Hênio 25/08/2024
Uma curva no rio... e um desvio na empatia
"Uma Curva no Rio", de V. S. Naipaul, é um livro que me deixou com sentimentos mistos. Talvez eu esperasse mais de uma obra que aborda um tema tão complexo quanto a descolonização africana, mas o que encontrei foi uma narrativa que, apesar de potente em seu retrato da turbulência política e social, não conseguiu me prender como eu gostaria.
O livro se passa em um país africano sem nome, que claramente está em processo de descolonização, uma fase de transição difícil, marcada por conflitos internos, lutas de poder e um desejo de autonomia que, muitas vezes, se revela caótico. A história é narrada por Salim, um indiano que se estabelece em uma cidade à beira de um rio, na esperança de escapar do crescente sentimento de insegurança em sua terra natal e construir uma nova vida. O que ele encontra, no entanto, é um país à beira do colapso, onde as promessas de um futuro próspero se chocam constantemente com a realidade brutal de governos instáveis e violência.
Naipaul constrói um ambiente opressivo, onde a tensão está sempre presente, mas a maneira como ele aborda os personagens e a cultura local me deixou desconfortável. Existe uma certa frieza na narrativa, um distanciamento que, em vez de me envolver na trama, me afastou dela. As descrições dos personagens africanos, por exemplo, me pareceram estereotipadas e, em alguns momentos, até condescendentes. É como se Naipaul estivesse mais interessado em expor as falhas do processo de descolonização do que em explorar as complexidades humanas que envolvem essa transição.
Não posso negar que o livro tem momentos de grande lucidez, especialmente quando retrata as consequências da colonização e a difícil tarefa de reconstruir uma identidade nacional em meio ao caos. No entanto, a falta de empatia na narrativa e o tom quase fatalista em relação ao futuro do continente africano me deixaram com uma sensação de frustração. Senti falta de uma perspectiva mais equilibrada, que considerasse não apenas as dificuldades, mas também a resiliência e a esperança que muitos países africanos demonstraram durante esse período.
No final das contas, "Uma Curva no Rio" é um livro que provoca reflexão, mas que, para mim, não conseguiu oferecer uma visão profunda ou realmente humanizada do que foi a descolonização africana. A sensação que fica é a de que Naipaul observou os eventos de longe, sem se deixar envolver verdadeiramente pela vida que pulsava naquele cenário. Talvez seja isso que me incomodou tanto: a distância emocional que permeia a obra e a ausência de um olhar mais compassivo sobre um dos momentos mais transformadores da história contemporânea.