Luiz 08/06/2023
Tempestade das Paixões & Calmaria da Sabedoria
Livro: A Tempestade
Autor: William Shakespeare
Shakespeare é, provavelmente, o maior dramaturgo do mundo, contos como Hamlet e Otelo, até hoje estão entre os meus livros preferidos, e minha intenção é continuar a ler suas obras que possuem tanto a ensinar, e neste livro Shakespeare nos deixa um ensinamento primoroso sobre a temática do Perdão, principalmente.
A tempestade, é considerado o último trabalho de Shakespeare, e nesta história acompanhamos uma viagem de navio que aporta numa ilha misteriosa após uma grande tempestade, na tripulação temos:
- Alonso, Rei de Nápoles
- Sebastião, irmão do rei
- Ferdinando, filho do rei
- Antonio, atual duque de Milão
- Gonzalo, conselheiro do Rei
- e alguns outros personagens como Trincolo e Estefano, Adriano e Francisco.
O enredo se desenvolve a partir do momento em que compreendemos numa conversa de Próspero (personagem principal) com sua filha Miranda, expondo que os visitantes eram todos ligados à seu passado, agora a Fortuna lhe sorri pois assim tem a chance de dar novo rumo às injustiças que sofrera no passado.
É revelado por Próspero que antes era o Duque de Milão, mas devido a sua vocação aos estudos, preferiu deixar as responsabilidade de Milão à Antonio, seu irmão, mas nesse processo, Antonio usurpou o ducado mandando matar Próspero e sua filha, enquanto negociava novos termos econômicos com Nápoles para obter chancela do Rei Alonso. Graças à Gonzalo, e a boa reputação como Duque, Próspero e Miranda que ainda era bebê, foram poupados e fugiram numa embarcação, chegando a ilha atual. Próspero desenvolvendo seus conhecimentos nas artes liberais e místicas, ganha como aliado Ariel, um ser angelical que fora aprisionado por Sycorax, uma bruxa maligna, a antiga senhora desse lugar mágico e misterioso que é a ilha, deixando para trás seu filho, e agora servo de Próspero, Calibã.
Dispondo de seus poderes nas artes místicas, e com o auxílio de Ariel, Próspero conduz de forma maestral toda a situação ocorrida na ilha, e a história se desenvolve em diversos núcleos:
1) Ferdinando e Miranda, que ao se conhecerem começam a desenvolver afetos um pelo outro.
2) Calibã, Trincolo e Estefano; após Calibã se revoltar com Próspero, convence ambos, Trincolo e Estafano, a derrubar Próspero, governar a ilha e tomar Miranda como esposa.
3) Alonso, Sebastião, Antonio, Gonzalo, Adriano e Francisco; ambos seguem perdidos na ilha acreditando que Ferdinando morrera e divagando sobre diversos assuntos.
4) Próspero e Ariel; Ariel contingência a situação utilizando seus poderes e observando os núcleos anteriores, repassando à Próspero, enquanto ele determina o que será feito em seguida ao mesmo tempo que vigia a situação de Miranda e Ferdinando de perto.
A Tempestade provavelmente é um dos livros menos conhecidos de Shakespeare, mas marcante pela forma como tudo se encerra, ainda que não esteja entre os favoritos de muitos, definitivamente é um dos livros que mais se ensina sobre Perdão, Virtude, Honra e Humildade, enquanto suas peças em geral Shakespeare nos apresenta personagens vilanescos, ambiciosos e etc, bem como heróis que ainda que dotados de grande virtude, são tomados por suas paixões que desembocam em tragédias e violência, A Tempestade, caminha para esse rumo, mas nos apresenta alguém que uma vez tenha adquirido sabedoria, dominado as artes místicas, agora domina a si mesmo, conseguindo um feito singular, perdoar aos outros e a si mesmo, abandona a vingança, a raiva, e se prosta como alguém humilde, que uma vez tendo desmascarado a mentira, busca a boa justiça.
Simbolicamente A Tempestade foi o evento necessário para colocar todos nos seus devidos lugares, trazer a verdade, a virtude e principalmente a justiça. Muitas vezes passamos por eventos complicados, que nos tiram do eixo, fazendo nossa vida rumar para situações adversas e penosas, mas sendo sabiamente empregado os conhecimentos adquiridos nessas tempestades, saímos como novas pessoas renascidas e fortalecidas.
O autor nos faz pensar, o que nós nesta situação faríamos, seríamos capazes de com tanto poder, se prostrar e sermos um instrumento da boa justiça ou nos cegaríamos e buscaríamos a justiça a nosso própria medida? Questões como está são colocadas e discutidas ao terminar a leitura, além das discussões sobre natureza humana virtuosa e bestial, tendo para isso fundamental importância a presença dos personagens Ariel e Calibã, até que ponto o ser humano transita nesse limiar entre o supremo bem e o supremo mal e ao mesmo tempo tendo enorme potencialidade para ambos os pólos.
Shakespeare promove uma verdadeira imersão no imaginário, na fantasia e na ficção para nos apresentar temas tão importantes sobre a natureza humana. De fato é um livro fundamental, ainda que deveras curto e rápido, recomendo a leitura. O livro da Penguin Companhia ainda conta com dois textos, um de José Francisco Botelho e outro de Frank Kermode, recomendo não dispensar a leitura, mas deixá-las pro final do livro, enriquecerá enormemente a leitura e trará muito mais imersão no livro.
"[...] Ao encontrarmos Próspero na ilha
, regendo tormentas como um maestro dos elementos, temos a impressão de que nada escapa a seu domínio; porém logo percebemos que lhe falta, ainda, assenhorar-se de si mesmo. [...] Em seu domínio na ilha, Próspero parece ter se aproximado como mago, mas não como indivíduo. Ele não é um governante sábio, como não foi acolá. [...]"
(José Francisco Botelho, p.19 [apresentação])
"[...]
Eu, que sou semelhante a essa gente, eu, que sinto
As coisas com a mesma intensidade, e sofro
Como eles sofrem - ora, não serei eu mesmo
Ainda mais generoso aos do meu próprio gênero?
Embora em minha carne eu sofra os seus agravos,
Escolho me aliar à razão superior
Na luta contra a minha fúria: a ação mais nobre
Não está na vingança, mas sim na virtude [...]."
(Próspero / William Shakespeare, p.192)