spoiler visualizarFeliky 13/04/2024
Queria ter gostado...mas meu deus que trabalho árduo é terminar de ler esse livro!
Essa resenha é da edição da Martin Claret, que tem uma capa dura e algumas ilustrações internas coloridas (ambas bonitas) e um pequeno texto introdutório (que não faz diferença alguma no livro, pois no geral fala obviedades. Infelizmente não há texto extra informativo que geralmente livro clássico tem, mas compreendo que é porque o livro já é um calhamaço e não caberia espaço).
Antes de mais nada, falemos de expectativas. Peguei esse livro esperando que fosse um clássico que eu gostasse. Nunca assisti nenhuma das adaptações, então não tinha nenhuma ideia do enredo antes de ler, mas sempre ouvi falar bem e, em especial, sobre como era uma leitura voltada para mulheres. Uma leitura voltada para mulheres não é novidade hoje em dia, mas dada a época desse livro fiquei empolgada. Infelizmente, é MUITO chato. Na verdade, é TÃO chato que agora penso que devo ir atrás de outros livros da época, em especial de outras autoras, para ver o quanto disso é particular da Alcott e o quanto é coisa do período. Devo também deixar claro que NÃO sei da vida da autora, pois, como já dito, essa edição não tem os textos complementares que geralmente clássicos têm.
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A ESTRUTURA DOS CAPÍTULOS
Primeiramente, vi muita gente falando que a leitura é entendiante porque acontece muita pouca coisa em um período tão grande de tempo. De fato, não acontece lá muita coisa e isso deixa a leitura meio maçante, MAS eu acho que o ponto do livro é esse mesmo. O motivo de Mulherzinhas ser lembrado quando o assunto é mulheres na leitura é justamente porque se propõe a mostrar um dia a dia comum das mulheres da época, que provavelmente era essa coisa meio insípida mesmo. Mas então entra uma outra questão: algo que colabora para ser TÃO maçante para algumas pessoas (eu inclusa) é a necessidade constante de lições de moral em todo fim de capítulo, dando uma vibe desenho dos Smilinguido. Talvez se eu tivesse pego pra ler com 10 anos, esses ensinamentos repetitivos todos não seriam TÃO incômodos, mas hoje em dia é irritante. Tudo bem ter suas lições, mas precisa ser EM TUDO? Se a personagem quer um vestido, tem uma moral sobre isso...se a personagem quer experimentar tal sobremesa, tem uma moral sobre isso...se a personagem quer brincar x jogo, tem uma moral sobre isso...se a personagem respira, tem uma moral sobre isso...pelo amor, sabe! "Ah, mas é o crescimento delas"...sim, é o crescimento! Mas eu não me lembro de crescer com todos os dias da minha vida sendo uma lição de moral, e eu sinceramente duvido que a vida de outros tenham sido assim. E o que mais me irrita é que a autora nem se dá ao trabalho de variar nas lições de moral, geralmente são as mesmas com roupagens diferentes. Fica toda hora ressaltando que não deve reclamar de trabalhar porque o trabalho é edificante, que não se deve ficar amargo com a pobreza porque é possível achar alegria genuína mesmo sendo pobre, que não se deve desejar demais e aprender a ficar satisfeita com o que se tem enquanto se esforça para ter mais, que não sei o que os dons femininos (que chegou a gerar o momento bizarro de descrever uma criança de 9 anos como maternal), etc etc, repetindo e repetindo em situações diferentes como se na primeira vez ninguém tivesse entendido algo tão simples no primeiro capítulo em que essa moral foi abordada.
