o primeiro e único amor da vida de Roberto, da fase em que eram apenas dois jovens ingênuos perplexos ante a brutalidade do mundo, restou apenas outro farrapo humano. A tal ponto desce a degradação moral que ela, que passou por tantas e tantas barbaridades físicas e morais impostas pela repressão, já não distingue nada, a não ser continuar agarrada como um náufrago à sua única boia de salvação: “Se Roberto buscava novas formas de excitação, por que, ao invés de reprimi-lo, eu não transferia essa procura para um território onde eu poderia marcar seus passos e acompanhá-lo?” (p. 118). Este pensamento ocorreu-lhe quando de mais um desvio do casal, induzido por ela, e de consequências terríveis. O de passarem a frequentar sessões de suingue. Orgias coletivas, surubas, bacanais!

Resumo da triste ópera: A dor, o sofrimento, e o desespero das personagens permanece no nível da revolta, ou resignação. Incapazes que são, ou se tornaram, de refletirem para acionar dentro de si, mecanismos de reajustes ou alternativas de vida descente e humanamente viáveis. A revolta fundamental, tanto em face do absurdo da vida, quanto em face da repressão institucionalizada em todos os níveis, as incita a buscar estados de paroxismo que redundam em violência, em cegueira ética e moral e num claro sentido de inutilidade da existência, que é inclusive transmitido por tabela, à adolescentezinha Karla.

Consideramos, entretanto, que a proximidade relativa do arco temporal em que a narrativa finda, réveillon de 1999 ou seja, início do século XXI, é bem próxima do tempo em que o romance foi concebido ou publicado. Agora em 2023. O leitor deve ter em mente que não está assistindo uma época que passou e acabou-se, foi velada e enterrada. Está ainda em plena vigência. Se há uma frase em todo o romance que bem define tal situação, é esta: “O Brasil era outro e o mesmo a cada dia”. Nosso processo de redemocratização difícil, tortuoso, com avanços e recuos brutais como aconteceu nos últimos quatro anos, segue em meio a uma ambiência mundial dominada pelo dinheiro e pela erotização super desenfreada. Onde o espetáculo tornou-se a forma mais desenvolvida de relação entre as pessoas, porque as relações humanas caminham rumo ao aniquilamento. Estamos todos sós em meio a multidões amorfas, sem rostos e sentimentos, incapazes de resistir às imposições e apelos do esquema da ‘indústria cultural’, que nos reduz a consumidores de artefatos e imagens incessantemente produzidos. É brutal encruzilhada.

“Todos nós estaremos bem” é obra que poderíamos configurar em suma, como grande alegoria de nosso país e nosso tempo. A alegoria é a representação concreta de uma ideia abstrata. Exposição de um pensamento sob forma figurada em que se representa algo para indicar outra coisa. Uma metáfora continuada, como tropo de pensamento, consistindo na substituição do pensamento em causa por outro, ligando ao primeiro por uma relação de semelhança. Eis a virtualização do real significado que o autor tão habilmente soube germinar nos misteriosos meandros de suas entrelinhas.

Resta-nos finalmente, e numa perspectiva de síntese, abordar dois argumentos que o livro suscita: a certa altura a personagem Lúcia afirma: “Uma vez alguém me disse que o grande desafio da nova geração seria lidar com a liberdade. O da minha certamente é aceitar o fracasso.” Lidar com a liberdade. Sobretudo refletir sobre, que é o primeiro grande passo, e não continuarmos a dar cabeçadas confundindo isto com liberdade. Outra questão magistralmente trabalhada no romance, relativa ao medo elementar da vida humana. É fato que a morte acaba por a atingir-nos a todos indistintamente, mas o ponto fulcral, a grande questão é como cada um a recebe, posto que a consciência – que ninguém pode ludibriar –, estará sempre reverberando a dor e o sofrimento que impingimos à vida de nossos semelhantes. E isto é bem pior que a mais trágica das mortes.

