Valéria Ribeiro 18/10/2024
Nesse gênero, o melhor livro que já li
"A Lei do Cão" é um romance policial do autor americano Don Winslow, lançado em 2007. O livro se destaca por seu estilo ágil (muito ágil), misturando violência, humor ácido e uma crítica à guerra contra as drogas. Winslow cria uma narrativa brutal, envolvente e cheia de reviravoltas, marcada por personagens profundos e diálogos rápidos.
A história acompanha a luta do agente da DEA (Drug Enforcement Administration), Arthur Kelller, contra os carteis de narcotraficantes. Nessa batalha, ele se envolve com o padre Juan Parada, com o irlandês Sean Callan, com a prostituta Nora, com a máfia e com os chefões do narcotráfico. Ao longo da narração, todos eles se encruzam e interferem nos destinos uns dos outros.
Percorrendo México, Colômbia, Guatemala, Hon Kong, Estados Unidos, a narrativa descortina o caminho percorrido pelas drogas, desde sua produção até chegar ao mercado consumidor, bem como os interesses da política, da igreja, dos carteis, todos ocultos e, muitas vezes conflitantes, no combate às drogas. Acompanhamos, também, as sangrentas disputas internas entre as facções rivais pelo controle do comércio bilionário de cocaína e as ocultas e conflitantes disputas entre as agências americanas nesse combate.
Durante a leitura, o leitor tem contato com uma realidade estarrecedora: o envolvimento de um Estado em diversos assuntos internos de outros Estados soberanos, sempre com a justificativa do “interesse maior”. Entende como o dinheiro ilícito e sangrento financiou governos, influenciou eleições, corrompeu as forças de repressão, a igreja, os governos. Nessa realidade a perda de vidas humanas é apenas uma consequência (homens, mulheres e crianças).
Além disso, ao misturar personagens reais e fictícias, Winslow faz uso de eventos históricos no desenvolvimento da trama: o terremoto que assolou a Cidade do México em 1985, a aprovação do Acordo de Livre Comércio da América do Norte (Nafta), o assassinato do cardeal Juan Posadas OCampo, o financiamento das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) com dinheiro estatal e das drogas, o financiamento estatal dos Contras na Nicarágua para que combatessem a Frente Sandinista de Libertação Nacional, entre outros.
O livro não é apenas um thriller; é também uma crítica mordaz à política de drogas e às fronteiras entre legalidade e criminalidade. Winslow sugere que, no mundo do tráfico, não há mocinhos ou vilões, apenas sobreviventes. Ele questiona as fronteiras morais e a hipocrisia da sociedade, explorando temas como a amizade incondicional, o amor livre e as consequências da guerra contra as drogas.
Com personagens muito bem construídos, cenas cinematográficas de ritmo alucinante, a narrativa envolve o leitor e faz percorrer mais de seiscentas páginas sem perceber. Em seu nicho, esse foi o melhor livro que já li.