Arsenio Meira 12/02/2013
Este livro contem, dentre mais de 100 sonetos:
"Formoso Tejo meu
Formoso Tejo meu, quão diferente
Te vejo e vi, me vês agora e viste
Turvo te vejo eu, tu a mim triste
Claro te vi eu já, tu a mim contente.
A ti turvou-te o grosso da enchente
A que o teu largo campo não resiste
A mim mudou-me a vista em que consiste
Este meu ser contente ou descontente.
Já que fomos no mal participantes
Sejamo-lo no bem, oh quem me dera
Que fôssemos em tudo semelhantes
Mas logo vem a fresca primavera
Tu voltarás a ser o que eras dantes
Eu não sei se serei que dantes era."
Francisco Rodrigues Lobo
"Meu ser evaporei na lida insana
Meu ser evaporei na lida insana
Do tropel de paixões, que me arrastava;
Ah! cego eu cria, ah! mísero eu sonhava
Em mim quase imortal a essência humana.
De que inúmeros sóis a mente ufana
Existência falaz me não dourava!
Mas eis sucumbe a Natureza escrava
Ao mal, que a vida em sua orgia dana.
Prazeres, sócios meus, e meus tiranos!
Esta alma, que sedenta em si não coube,
No abismo vos sumiu dos desenganos.
Deus, oh Deus!... Quando a morte à luz me roube,
Ganhe um momento o que perderam anos,
Saiba morrer o que viver não soube."
Manuel Maria Barbosa Du Bocage
"Eu não lastimo o próximo perigo,
Uma escura prisão, estreita e forte;
Lastimo os caros filhos, a consorte,
A perda irreparável de um amigo.
A prisão não lastimo, outra vez digo,
nem o ver iminente o duro corte,
que é ventura também achar a morte
quando a vida só serve de castigo.
Ah, quão depressa então acabar vira
este enredo, este sonho, esta quimera,
que passa por verdade e é mentira!
Se filhos, se consorte não tivera
e do amigo as virtudes possuíra,
um momento de vida eu não quisera. "
Alvarenga Peixoto
"Duas Almas
Ó tu, que vens de longe, ó tu, que vens cansada,
entra, e, sob este teto encontrarás carinho:
Eu nunca fui amado, e vivo tão sozinho,
vives sozinha sempre, e nunca foste amada...
A neve anda a branquear, lividamente, a estrada,
e a minha alcova tem a tepidez de um ninho.
Entra, ao menos até que as curvas do caminho
se banhem no esplendor nascente da alvorada.
E amanhã, quando a luz do sol dourar, radiosa,
essa estrada sem fim, deserta, imensa e nua,
podes partir de novo, ó nômade formosa!
Já não serei tão só, nem irás tão sozinha:
Há de ficar comigo uma saudade tua...
Hás de levar contigo uma saudade minha..."
Alceu Wamosy
"Eu ...
Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho,e desta sorte
Sou a crucificada ... a dolorida ...
Sombra de névoa tênue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!...
Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste sem o ser...
Sou a que chora sem saber porquê...
Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
Alguém que veio ao mundo pra me ver,
E que nunca na vida me encontrou!"
Florbela Espanca
"Unidade
Deitando os olhos sobre a perspectiva
Das coisas, surpreendo em cada qual
Uma simples imagem fugitiva
Da infinita harmonia universal
Uma revelação vaga e parcial
De tudo existe em cada coisa viva:
Na corrente do Bem ou na do Mal
Tudo tem uma vida evocativa.
Nada é inútil; dos homens aos insetos
Vão-se estendendo todos os aspectos
Que a idéia da existência pode ter;
E o que deslumbra o olhar é perceber
Em todos esses seres incompletos
A completa noção de um mesmo ser..."
Raul de Leôni
E MUITO MAIS. CINCO ESTRELAS É POUCO.