Livro: “Todos nós estaremos bem” – Romance de Sérgio Tavares, Editora Dublinense, Porto Alegre – RS, 2023, 192p. - ISBN: 978-65-5553-090-2
Links: https://dublinense.com.br/livros/todos-nos-estaremos-bem/
https://www.facebook.com/sergio.tavares.3517
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Thalia58 29/12/2023

Acompanhamos a história de Roberto, um empresário da área da publicidade e Lúcia, uma guerrilheira do MR-8 durante a ditadura militar. Sobre o contexto histórico, é o período pós ditadura e transição para um governo democrático. É um livro difícil de digerir e ao mesmo tempo difícil de largar.

Cada parte da história é contada pelo ponto de vista dos três personagens principais, o Roberto, a Lúcia e sua filha que tem leucemia.

A princípio senti repulsa pelo Roberto porque ele se envolve com outras pessoas fora do casamento e sempre encobre com mentiras, enquanto sua esposa está cuidando da filha doente. Lúcia toma a iniciativa de melhorar sua relação através da participação de um grupo de casais que se encontra para ter relações sexuais.

A princípio, julguei bastante os personagens por suas decisões, mas me peguei pesando que é muito fácil julgar as ações dos outros quando se está de fora. E a medida que avançava na leitura, a única coisa que consegui sentir pelo personagem foi pena, por todos os eventos que acontecem, inclusive a reviravolta do meio para o fim do romance me deixou bem surpresa.

Esse é um tipo de leitura que mostra o quanto nós, seres humanos, somos imperfeitos e problemáticos.

Tem trechos bem difíceis de ler, principalmente quando Lúcia nos conta sobre as torturas que vivenciou durante a ditadura. E acho relevante livros com essa temática porque muitas pessoas acham que esse período da nossa história não aconteceu ou que muitas coisas foram exageradas.

Recomendo a leitura, só é preciso ter o estômago forte para alguns trechos do livro.
Brunalisss 29/12/2023minha estante
Estava procurando algo na temática! Estou terminando Violeta de Isabel Allende, que também conta muito sobre esse período da ditadura na América Latina. Obrigada pela resenha! Vou colocá-lo na minha lista!


Thalia58 29/12/2023minha estante
Vale a pena a leitura!! Ainda não li Violeta, você recomenda?


Brunalisss 29/12/2023minha estante
Recomendo muito! Vale a pena demais!


Brunalisss 29/12/2023minha estante
Estou concluindo e logo postarei a resenha.




Marcelo 10/07/2023

Resenha disponível no Booksgram @cellobooks ?
"Todos nós estaremos bem" é um romance que se passa no período entre 1982 e 1999, durante a transição entre a ditadura militar no Brasil e a suposta transição democrática. A obra retrata as desventuras e desesperanças de uma pequena família formada nesse período turbulento da história.

O protagonista e narrador da trama é Roberto, um jovem indiferente a causas políticas, mas obcecado por ganhar dinheiro. Ele se torna diretor de uma importante agência de comunicação que tem ligações sólidas com empresas ligadas ao regime militar e que financiam a repressão. Em 1966, ele se envolve com Lúcia, uma comunista convicta que acaba se tornando guerrilheira de um grupo contrarrevolucionário chamado MR-8, que realizava sequestros e assaltos a bancos. Lúcia é presa, torturada e exilada. Após reviravoltas temporais, o casal tem uma filha chamada Karla.

As personagens do livro são vítimas das contingências cruéis da existência. A filha do casal sofre de leucemia, o pai revela uma tara sexual por outros homens que o leva a buscar prazer de maneiras ilícitas e a mãe, que passou por torturas e sofrimentos, também se perde em busca de satisfação sexual em festas de casais. A história aborda a degradação moral e a violência como formas de escapar do desespero existencial e da impotência frente à doença da filha. A revolta contra o absurdo da vida e a repressão institucionalizada leva as personagens a buscar paroxismos que resultam em violência e falta de sentido na existência.

