Lala 20/01/2024
Nada mais nada menos que o fundador da pirataria ficcional
Robert Louis Stevenson é uma lenda. O cara não se contenta em ser o escritor de um dos livros mais importantes da literatura fantástica (O Médico e o Monstro), mas também simplesmente fundou todo o imaginário sobre piratas e aventuras náuticas que nós temos hoje em dia.
Se eu disser pra qualquer criança imaginar um pirata, 99% vai imaginar um cara de perna de pau com um papagaio no ombro: ou seja, o Long John Silver, mesmo que a pessoa nunca na vida tenha ouvido falar nesse nome. Chega a ser assustadora a influência de Ilha do Tesouro no imaginário popular, é algo que existe na nossa mente desde sempre, mesmo antes que sabermos quem é Stevenson. Toda obra sobre pirataria depois de Ilha do Tesouro deriva de Ilha do Tesouro, é praticamente impossível fugir pq ela construiu a mitologia do pirata como nós conhecemos hoje.
Acho, inclusive, curioso, que no início do livro, o autor tem uma nota na qual ele diz que as crianças (do século 19) poderiam ver essas histórias de marujos como algo do passado, isso é bem irônico se a gente for pensar que em pleno século 21 Piratas do Caribe foi um fenômeno e One Piece segue há vinte anos lançando seus infinitos episódios, e os dois bebem da mesma fonte que todos sabemos qual é.
Agora vamos ao livro em si: ele é uma delícia de ler. A leitura é rápida, os capítulos são curtos e o estilo de folhetim te faz não querer largar, porque os ganchos são muito bem articulados. O grande foco aqui são as intrigas humanas entre os membros de uma tripulação e a trama corre cheia de motins, traições, lutas, tesouros escondidos e viagens perigosas no mar.
A ambientação é imersiva, a ilha e os barcos são vivos nas páginas e Stevenson consegue provocar os mais variados sentimentos no leitor. Você fica curioso, depois tenso, depois empolgado, depois chocado: tudo junto. Os personagens são muito bons, especialmente o próprio Jim, que é um protagonista impulsivo, corajoso e decidido que sabe tocar muito bem a trama e funciona como um ótimo narrador, pelo qual a gente torce e teme pela vida. E o lendário John Silver, "o pirata mais pirata de todos". O Silver é fascinante, ele é gentil ao mesmo tempo que é perverso, mostra compaixão ao mesmo tempo que é traiçoeiro, é um cavalheiro ao mesmo tempo que é um criminoso. Como não gostar dele? Além disso, a relação dele com o Jim é interessantíssima, apesar de que eu ache que o autor pudesse ter investido mais nesse tópico. O Silver é imprevisível, você nunca sabe o que ele vai fazer, de que lado ele está e o que ele está pensando, funcionando ao mesmo tempo como um ótimo antagonista e, depois, como aliado.
Um destaque para as cenas de ação que são absurdas e estão entre as melhores que eu já li. As lutas são super tensas, você se importa com os personagens e tudo tem uma sensação de perigo iminente e urgência. Minha cena favorita é a luta no navio entre Jim e Israel Hands, caramba, aquilo é épico!Tudo é dinâmico, ágil e bem descrito, as frases se encaixam uma na outra com perfeição e te fazem se sentir dentro da cena, morrendo de medo do pior acontecer. Em alguns momentos eu realmente não sabia que rumos a história ia tomar, porque a sensação de desastre vai se tornando tão grande que você não tem certeza da sobrevivência dos personagens e isso faz toda a diferença.
Enfim, foi muito divertido ler a Ilha do Tesouro e conhecer as origens desse gênero que eu gosto tanto. Vou guardar pra sempre as sensações de desespero que esse livro me fez passar e a música Yo-ho-ho and a Bottle of Rum, que não sai da minha cabeça de jeito nenhum.