spoiler visualizarVitória 13/08/2024
"Mas isto aqui é um manicômio!"
Certa personagem exclamou em determinada parte do livro "mas isto aqui é um manicômio" e me pareceu uma ótima frase para resumir esse livro. Passei 50% do livro confusa e 50% perplexa. Não é um leitura fácil, demorei muito para terminar. Entretanto, é uma leitura que vale o esforço. Várias são as temáticas que se pode refletir e questionar nessa obra. Cada personalidade é única, em especial o protagonista, mas os secundários não perdem em profundidade. Dostoiévski continua sendo Dostoiévski, mesmo não sendo tão bom como Crime e Castigo e os Irmãos Karamazov.
~ Citações favoritas ~
O que acontece com a alma nesse instante, a que convulsões ela é levada? Uma profanação da alma e nada mais! Está escrito: "Não matarás", então porque ele matou vão matá-lo também? Não, isso não pode. - Míchkin (Pág. 42)
Reflita, por exemplo, se há tortura; neste caso há sofrimento e ferimentos, suplício físico e, portanto, tudo isso desvia do sofrimento moral, de tal forma que você só se atormenta com os ferimentos, até a hora da morte . E todavia a dor principal, a mais forte, pode não estar nos ferimentos e sim, veja, em você saber, com certeza, que dentro de uma hora, depois dentro de dez minutos, depois dentro de meio minuto, depois agora, neste instante - a alma irá voar do corpo, que você não vai mais ser uma pessoa, e que isso já é certeza; e o principal é essa certeza. Eis que você põe a cabeça debaixo da própria lâmina e a ouve deslizar sobre sua cabeça, pois esse quarto de segundo é o mais terrível de tudo. O senhor sabe que isso não é fantasia minha, que muitas pessoas disseram isso? Eu acredito tanto nisso que lhe digo francamente qual é minha opinião. Matar por matar é um castigo desproporcionalmente maior que o próprio crime. A morte por sentença é desproporcionalmente mais terrível que a morte cometida por bandidos. Aquele que os bandidos matam, que é esfaqueado à noite, em um bosque, ou de um jeito qualquer, ainda espera sem falta que se salvará, até o último instante. Há exemplos de que uma pessoa está com a garganta cortada, mas ainda tem esperança, ou foge, ou pede ajuda. Mas, no caso de que estou falando, essa última esperança, com a qual é dez vezes mais fácil morrer, é abolida com certeza; aqui existe a sentença, e no fato de que, com certeza, não se vai fugir a ela, reside todo o terrível suplício, e mais forte do que esse suplício não existe nada no mundo. Traga um soldado, coloque-o diante de um canhão em uma batalha e atire nele, ele ainda vai continuar tendo esperança, mas leia para esse mesmo soldado uma sentença como certeza, e ele vai enlouquecer ou começar a chorar. Quem disse que a natureza humana é capaz de suportar isso sem enlouquecer? Para quê esse ultraje hediondo, desnecessário, inútil? Pode ser que exista um homem a quem leram uma sentença, deixaram que sofresse, e depois disseram: " Vai embora, foste perdoado". Pois bem, esse homem talvez conseguisse contar. Até Cristo falou desse tormento e desse pavor. Não, não se pode fazer isso com o homem! - Míchkin (Pág. 43 - 44)
com muita frequência apenas parece que não há pontos em comum, no entanto eles existem muito... é por causa da indolência humana que as pessoas se classificam umas às outras a olho e não conseguem chegar a nada... - Míchkin (Pág. 48)
Aliás, é sabido que o homem excessivamente envolvido por uma paixão, sobretudo se já está entrado em anos, fica totalmente cego e disposto a suspeitar de esperança onde ela absolutamente inexiste; além disso, perde a razão e age como uma criança tola, mesmo sendo um poço de sabedoria. (Pág. 72)
Pensava sempre como iria viver; queria experimentar o meu destino, ficava desassossegado, sobretudo em alguns momentos. As senhoras sabem que esses momentos existem, especialmente quando estamos sós. - Míchkin (Pág. 81)
?E se eu não morrer! E se eu fizer a vida retornar?que eternidade! E tudo isso seria meu! E então eu transformaria cada minuto em todo um século, nada perderia, calcularia cada minuto para que nada perdesse gratuitamente!?. Ele dizia que esse pensamento acabou se transformando em tamanha raiva dentro dele que teve vontade de que o fuzilassem o mais rápido possível. - Míchkin (Pág. 84)