Em suma, "Todos nós estaremos bem" é uma obra que reflete sobre o Brasil e seu tempo, utilizando uma alegoria para abordar questões complexas. O livro mostra a realidade atual e os desafios enfrentados pela sociedade, desde a busca pela liberdade até a aceitação do fracasso. Também explora a degradação moral, a violência e a falta de sentido na existência.
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Vinicius 25/02/2023

A liberdade e o que fazer com ela
Dizem que os viciados sempre tentam buscar uma nova experiência que se assemelhe ao first high, o primeiro barato, e que todas as tentativas acabam frustradas, por nunca se igualarem em intensidade. A história de Roberto me trouxe essa lembrança.

Este não é um livro de fácil digestão. Temos um relato cru, cheio de personagens humanos, daqueles que revelam toda complexidade das suas escolhas e ações. Assim como cada um de nós, erram, tentam escolher melhor, erram de novo e por vezes acertam. Destaque para a personagem Lúcia, que traz um simbolismo bonito na luta contra a ditadura.

Aqui o reconhecimento ao Sérgio Tavares pela boa construção narrativa, dos personagens e das frases. Vamos da alegria ao asco, da excitação à tristeza de forma rápida e impiedosa.

Não me arrebatou com imaginei que faria, ainda assim, um ótimo exercício de reflexão sobre covardia, narcicismo e a fragilidade das nossas relações.
Marcelo 26/02/2023minha estante
Bom saber. Está na minha lista ?




Diego Piu 24/05/2023

Li rapidinho (furou fila sim!) pq vou participar pela primeira vez de um clube de leitura (25/05/23) organizado pela própria editora (Dublinense) com participação do autor (Sérgio Tavares).

Quando li a sinopse, na pré-venda, muita coisa me chamou a atenção e eu ja esperava um livro cinza (dificilmente se percebe outras cores, mas elas estão lá).

Lúcia, certamente uma personagem que gostaria de conhecer pessoalmente. Uma história de muita coragem, mesmo diante dos medos de retornar ao país (semi spoiler... desculpa).

Ambientação rica de informações históricas e de uma realidade tão sincera que muitas vezes duvidamos se as personagens são fictícias.
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@almicci.thiago 30/06/2023

Um livro explícito que fala sobre a vida de uma família que precisa enfrentar coisas de uma forma que não deveriam ser enfrentadas.
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Adélia 03/06/2024

O livro é bem pesado, a escrita realmente nos faz sentir a dureza da vida dos personagens, a vida dupla, o sofrimento da ditadura, a AIDS, câncer da filha... é um livro difícil de ler mas interessante, os personagens são complexos, gosto particularmente de Lúcia. É um livro 18+ com várias descrições de sexo bem explícitas, não sabia desse detalhe e me choquei bastante.
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Matheus656 05/07/2023

Roberto, um empresário enriquecido por seu trabalho com empresas financiadoras da ditadura militar, e lúcia, uma ex-guerrilheira do mr-8 envolvida em sequestros e assaltos a bancos, cruzam seus caminhos ao longo das décadas, desde o final dos anos sessenta até o início do novo milênio. o romance de sérgio tavares retrata uma geração que lutou por liberdade, porém enfrentou desafios ao tentar vivê-la plenamente após conquistá-la.

sobre escolhas, descobertas e solidão.

antes de mais nada, este livro não é de fácil leitura, principalmente porque apresenta um relato realista, repleto de personagens humanos que revelam toda a sua complexidade e, consequentemente, a obscuridade de suas escolhas e de ações. dito isso, é uma obra bela que me encantou desde o começo e que me provocou reflexões profundas: a carga emocional desse livro é absurda.

sem dúvida, o destaque do texto para mim foi a escrita fluida e envolvente do autor. a profundidade dos personagens também é outro ponto que merece grande destaque. cada um deles carrega as suas próprias dores e falhas, com vidas e experiências, que, embora tão diversas, invocam sentimentos tão universais. além disso, a narrativa multifacetada, com as perspectivas dos três personagens principais, me cativou.

muito ainda precisa ser absorvido e refletido para que eu entregue uma resenha melhor sobre esse livraço, mas de antemão: que leitura sensacional. com toda a propriedade posso dizer que esse livro foi um dos melhores que li na minha vida.

lindo e trágico - e tal qual a ficção, assim também é a vida. [é só se deixar guiar?].

