Wanderley 20/01/2023
Quando a perfeição se transforma em prisão
Após vencer a Guerra de Troia, Ulisses naufraga no mar ao retornar para casa, mas é salvo pela deusa Calipso, que o leva para a ilha de Ogígia, onde tudo é perfeito. No entanto, passados os primeiros momentos de encanto, e apesar do amor da belíssima deusa que lhe prometeu a imortalidade, ainda assim, Ulisses cai em profunda tristeza, saudoso da mulher Penélope e do filho Telêmaco.
Eça de Queiroz centra atenção nessa passagem da Odisseia para falar sobre a importância daquilo que nos parece repulsivo: a mortalidade, o envelhecimento, os nossos defeitos e as dificuldades da vida. A certa altura, Ulisses confessa a Calipso toda sua frustração: “Oh Deusa venerável, não te escandalizes! Perfeitamente sei que Penélope te está muito inferior em formosura, sapiência e majestade. (...) Mas, oh Deusa, justamente pelo que ela tem de incompleto, de frágil, de grosseiro e de mortal, eu a amo, e apeteço a sua companhia congênere!”
A perfeição era prisão para Ulisses, que se realizava justamente lutando contra adversidades, que via nas limitações de sua amada Penélope, espelho e amparo para lidar com suas as próprias imperfeições. A deusa o constrangia, enquanto a natureza de Penélope o libertava. É uma bela alegoria para encararmos a vida sem nos afundarmos em lamentações. O tempero da vida está na sua imprevisibilidade, como explica o próprio Ulisses: “Oh Deusa, o irreparável e supremo mal está na tua perfeição!”.
É um texto breve, de leitura rápida, mas profundo em sua mensagem.
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