João Pedro 01/02/2024"Aos sonhos que ficaram pelo caminho"Sabe aquele tipo de história que chega suave, descontraída, te puxa pela mão como um convite para ir ali comer uma empada, tomar um café e fofocar, mas aí te joga uma bomba no meio dos peitos e você que se vire, em posição fetal, para rearranjar seus sentimentos e tentar se reposicionar no mundo? É assim o segundo romance de Aureliano, escritor e artista gráfico de Natal - e, portanto, meu conterrâneo.
Juro como comecei a ler "Reinventando Denise" bem despojado de maiores pretensões. Eu já queria ler algo de Aureliano há um tempo, mas aí seu livro caiu em minhas mãos no momento certo e eu me joguei nessa leitura. A história se passa no Rio Grande do Norte e tem sotaque potiguar e cheiro de maresia. Nela, conhecemos Denise, uma personagem bem doidinha e alternativa, que, por algum motivo desconhecido, se mudou de Natal para São Paulo de supetão, o que estremeceu sua relação com Lúcio e Bianca, seus amigos de Natal.
O retorno de Denise à Natal e uma história sobre uma estátua decepada de um anjo azul dão o mote do enredo, que já começa em movimento, como se no meio da história, mas, aos poucos, vai sendo construído. O leitor, paulatinamente, vai inventando em sua cabeça a imagem de Denise, de Lúcio e de Bianca. Uma viagem do trio à charmosa Praia de Pipa e um punhado de dores e histórias mal resolvidas do passado coloca os personagens em um caldeirão fervilhante de emoções prestes a explodir.
O que parece ser apenas uma história leve e divertida sobre o reencontro de três amigos, na verdade, guarda profundas reflexões sobre os nossos reais desejos na vida e sobre os sonhos que deixamos pelo caminho. Se cada uma das personagens enfrenta seus próprios demônios, não há como não respingar sobre o leitor, mergulhado na trama, o peso da dúvida sobre o que está fazendo com a própria vida e para onde está se guiando.
"Reinventando Denise" é um portal para crises existenciais e autoanálises contundentes. Mas é tão gostoso de ler que você nem percebe (ou melhor, só percebe quando já está lá). As ilustrações de Aureliano contribuem severamente para que você embarque nessa viagem bem desavisado de suas proporções interplanetárias.