gostei muito mesmo do texto e recomendo-o a todos. com uma linguagem fluida, personagens bem construídos e uma narrativa saudosista, ?todos nós estaremos bem? se apresentou como um excelente livro.
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Denise.Mineiro 22/08/2023

O livro conta a história de Roberto publicitário que ficou rico trabalhando para empresas que financiavam a ditadura militar e Lúcia uma ex guerrilheira do MR-8. Essa trajetória se passa do final dos anos 60 a virada do ano 2000. Foi bem interessante ler sobre momentos históricos tão próximos e que de alguma forma vivenciei? mas a história em si que permeia a vida do casal, não me preencheu, não me emocionou, não me trouxe nenhum sentimento de pesar por todo sofrimento vivido por Roberto e Lúcia? não gostei muito do livro
Nota 3,0
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Toni 16/03/2023

Todos nós estaremos bem [2023]
Sérgio Tavares (RJ, 1978-)
Dublinense, 2023, 192 pág.

Com pequenas alterações, segue o texto da orelha que escrevi a convite da editora:

“O Brasil era outro e o mesmo a cada dia”, nos confessa Roberto, um dos narradores e protagonistas deste romance. Ele é diretor de uma importante agência de comunicação que ganha notoriedade através de contratos com empresas financiadoras da repressão. Casado com Lúcia e pai de Karla, é um cidadão bem-sucedido que aos poucos se vê atingido por uma série de reveses. Junto com a narrativa dele, as vozes de Karla e Lúcia ajudam a compor um quadro familiar e social em franca decomposição.

A partir desse recorte cirúrgico de classe, uma trama de dissimulações, anseios sexuais, traumas e sintomas irrefragáveis de precariedade pulsa nas páginas do primeiro romance de Sérgio Tavares. Roberto testemunha não apenas as convulsões sociais e escândalos pelos quais atravessa o Brasil ao longo de quase quarenta anos, como também os golpes do destino que atingem sua esfera privada: um câncer e a epidemia de HIV que assombrou as décadas de 1980 e 1990. Ao mesmo tempo, leva uma vida dupla imposta por sua atração por outros homens, uma busca incessante que transforma as micropolíticas da memória e do corpo num campo de batalhas onde se atracam o Desejo e a Pulsão de Morte.

Nesse embate, a linguagem do romance não faz concessões a qualquer dos lados: busca sua síntese cruel e refinada, imunda e pungente, confessional e desconcertante. Num país em que as heranças conservadoras parecem incontornáveis e as marcas da tortura continuam a doer porque seus agentes permanecem impunes (e seguem torturando), Tavares apresenta uma história visceral despida de moralismos. A promessa presente em seu título – ainda que irônica, por vezes melancólica – nos entrega, ao fim e ao cabo, uma escrita ao mesmo tempo trágica e estimulante, capaz de revelar o quanto existe de desesperador em nossas frágeis esperanças.

#sergiotavares #dublinense #todosnosestaremosbem #romance #literaturabrasileira
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Peterson 18/01/2024

Estaremos bem?
Alguns resenhistas comentam os títulos que leem com uma distância abissal das suas sensações ao ler as narrativas. Quero fazer o contrário.

Uma amiga me indicou dizendo ser o melhor livro que ela lera em 2023. Fiquei interessado e, ao começar, não gostei tanto. Parece que tenho desinteresse em ler narrativas que estão em primeira pessoa. Mas continuei. A promessa de ser um bom livro era muito tentadora.

E vai mais além do que um bom livro! A narrativa é crua, com detalhes que, se não sórdidos, são, em alguma medida, quase ex excitantes. Roberto é um puto (sim, eu precisava gritar isso pra ele). Além de trabalhar para apoiadores da ditadura militar brasileira, ele é um embuste. Achou o amor da vida e trai a esposa com outros homens. E o autor nos traz as cenas picantes (obrigado, Tavares).

A história também é sobre a convivência num casamento que vai durando sem tesão, mas que, por outro lado, parece existir amor. Existe? Ou é a conveniência da vida já adaptada à vida adulta e suas responsabilidades? Deter-se na reflexão dessa parte é algo bom, faz-nos pensar no próprio casamento. Ui.

