Michele Soares 26/01/2021
Elementar...
Não, não espere que esta frase se complete com um "meu caro Watson". Após a minha leitura destas Obras Completas acabei de perceber que vivemos um caso semelhante àquele que em que a consciência coletiva comete um erro crasso. Afinal, muitos de nós até hoje reproduzem as palavras de Darth Vader em "O Império Contra-Ataca" como se ele realmente tivesse dito "Luke, eu sou seu pai" e não somente "Eu sou seu pai", como de fato disse. Ao menos nesta edição em que realizei a leitura, jamais cheguei a encontrar em nenhum momento esta frase perfeitamente formada ? de "elementar" contabilizei uns quatro, enquanto de "meu caro Watson" pode haver centenas. De todo modo, o que importa? Elementar ou não, estamos diante de uma grande obra formada por 4 romances e 56 contos, em sua maioria, cheios de vigor.
Depois de um 2020 de muita crise e pouca leitura, plenamente incentivada por uma série que comecei no Natal, a própria "Sherlock", da BBC, passei à leitura da Obra Completa de Sherlock Holmes, começando pela leitura de "Um Estudo em Vermelho", iniciado e finalizado ainda no dia 31/12. Neste fatídico dia, eu estava nos meus planos começar a leitura de um romance de Agatha Christie, mas isso nunca chegou a acontecer, a partir do momento em que li as primeiras linhas do romance de Doyle. Dizem que quem está na chuva, etc.
Terminada a leitura do último livro de contos neste dia 26/01, posso dizer que vivi uma grande jornada, uma que me instigou a ler com a voracidade e a emoção que os ares mórbidos do último ano me arrancaram por completo. Foi uma leitura monumental, de diversos momentos altos e poucos momentos baixos, de lágrimas, de riso. Durante o último mês, a Baker Street 221B me foi algo como um lar, e seus moradores, Sherlock Holmes e dr. Watson, não foram outros senão os meus guias no espaço-tempo da Inglaterra vitoriana à da 1ª Guerra Mundial.
Não planejo ter filhos e no final da vida arrisco-me a fazer das palavras de Brás Cubas as minhas próprias: "Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria". Entretanto, de antemão tenho dois arrependimentos. Um deles, que se projeta para o passado, lamenta não ter lido Sherlock antes, ter crescido acompanhando suas histórias. O outro, que se projeta sobre o futuro, me diz que, caso eu tivesse filhos, seria um prazer ler as aventuras do detetive para eles antes de dormir, ninando-os ao som distante das cascas dos cavalos, do trem partindo da estação e do violino que nunca, nunca para de tocar...