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PERSONAGENS
Em segundo lugar, temos as personagens. Por um lado, fico feliz em ver que elas têm qualidades e defeitos e a autora não me pareceu querer puxar demais nem pra um nem pra outro, mas equilibrar. Outros livros antigos que eu tinha lido era muito óbvio que personagem X é pra ser boa e personagem Y é pra ser ruim quando se tratava de personagens femininas, o que não acontece aqui. Elas também têm personalidades bastante diferentes, o que é outro bônus porque mesmo em obras modernas vejo acontecendo das personagens femininas do elenco serem todas meio parecidas entre si (veja bem...mesmo em obras escritas por mulheres, um exemplo é a escrita da SJM). Ouvi falar que isso tem inspiração na vida da escritora com suas irmãs, o que se for verdade faz sentido de por que realmente parece palpável. Aqui, meu problema não é a proposta das personagens...é o encaminhamento!
Vou começar com Beth porque ela se vai mais cedo, já que morre jovem. Eu não gosto do tropo da personagem alegre e adorável que morre jovem por causa de uma doença trágica e isso, de certa forma, passa uma mensagem/lição para o leitor. Ainda é algo usado hoje em dia, em várias formas de mídias, e eu nunca gostei e aqui não foi diferente. Beth era fofa, mas é isso. De todas, ela era a que menos me parecia uma pessoa real. A timidez deu uma humanizada nela, mas é isso. Como alguém que tem várias primas crianças, nunca conheci criança que nem ela (não duvido completamente que existam...mas deve ser o raro do raro do raro). Beth simplesmente não me importou porque eu não conseguia ver ela como uma pessoa de quem eu sentiria falta e sim muito obviamente uma personagem que seria apenas uma ferramenta de roteiro, o que me desconectou da história dela. Tipo, o único defeito real que essa menina teve ao longo de inúmeras páginas foi ter sido negligente e deixado o pássaro morrer. E de novo, pessoalmente tenho ranço do "ain, que fulana era uma pessoa tão boa, e veja como ela morreu e não havia nada que pudesse ser feito sobre isso...mesmo uma pessoa tão jovem e boa pode ppipopopo e devemos pipipopo", acho um artíficio preguiçoso. E, claro, como ela morre cedo não realiza seus sonhos.
Então temos Meg. De todas, ela é a mais adequada ao período, eu acho. Tipo, ela é mais dentro do padrão de garota na época. Um de seus defeitos é a vaidade e o modo como ela sempre estava querendo ser mais rica, o que eu entendo por que é um defeito, mas ao mesmo tempo entendo perfeitamente por que uma garota pobre se sentiria assim...ainda mais em volta de outras garotas bens de vida que por vezes parecem não ter noção das disparidades sociais. Ela pelo menos tem bastante personalidade. Ela não é minha preferida, mas não achei tão irritante como vi alguns dizendo. Também não me identifiquei com ela, pois suas ambições são bastantes datadas atualmente. Considero positivo que a autora tenha usado ela para mostrar brigas usuais do casamento e como essa visão glamourizada da esposa de comercial de Margarina não é uma realidade possível, e Meg teve que aprender isso por experiência própria. Pode-se dizer que o sonho dela (casar com um homem rico) não foi realizado, mas a alternativa foi legal pra ela também.
Quanto a Amy, ela passou a maior parte da infância jogada no limbo. Jo e Meg tinham o maior destaque, e Beth teve o arco do Sr Laurence e da doença. Da Amy, as coisas mais memoráveis de sua juventudade são...bem, levar fruta pra escola e ser punida por isso e queimar o livro da Jo em um ataque de birra. Mais velha ela ganha mais destaque, e vira um misto entre querer revirar os olhos com ela e achá-la bastante humana. Ela tem muita personalidade, mas ao mesmo tempo vive de moldar a personalidade com base nos outros.
