thomas132 19/05/2022
RESENHA: Marina – Carlos Ruiz Zafón
Quando falamos sobre Zafón, automaticamente uma Espanha do século XX surge em nossos pensamentos. Em Marina, o autor carrega seu estilo marcante ao descrever os cenários, e torna-se quase impossível terminar de ler este livro sem sentir uma pontada de saudade de um lugar em que nunca vivemos. “A gente só se lembra do que nunca aconteceu…“
Relembrando o estilo do Naturalismo, na obra de Zafón o ambiente influencia o comportamento dos personagens, mesmo que indiretamente. “Guardo seus conselhos e suas palavras a sete chaves no cofre da memória, convencido de que algum dia eles vão me servir para responder a meus próprios medos e dúvidas.” Óscar deixa para trás a vida solitária do internato para ir de encontro a uma nova realidade, a um novo eu. ‘Marina’ traz sentido a vida e justifica a morte como uma história sem fim. Cabe a nós, que permanecemos aqui, continuar a escrever o livro que alguém um dia não pôde terminar.
“Pouco a pouco, quase sem perceber, o mundo de Germán e Marina passou a ser o meu. Sua casa, suas lembranças que pareciam flutuar no ar… passaram a ser as minhas.” Pág. 49
Caso você tenha sido inicialmente introduzido a Carlos Ruiz Zafón, assim como eu, por A Sombra do Vento, provavelmente irá notar muitas semelhanças entre ele e Marina. O clima e o desenvolvimento do mistério proposto em Marina vai lhe causar os mesmos sentimentos que em A Sombra do Vento. Zafón gosta de brincar com o passado, o presente e o futuro, conectando personagens tão distantes entre si por uma única corrente marcada pelo tempo.
“A verdade não pode ser encontrada, filho. É ela que nos encontra.” Este é, com certeza, o trecho que mais caracteriza os mistérios escritos por Zafón. Seja Óscar Drai, seja Daniel Sempere, nenhum deles foi à procura da história que viveram, a vida que os encontrou. Em Marina, tudo começou por conta de uma mulher de preto em um cemitério (ou, talvez, pelo relógio roubado), em A Sombra do Vento, graças a um livro presenteado na infância.
Aqui, o ambiente é outro. Não nos encontramos mais em um cenário de guerras, como vivenciamos junto a Daniel Sempere, mas arrisco dizer que a atmosfera em ‘Marina’ consegue ser tão sombria quanto. Temos fortes referências a Frankenstein, de Mary Shelley, por personagens como Maria Shelley (esse foi bem direto) e alguns seres assustadores que encontramos durante a história. A obra puxa, bem de leve, aquele clima de ficção científica e me fez lembrar até mesmo de Rastro de Sangue, da Kerri Maniscalco.
CONCLUSÕES GERAIS:
Zafón ainda é um autor novo para mim, mas eu já o considero um dos meus favoritos do coração. Por ter lido apenas duas obras dele, minha comparação de hoje se resume a elas unicamente, então eu posso estar sendo um pouco precipitada sobre os meus comentários seguintes. Desde já, peço desculpas se falei besteira hahaha qualquer coisa comenta aí embaixo se vocês pensam o mesmo que eu, ou se eu estou viajando na Lua.
Tanto em ‘Marina’ quanto em ‘A Sombra do Vento’, tudo se inicia nas piores condições. Um ambiente marcado por violência e dores, de repente se transforma em um mar de luz. Porém, o tempo de paz é curto, e logo a leve maré se torna um tsunami de problemas que nos guiam a um final trágico. Este atributo se faz presente quando descobrimos o passado que tenta ser apagado a qualquer custo e, mais uma vez, a influência do ambiente sobre o personagem se torna nítida, justificando até mesmo a existência de nosso antagonista. Honestamente, sinto que isso traz um senso de compaixão e humanidade muito forte para o vilão da história.
As referências a Frankenstein passam a fazer sentido. Em ‘Marina’, a morte é o foco e, ao descrever um cenário fúnebre, Zafón registra as consequências de um ambiente tão hostil que transforma as vítimas em monstros. Nos momentos finais, ele faz questão de deixar claro que mesmo os seres mais angelicais estão destinados a serem corrompidos.
“É isso que a natureza faz com seus filhos. Não há mal no coração dos homens, mas uma simples luta para sobreviver ao inevitável. [..] A seus olhos, a natureza era uma besta que devorava suas próprias criaturas, sem se importar com o destino e a sorte dos seres que abrigava.” Pág. 150
Se eu for comentar todas as minhas opiniões sobre este livro, não terminarei essa resenha nunca hahaha. Então, irei concluir por aqui. ‘Marina’ retrata os horrores e a beleza da vida e da morte, e a importância de histórias deixadas para trás. Lembranças perdidas em um passado distante mantém vivos pessoas e lugares que um dia foram esquecidos. Mesmo sendo um livro originalmente publicado como juvenil, ele carrega uma mensagem muito linda e extremamente forte mesmo para um público mais velho. Super recomendo que leiam! Em poucas páginas, Zafón fez eu querer viver uma vida que nunca existiu.
“Naquela noite, Mijail disse que a vida concede a cada um de nós apenas alguns momentos raros de pura felicidade. Às vezes são apenas dias ou semanas. Às vezes anos. Tudo depende da sorte de cada um. A lembrança desses momentos nos acompanha para sempre e se transforma em um país da memória ao qual tentamos regressar pelo resto de nossas vidas, sem conseguir. Para mim, tais instantes estão enterrados para sempre naquela primeira noite, passeando pela cidade…” Pág. 144
Nota: 5 estrelas
Data de Leitura: 16/05/2022
site: https://kinseinet.wordpress.com/2022/05/19/resenha-marina-carlos-ruiz-zafon/