Então, o que depois ele fez dessa riqueza? Viveu cada minuto ?calculando?? ?Oh, não, ele mesmo me contou?eu já lhe havia perguntado sobre isso?,não foi nada desse jeito que ele viveu, e perdeu muitos e muitos minutos. ?Então quer dizer, e aí está uma experiência, quer dizer que não se pode viver de verdade ?fazendo cálculo?. Por algum motivo não se pode mesmo. (Pág. 84)
Pode-se dizer tudo a uma criança?tudo (Dostoiévski externava constantemente essa ideia em conversas privadas e a repetia a seus filhos. (N. da E.)); sempre me deixou perplexo a ideia de como os grandes conhecem mal as crianças, os pais e as mães conhecem mal até os seus próprios filhos. Não se deve esconder nadas das crianças sob o pretexto de que são pequenas e ainda é cedo para tomarem conhecimento. Que ideia triste e infeliz! E como as próprias crianças reparam direitinho que os pais acham que elas são pequenas demais e não entendem nada, ao passo que elas compreendem tudo. (Pág. 91)
(Dostoiévski escreveu no Diário de um escritor, de fevereiro de 1876: ?não devemos ser arrogantes com as crianças, somos piores que elas. E se lhes ensinamos alguma coisa a fim de torná-las melhores, elas também nos ensinam muito e também nos tornam melhores já com o simples contato com elas. Elas humanizam a nossa alma com seu simples aparecimento entre nós?. (N. da E.)) (Pág. 92)
Por intermédio das crianças cura-se a alma... - Míchkin (Pág. 92)
Quando, mais tarde, todos me acusaram?inclusive Schneider?,perguntando porque eu conversava com elas como se conversa com gente grande e não escondia nada delas, eu lhes respondi que era uma vergonha mentir para crianças, que elas já sabiam mesmo de tudo, por mais que se escondesse delas a realidade, e elas acabariam tomando conhecimento, e ainda por cima de forma indecente, ao passo que de minha parte ficavam sabendo das coisas de modo não indecente. Bastava apenas que cada um se lembrasse de que já havia sido criança. - Míchkin (Pág. 96)
A senhorita é tão bela que dá até medo de olhá-la.
?E só? E as qualidades??insistia a generala. ?É difícil julgar a beleza; eu ainda não estou preparado. A beleza é um enigma. - Míchkin (Pág. 102)
Uma imbecil de coração e sem inteligência é uma imbecil igualmente infeliz como a imbecil que tem inteligência e não tem coração; nós duas somos infelizes, nós duas também sofremos. - Lisavieta Prokófievna (Pág. 108)
Mais uma coisa imprevista, porém coube a ele o suplício mais terrível para um homem vaidoso?o tormento do rubor por seus familiares, em sua própria casa. (Pág. 137)
Parece-me que isso acontece a torto e a direito: os homens casam por dinheiro mas o dinheiro é da mulher. - Míchkin (Pág. 153)
O senhor não desconfia de que ardis o egoísmo humano é capaz. - Gánia (Pág. 153)
Uma vez com dinheiro, saiba que serei um homem original no supremo grau da palavra. O dinheiro é mais abjeto e odioso porque ele dá até talento. E continuará dando até a consumação do mundo. - Gánia (Pág. 156)
?É porque, diz ela, do mesmo jeito que a mãe sente alegria quando recebe o primeiro sorriso do seu recém-nascido, Deus sente essa mesma alegria sempre que vê do céu um pecador se posicionando de todo coração para orar diante Dele.? - Míchkin
a essência do sentimento religioso não se enquadra em nenhum juízo, em ato ou crime ou nenhum ateísmo; aí há qualquer coisa diferente e que vai ser sempre diferente. Aí há qualquer coisa sobre a qual irão escorregar eternamente os ateísmos e da qual irão dizer eternamente coisas diferentes. No entanto, o principal é que a gente percebe isso com mais clareza e antes de tudo no coração russo, eis a minha conclusão! É uma das minhas primeiras convicções que eu extraio da nossa Rússia. Existe o que fazer, Parfen! - Míchkin
O que efetivamente fazer com a realidade? Note-se que isso mesmo já acontecia, note-se que ele mesmo já conseguira dizer para si mesmo, naquele mesmo segundo, que esse segundo, por uma felicidade infinda que ele sentia plenamente, talvez pudesse valer mesmo toda a vida.
Mas a alma alheia é escuridão, e a alma russa também é escuridão; para muitos é escuridão.
A compaixão é a lei mais importante e talvez a única da existência de toda a humanidade.
Parou por um instante. Às vezes isso acontece com as pessoas: umas lembranças repentinas e insuportáveis, sobretudo conjugadas com vergonha, costumam paralisar uma pessoa por um instante no lugar.
