Thalissa.Betineli 23/01/2024
Quando noos tornamos os monstros.
Primeiro de tudo, na minha opinião, Possuída pelo Pecado segue a linha mais tradicional (e mais antiga) do dark romance. Romance, na linha de literatura, nem sempre corresponde ao romance romântico, e a proposta aqui é exatamente caminhar no lado oposto ao romance romântico mesclado ao dark romance que hoje em dia está em alta.
Portanto, nem sempre teremos redenção, mocinhos, ou até mesmo... o romance. Esse conto me lembrou o sentimento que tenho quando leio contos do Edgar Allan Poe: até onde o ser humano, no auge do seu descontrole emocional (e às vezes, fugindo da racionalidade), é capaz de ir?
Quando... o monstro não está debaixo da cama, mas é quem dorme nela?
Afinal, o ser humano criou o monstro. Ele projeta e dá voz ao monstro imaginário. Edgar sempre foi muito criativo em criar situações que nos levam a questionar a razão, torcer e ao mesmo tempo entender que o protagonista não merece e nem terá o final feliz, e sim aquele pelo qual ele procurou (muito realista, às vezes).
Possuída Pelo Pecado trouxe essa atmosfera do romance sombrio. Desde a primeira linha, o conto não promete um romance, mas nos mostrar o monstro que surge quando uma mulher é levada ao extremo, e assim, já não tem nada a perder (afinal, tiraram até mesmo sua humanidade).
Éden é uma GP de La Catedral, e destituída de todos os seus direitos, é uma marionete de homens com muito poder. Desde o começo, temos a sensação de não estarmos em uma boate de humanos, mas sim de meras sombras de monstros. Não há rostos, apenas presença esmagadora, espreitando, se aproveitando da lux.uria, depre.vação e todas as facetas mais sombrias do ser humano.
Ela não estava feliz, mas, ao não ter esperanças, era mais fácil de aguentar. Quando um homem lhe estende a mão, e a faz se sentir amada, alimentando suas esperanças de um dia escapar do inf.erno em que vive, temos também o nascimento do monstro. Afinal, um monstro criou outro. Ele, ao alimentar uma garota. Ela, por ter esperanças.
Não dando spoiler... achei o tamanho perfeito. É frenético, é coerente, a escrita é coesa, instigante, envolvente, e nos faz mergulhar nas aflições e na própria loucura da protagonista. Nós podemos não concordar com suas decisões, tomadas no limite da lucidez, mas, é impossível não entender. É o final certo, é o final fechado com chave de ouro para uma história sombria, que busca mostrar o pecado da ira, que nos leva ao limite da humanidade, e joga no nosso colo o lado mais macabro e cruel. Não estamos lendo mocinhas e vilões, ou príncipes encantados. É uma história sombria, quase um passeio por uma floresta rodeada de olhos famintos, esperando o momento em que a chapeuzinho vermelho será corrompida por todos os lobos maus que ali habitam. E ela é.
Ela não tem final feliz, porque também não merece.
Porque o conto mergulha no mais dark romance possível, e nos brinda com uma sensação angustiante e de pura satisfação (principalmente para quem gosta de suspense/terror/horror).
É uma construção gradativa, com personagens muito bem criados para a proposta e muito bem desenvolvidos para o tamanho da história. Consegui visualizá-los perfeitamente, fui capaz de imaginar todos os cenários (até o final), e terminei com um sorriso de quem se lembraria para sempre do sentimento que foi encontrar o lado mais insano da humanidade.
Possuída pelo Pecado dita um ritmo e tom inesquecíveis.
E estou doida para começar o próximo conto, na expectativa de, outra vez, ser levada para esse lugar que eu adoro: entre os monstros.