Lisa 16/08/2024
Um amor maduro
Yuling Kuang é uma das vozes sino-americanas e como tal escreve sobre o drama de ser filha de chineses em solo estadounidense. Fala não apenas sobre a distância geracional mas principalmente sobre a cultural, o desequilíbrio de crescer em um lar chinês em um país tão distante do seu natal.
Como terminar uma história de amor narra então, a história de Helen junto a sombra de Michelle, sua irmã suicida e seu encontro com Grant, o homem cujo carro Michelle escolhera como alvo quando ainda eram adolescentes. Esse trauma não cicatrizado pulsa em carne viva em Helen e sua família, que não aceita essa morte e elabora esse luto com distanciamento, hiper proteção da filha restante e da negação da realidade. Michelle foi assassinada, não eram problemática, não precisava de ajuda em um lar fechado demais para enxerga-la. Até que os destinos dos dois se reencontram em uma sala de roteiro.
Kuang aborda assim, temas sensíveis em seu romance, a trajetória de Helen de reconhecer a verdade, de assumir em voz alta a tragédia que marca sua família e da redenção de Grant com ela e com ele mesmo é madura, dolorida e palpável. Não há apenas a família Zhang, há o adolescente traumatizado cuja garota depressiva "estragou" toda sua vida, cuja morte carrega na costa, cuja lembrança lhe gera intensos ataques de ansiedade.
Este livro é também uma narrativa muito chinesa, ao retratar a relação de Helen com seus pais, a dinâmica de dever e afeto, de pequenez sentida pela protagonista potencializada pela história familiar. Contudo, senti que faltou a autora falar sobre xenofobia. Kuang escreve sobre ser filha de pais estrangeiros e dedica seu livro às filhas mais velhas destes, escreve sobre a inadequação de não ser chinesa o suficiente para a família, mas não ser estadounidense o suficiente para os EUA. Mas não menciona o intenso ódio a asiáticos no país menos seguro a chineses que é os Estados Unidos? Sim, é um romcom, mas também foi escolha da autora ser política, a quadro parece completo sem isso, que poderia ter entrado como parte do drama de Michelle ou no de Helen pós isso.
Por fim, esse foi um romance que me conquistou, nem tudo eu gostei, mas de modo geral sim. O final dentre todas as partes foi o mais sensível, as cartas de Helen para a irmã partem o coração e nos debulha em lágrimas. O desenvolvimento dos personagens é gigante e fluído, a autora não se apressa. Além de tocar com muita responsabilidade na temática de saúde mental e terapia, o que pra mim é sempre um ponto a mais.