Filino 08/10/2023
Que falta faz um Merquior...
Um intelectual precocemente retirado do nosso convívio. Uma figura mais alinhada à direita mas convivia muito bem com personagens à esquerda, a exemplo de Carlos Nelson Coutinho e Leandro Konder (algo que pode soar estranho nestes nossos tempos de intolerância política). José Guilherme Merquior foi isso tudo. E esse livro é uma bela amostra da capacidade do autor: trata-se de uma reunião de artigos publicados, em sua grande maioria, nas páginas de jornais, em que são tratados assuntos que vão desde a Filosofia até a momentos da história política do Uruguai. Difícil conceber que a enorme profusão de informações, bem como um senso crítico aguçado, provinham de uma mente que contava pouco mais de 40 anos quando esses textos foram reunidos.
Sim, aqui há uma defesa do liberalismo, mas não aquele liberalismo "inocente" que se vê alheio a questões sociais. Merquior ressalta isso em diversas passagens, não abrindo mão que haja sim um papel a ser desempenhado por um Estado-previdência, nos moldes de uma social-democracia. Ele se põe, com todas as letras, contra uma concepção de Estado "neoliberal", em que o mercado é o senhor e a razão da própria sociedade.
Nessas páginas, o leitor é instigado pelas ideias e pelas referências dadas pelo autor. Alguns textos são um pouco mais complexos; outros, mais leves. Mas dá para acompanhar. Também se faz presente, aqui, um conhecido texto no qual é apontada uma grande semelhança entre os textos de Marilena Chaui e Claude Lefort - o que redundou em uma polêmica segundo a qual a professora da USP teria "plagiado" o autor francês.
Sim, Merquior vale - e muito - a pena. Uma voz lúcida e culta, numa prosa elegante.