Não existe nada melhor para corrigir-se que recordar o passado com arrependimento.
O general, como todos os beberrões constantes, era muito sensível e, como todos os beberrões excessivamente decaídos, suportava com dificuldade as lembranças de um passado feliz.
Outra vez tirando coisas de livros, Kólia?observou Adelaida.? Aliás ele não consegue falar de outra maneira a não ser tirando de livros?secundou Ievguiêni Pávlovitch?,ele se exprime por frases inteiras tiradas de resenhas críticas.
Mas nós entendemos precisamente que se aí não existe direito jurídico, em compensação existe direito humano, natural, o direito do bom senso e da voz da razão, e admitamos que esse nosso direito não está escrito em nenhum código humano podre, mas um homem decente e honesto, isto é, o mesmo que um homem de bom senso, tem a obrigação de permanecer decente e honesto até mesmo naqueles pontos que não estão escritos nos códigos.
Mas seja como for ele estava com metade do seu direito: a publicidade é um direito legítimo de qualquer um, logo, de Burdovski também. Que ele mesmo responda pelos seus absurdos.
A transparência é um direito universal, nobre e benéfico.
Realmente, senhores, o que é isso? Não se pode dizer uma única palavra com sinceridade que os senhores logo ficam ofendidos!
Mas isto aqui é um manicômio!?gritou Lisavieta Prokófievna.
Se até o senhor acabou de declarar que o próprio defensor declarou em julgamento que não existe nada mais natural do que matar seis pessoas movido pela pobreza, então é o final dos tempos. Isso eu ainda não tinha ouvido falar. Agora tudo ficou esclarecido para mim!
Leva por consciência! Isso para ele não é uma desonra! É um ?ímpeto de desespero nobre?, é a ?negação? ou sabe lá o diabo o quê... Arre! Tudo anda de pernas para o ar, tudo às avessas.
A mãe pode até ser uma imbecil, mas ainda assim tu deves ser um homem com ela!...
Reconhecem a sociedade como bárbara e desumana porque ela difama uma moça seduzida. E se tu reconheces que a sociedade é desumana, então reconheces que essa sociedade causa dor a essa moça. E já que causa dor, então como tu mesmo expões essa moça nos jornais diante dessa mesma sociedade e exiges que isso não seja doloroso para ela? É uma loucura! Vaidosos! Não acreditam em Deus, não acreditam em Cristo! Mas acontece que os senhores está de tal forma corroídos pela vaidade e pelo orgulho que vão acabar devorando uns aos outros, é isto que eu prevejo para os senhores. Isso não é uma bagunça, isso não é o caos, não é o horror? E depois disso este desavergonhado ainda vai se arrastar atrás deles para pedir desculpa! Será que entre os senhores existem muitos assim? Por que esse risinho? Porque eu me difamei com os senhores? Ora, já estou difamada, nada mais resta a fazer!...
É que eu a conheço, a senhora é boa, o príncipe também... nós todos somos gente boníssima a ponto de sermos cômicos...
Agora eu não quero nada, não quero querer nada, eu me dei a palavra de já não querer nada; que procurem, que procurem a verdade sem mim! É, a natureza é debochada! Por que ela?retomou ele com fervor?,por que ela cria os melhores seres para depois debochar deles? Ela agiu de tal maneira que o único ser que na face da terra foi reconhecido como a perfeição... ela agiu de tal modo que, depois de mostrá-lo aos homens, destinou a ele mesmo dizer por que motivo se havia derramado tanto sangue, e que se tivesse sido derramado todo de uma só vez as pessoas teriam se afogado na certa! Oh, é bom que eu esteja morrendo!
O príncipe estava muito contente por finalmente o terem deixado só; ele desceu da varanda, atravessou o caminho e entrou no parque; queria ponderar e decidir um passo a ser dado. Mas esse ?passo? não era daqueles que se ponderam e sim daqueles que justamente não se ponderam e simplesmente se decide por ele: súbito sentiu uma terrível vontade de largar tudo ali e voltar para o lugar de onde viera, para algum lugar mais distante, para os confins, partir agora mesmo inclusive sem se despedir de ninguém.
É como se houvesse alguma coisa no ar, como se fosse um morcego, a desgraça voando, e eu com medo, com medo!...?.
A todo instante se queixam de que entre nós não há gente prática; de que políticos, por exemplo, há muitos; generais também há muitos; administradores vários hoje existem em profusão, e no número que se fizer necessário?mas gente prática, não. Pelo menos, todo mundo se queixa de que não há.