Ainda tem a menina que adoeceu e enquanto um câncer lhe rouba a vivacidade da infância, seu pai, que deve alternar a vigília com a mãe no hospital, vai demorar, porque ele estará em encontros clandestinos com outros homens. Posso gritar aqui? Roberto, cadê seus princípios, po**a?

Lúcia, não quero falar tanto sobre você, pois, pra mim, é a personagem grandona dessa história e não quero dar tanto spoiler. Mas é ela quem faz a chave girar até gozar. (obrigado, Tavares).

Já li em algum lugar que Roberto e Lúcia não souberam enfrentar a liberdade da pós ditadura. Há uma liberdade real para uma ex-guerrilheira? Vivemos nesse Brasil em que a liberdade, sobretudo a sexual, é respeitada? Ou estamos apenas julgando um homem casado com uma mulher que gosta de sentir prazer com outros homens?

Não julgo tanto Roberto, embora o ache um tanto inescrupuloso. E essa minha frase é um tanto contraditória. Mas você consegue entendê-la quando ler essa obra perfeita, cuja narrativa é plural em seus narradores. Há uma marca forte de uma pesquisa bem elaborada (ou de uma memória muito boa) quanto aos aspectos temporais, políticos, de vocábulos, comportamentais. O livro ultrapassou quaisquer expectativas.

Obrigado, Noemi (a amiga que emprestou o livro).
Noemi97 18/01/2024minha estante
Que bom que você gostou, Pet! Eu não saberia dar palavras dessa forma para as minhas sensações que essa experiência de leitura me trouxe. Amei sua resenha!




Carol 10/07/2023

Gostei do livro, mas achei algumas partes um pouco confusas e, algumas vezes, um vocabulário que não me parecia encaixar bem no contexto. Nessas horas acabava me desprendendo da leitura... mas no geral um bom livro!
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vg0mes 15/01/2024

História Magnética.
Aos meus olhos, há no título uma ironia que está diluída em toda a história. Quem está bem? Além disso, a capa da edição dialoga ipsis litteris com as camadas de vidas do Sérgio. Suas personalidades mudam de acordo com o ambiente. Existe uma versão para a esposa, Lúcia, outra para sua filha, Karla e tantas outras facetas que se desdobram na sua sexualidade a qual, por ora, foi reprimida e mais adiante vivida à fio.

A obra abre espaço para discutir os limites, vantagens e desvantagens das novas formas de relacionamento (aliás, nem tão novas assim), sobretudo o aberto. Na quarta capa há a seguinte passagem: "Sérgio Tavares retrata uma geração que lutou por um ideal de liberdade, mas que também não estava pronta para vivê-lo quando o alcançou." Acredito que nenhum dos personagens estavam prontos para essa liberdade, cada um sucumbiu a sua maneira, em seu tempo. Todos foram vítimas de suas próprias liberdades!

Em vários trechos me coloquei no lugar de Sérgio o qual por várias vezes ficou numa linha tênue entre o tesão e a paternidade, essência e a aparência, exposição e a omissão.. Reitero, não acho que ele foi o vilão frente aos desdobramentos. Ele é somente mais uma vítima. Todos são vítimas!

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Evelyn 14/03/2023

ARREBATADOR E INESQUECÍVEL
Já acabei essa leitura faz um tempo, mas ainda me pego pensando nos personagens e no enredo. A maestria de Sérgio Tavares para construir seus personagens, tão humanos, tão execráveis, tão inocentes é a maior das grandezas do livro - mas, nem de longe é a única. A história se passa desde a ditadura até o fim dos anos 90 e enquanto acompanhamos o Brasil se transformar e mudar pra ser o mesmo e ficar sempre igual, também vemos uma família lutando contra seus demônios, seus medos, seus sonhos, seus preconceitos. Essa é uma história de ganhos (materiais) e perdas (não só materiais), desejos, frustrações, família, amor e solidão. Eu queria ter chorado. Mas não há espaço para as minhas lágrimas nessa narrativa tão crua, tão necessária, tão urgente e atual.
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