Gui 28/11/2023
Quando Gregor Samsa acordou dos seus sonhos intranquilos...
Existe algum tipo de magnetismo nessa obra que nos faz perder um pouco a noção de tempo e quantidade. É uma história pequena, menos de 100 páginas em uma edição de bolso, e ao mesmo tempo que, de fato, é uma leitura rápida, parece que estamos sugados em uma espiral de pensamentos existencialistas e melancólicos, quase uma viagem, no qual a sensação é a de não acabar nunca.
Gregor Samsa acordou num dia qualquer como uma barata, um monstro nojento e incapaz de continuar sua vida, destinado a passar o resto dos seus dias definhando no quarto até a sua morte precoce e, a partir de determinado momento, desejada pela sua própria família. Claro, a barata é uma metáfora, e a história aqui fica um pouco mais perturbadora quando percebemos que qualquer um pode acordar dos seus sonhos intranquilos como Gregor Samsa acordou: incapaz, e condenado a definhar até a morte.
Inapto e esquecido, a presença de Samsa não faz falta, mas sim a sua responsabilidade: o de patriarca da família. Por mais que seu pai ainda estivesse vivo, era Gregor quem cuidava de tudo, quem financiava as despesas e colocava comida na mesa. No entanto, uma única falha na exatidão da sua rotina foi o suficiente para ele perder tudo ? seu emprego, o apreço da sua família.
A Metamorfose pode ser um livro sobre acordar e se ver incapaz de seguir a sua vida, mas é também além disso, é uma crítica existencialista e muito triste a um sistema que nos obriga exatidão e perfeição, um sistema que não perdoa falhas e, caso um dia você acorde dos seus sonhos intranquilos diferente do que você foi nos outros dias, a única solução é morrer.