Parece que há tantas repartições no serviço público que dá até medo pensar; todo mundo foi servidor, todo mundo é servidor, todo mundo quer ser servidor.
Pensando bem, estamos falando à toa dos servidores, nós queríamos falar mesmo era de gente prática.
A falta de originalidade existe em toda parte, em todo o mundo, desde que o mundo é mundo sempre foi considerada a primeira qualidade e a melhor recomendação do homem de ação, de ação e prático, e pelo menos noventa e nove de cada cem pessoas (ao menos mesmo) sempre sustentavam essas ideias e só uma em cada cem via sem e continua a ver a coisa de modo diferente.
?É uma gente estranha demais!??pensou o príncipe Sch., talvez pela centésima vez desde que travara conhecimento com elas, mas... gostava daquela gente estranha.
Covarde é aquele que tem medo e foge; mas quem tem medo e não foge ainda não é um covarde?sorriu o príncipe depois de meditar.
Eu não conseguia suportar aquela gente naquele corre-corre, naquela agitação, eternamente preocupada, lúgubre e alarmada, que passava ao meu lado no vaivém pelas calçadas. por que aquela eterna tristeza, aquele eterno alarme e agitação; aquela raiva lúgubre (porque essa gente é má, má, má!)? De quem é a culpa se eles são infelizes e não sabem viver, tendo sessenta anos pela frente? Por que Ziernítzin se permitiu morrer de fome tando sessenta anos pela frente?
A questão está na vida, apenas na vida?no seu descobrir-se, contínuo e eterno, e de maneira alguma na sua descoberta!
Tudo isso era natural, as pessoas foram criadas mesmo para atormentarem umas às outras.
Passei a sair de casa, mais amiúde no lusco-fusco. Eu gostava do lusco-fusco de março, quando começava a fazer frio e acendiam os lampiões; às vezes caminhava para longe.
Quem atenta contra uma ?esmola? isolada?comecei?atenta contra a natureza do homem e despreza a sua dignidade pessoal.
O bem isolado sempre permanecerá porque é uma necessidade do indivíduo, uma necessidade viva da influência direta de um indivíduo sobre outro.
Não reconheço juízes acima de mim e sei que neste momento estou fora do alcance de qualquer poder jurídico.
Agora recordava que havia estendido as mãos naquele azul-claro e sem fim e chorado. Atormentava-o o fato de que ele era totalmente estranho àquilo tudo. Que festim é esse, que grande e sempiterna festa é essa que não tem fim e que há muito o vem arrastando, sempre, desde a infância, e à qual ele não encontra meio de juntar-se. Toda manhã nasce esse mesmo sol claro; toda manhã há arco-íris na cachoeira; toda tarde a montanha nevada, a mais alta de lá, ao longe, nos confins do céu, arde em chama purpúrea; cada ?pequena mosca, que zune ao seu lado na réstia quente do sol é uma participante de todo esse coro: conhece o seu lugar, gosta dele e é feliz?; cada pé de relva cresce e é feliz! E tudo tem o seu caminho, e tudo conhece o seu caminho, sai cantando e chega cantando; só ele não sabe de nada, não compreende nada, nem as pessoas, nem os sons, é estranho a tudo e é um aborto.
? Se veio sem saber por quê, então você a ama muito?pronunciou ela finalmente.
? A delicadeza e a dignidade é o próprio coração que ensina e não um mestre de dança?concluiu sentenciosa Lisavieta Prokófievna
Há pessoas de quem é difícil dizer alguma coisa que as represente de uma vez e integralmente, no seu aspecto mais típico e característico; são aquelas habitualmente chamadas de pessoas ?comuns?, ?maioria? e que, de fato, constituem a imensa maioria de qualquer sociedade. Em seus romances e novelas, a maioria dos escritores procura pegar os tipos da sociedade e representá-los em imagens e forma artística?tipos que se encontram integralmente com extraordinária raridade na sociedade e ainda assim são quase mais reais que a própria realidade.
Não esqueçamos que as causas das ações humanas costumam ser inumeravelmente mais complexas e diversas do que depois sempre as explicamos, e raramente se delineiam de maneira definida.
É melhor ser infeliz, porém estar inteirado, do que feliz e viver... sendo feito de bobo.
No entanto já não compreendia nada do que lhe perguntavam e não reconhecia as pessoas que entravam e o rodeavam. Se o próprio Schneider chegasse agora da Suíça e olhasse para o seu ex-discípulo e paciente, ele, relembrando o estado em que o príncipe às vezes ficava no primeiro ano de tratamento na Suíça, agora desistiria e diria como naqueles tempos: ?Idiota!?.