Craotchky 30/11/2021"Aprendi a viver com o que não se entende."Sempre acho muito difícil discorrer sobre uma obra de Clarice. Seu estilo bastante particular e único não encontra referenciais os quais possamos assumir como modelos de comparação a fim de fazer uma análise mais apurada de determinada obra sua. Ainda que a cada leitura de um de seus romances eu deixe escapar conteúdos implícitos, aquilo que consigo apreender já é o suficiente para me afogar. Clarice sempre consegue me afetar. Afinal, ela está sempre de olho nas quinas e esquinas da alma humana, portanto da minha também, mesmo que eu sequer acredite em almas.
O texto de Uma aprendizagem ou O livro dos prazeres segue o estilo próprio clariceano, isto é, lírico, onírico, reflexivo, sensível e belo. Ao contrário de outros de seus romances que li, este possui um enredo menos difuso e mais apreensível. Porém se engana quem possa pensar que não há neblina por aqui. Clarice jamais é clara, pois ela é incognoscível em sua totalidade. É como se em seus livros ela trouxesse misteriosos e valiosos ensinamentos ocultos, segredos místicos e esotéricos, só compreensíveis para leitores(as) iniciados(as). Clarice parece se revelar apenas na equivalente proporção que o(a) leitor(a) a mereça.
No entanto, sempre tenho a impressão de que os romances de Clarice não são escritos e pensados por ela com vistas ao consumo dos(as) leitores(as). Seus livros parecem resultar da sua livre expressão pessoal, como se os escrevesse apenas para si mesma, para desabafar, desafogar o peito, dar vasão às suas dores e incompreensões acerca da vida. Como se seu ato de escrita fosse uma ferramenta usada para colocar pra fora as angústias que tivesse dentro de si; como se funcionasse como meio de confissão e ao mesmo tempo autorreflexão do conteúdo expresso. Um monólogo consigo na busca de compreender a si mesma, o outro e o universo ao seu redor.
Achei o desfecho muito bonito, aludindo ao fato de que a aprendizagem conduz a uma condição melhor para a prática de viver consigo próprio e com os outros. Foi só com esse final que Clarice garantiu seu lugar no top de 2021. (Ah, caso você goste de Clarice por suas reflexões profundas e sua linguagem poética, recomendo o maravilhoso Livro do Desassossego, de Pessoa.)
Clarice é sinônimo de assombro;
Clarice é muito mais poeta que todos eles;
Clarice é tão grande quanto ela própria;
Clarice é absolutamente única em sua arte de composição;
Clarice é um tesouro da nossa literatura brasileira e universal;
Clarice é das maiores representantes da força expressiva das palavras;
Clarice é a arte da beleza estética e poética na literatura;
Clarice vai até onde jamais outrem ousou chegar.
E não esqueçamos: Clarice é brasileira. Sim, Clarice é brasileira.