Gabriel.Freire 16/02/2024
DO AMOR E DAS DOENÇAS
DO AMOR E DAS DOENÇAS
Aquele em que o homem amou demais.
Se o amor fosse um objeto seria, com toda certeza, perecível. Ao se achar tempo demais fora da geladeira, o amor estragaria; se encheria de mofo como o pão que não é renovado a cada dia, mas a cada semana.
O amor é como pão, diário.
Ao mesmo tempo, a maior prova de amor que existe no mundo é esperar por alguém. Aguardar pacientemente. Expectar e conjecturar de forma pacífica, durante anos a fio, em que momento o amor será correspondido. Enquanto isso a vida se desenrola, seu amado casa-se com outra, constrói uma família, tem filhos e envelhece.
A maior prova de amor é deixar o amor apodrecer dentro do nosso organismo, pois o amor não correspondido tem prazo de validade. Quando o vencimento chega, o sentimento se converte em loucura ou até obsessão, e causa os mesmos sintomas que quaisquer outros alimentos estragados causariam. Aguentá-los, sem reclamar, é uma atitude digna de último romântico. Um amor doentio, obsessivo, mas paciente.
Foi isso que aconteceu com Florentino Ariza, o homem que esperou por mais de 50 anos.
Florentino amava Fermina, que parecia amá-lo da mesma forma. Apenas parecia amá-lo da mesma forma. Acontece que, infelizmente, “parecer amar” não é suficiente quando se trata do amor. “Parecer amar”, creio eu, é uma espécie de “quase-sentimento”, mal formulado, cheio de lacunas, volátil, como éter; uma hora está aí, na outra não está mais. O quase-amor de Fermina por Florentino acabou, da noite para o dia, sem o mínimo de explicação, e isso é um dos pontos centrais da estória.
Ao longo da narrativa acompanhamos a vida desse romântico-obsessivo e de Fermina, que se casa com outro homem. Por mais de 50 anos assistimos o desenrolar de suas vidas e seus relacionamentos amorosos; percebemos a resiliência neurótica de Florentino Ariza, o qual aguarda, pacientemente, o retorno triunfal e repentino do amor da moça; como se tal amor fosse ressurgir a qualquer momento, de chofre, da mesma forma que acabou.
É um livro de escrita singular: fluida, mas densa, pois o narrador narra, de fato, sem parar, por páginas e páginas a fio, contando a estória como que de um fôlego só, sem dar espaço ao menos para os personagens dialogarem, de maneira que é possível contabilizar quantos travessões aparecem do início ao fim.
Isso não me incomodou; pelo contrário, é muito belo e bem-feito. Faz parte do estilo narrativo de Gabriel Garcia Márquez essa espécie de escrita corrida, sem pausas. Por outro lado, pode ser cansativo para os leitores de primeira viagem, pois se trata de um livro cujos capítulos possuem 60 páginas cada.
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