A Jo é inicialmente a mais fácil de se identificar porque, embora tenha alguns pensamentos datados, ela é a mais distance do padrão da época. Gostei que ela fosse claramente uma personagem com defeitos, pois muitas vezes personagens como elas são transformadas em incontestáveis. Embora ela não tivesse o mesmo pensamentos das irmãs e em certos momentos não as entedesse, eu não acho que ela desprezou elas, então também não é aquele caso de personagem que fica ressaltando que é diferente das outras com um ar de arrogância. Mas isso só enquanto ela é adolescente, pois na fase adulta é um saco. Parte do motivo é que, embora ela já fosse baseada na autora antes, fica ainda mais óbvio ao ponto de as cenas em que ela reclama sobre não quererem as histórias com moral a cada fim de página ser um gritante self-insert. Alcott, minha filha, posso fazer nada se esse tipo de estrutura é chata! Infelizmente, quanto mais velha ela fica, mais a personalidade dela corre para as colinas. Uma personagem que começou cheia de personalidade termina meio água de chuchu, e isso é tratado como uma espécie de melhora. Pra fechar com chave de cocô, ela passa o livro inteiro sonhando em ser escritora e realmente se esforçando para isso para no fim deixar de lado (embora ela tenha dito que não desistiu).
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ROMANCES
Em terceiro lugar, vamos aos romances.
John e Meg fizeram sentido, mas devo dizer que não shippei. Achei eles sem química, e também me irritou que ao mesmo tempo que a Sra March diz para Meg que ela é muito jovem, ela fica repetindo que "vai aprender a amar" o Brooke, e a própria Meg passa a repetir isso também. Eu entendo que Brooke era um cara legal, mas isso não faz com que ele obrigatoriamente tenha de receber o amor dela de volta, então eu não em importo se ele é trabalhador e gosta dela, Meg NÃO tinha que aprender a amar ele de volta. Enfim, ainda assim já deu pra ver que isso ia desenvolver desde quando os americanos e os ingleses foram passear juntos (onde teve uma espécie de competição de mijo em qual nacionalidade é melhor) e o Brooke meio que defendeu a Meg da Kate, então tava sendo plantado fazia um tempo. Ele catar a luva da coitada é esquisito atualmente, mas na época era o ápice do romance, então só deixou mais evidente ainda que iria acontecer. A Meg ficou num chove não molhe, agindo como se não quisesse e ao mesmo tempo querendo e então tomando decisões puramente para contrariar os outros (inclusive só aceitou o pedido para contraria Tia March), o que só me ressaltou a infantilidade dela e me fortaleceu o pensamento que ela era mesmo muito jovem. Mas pelo menos o casamento dela é bom, o que já é alguma coisa positiva. Além disso, gostei de como foi mostrada a realidade do casamento e as quebras de expectativa por meio dos dois.
O começo de Amy e Laurie me fez torcer o nariz. Laurie mal foi rejeitado, foi-se viajar, encontrou Amy e aí logo no capítulo em que eles se reencontram, um cap logo a seguir do que Jo o rejeitou, começa a desenvolver o romance deles. Tipo que? Me pareceu que Alcott estava desesperada para colocar o Laurie com uma das meninas a qualquer custo. Primeiro ele se interessa pelo Jo, depois o povo fica falando dele e da Meg, daí Amy se interessa por ele e por fim Beth diz que queria ele como irmão (o que seria possível com um casamento com uma das irmãs dela). Fiquei meio "gente, pelo amor!!! Se não tava dando, colocasse ele solteiro ou com uma outra random que conheceu na faculdade ou algo assim, tanto faz!", mas felizmente eles se desenvolveram decentemente. Não shippo porque não tenho apego a nada neste livro, mas é de longe o melhor casal mesmo, embora, por mais chata que Amy fosse às vezes, eu tenha ficado refletindo se ela não merecia coisa melhor porque Laurie é o típico marido-filho.
Jo e Laurie sempre me pareceram mais amigos, mas eu meio que já tava esperando que ia ter alguma coisa porque basta olhar a data do livro pra saber que sempre tem. E de fato teve, o Laurie tinha interesse romântico nela, mas não foi recíproco. Embora não estivesse shippando eles, eu até que via neles um potencial para ser um ótimo casal se fosse mesmo ter que ter um. Mas aí o Laurie ficou insistindo tal qual um insuportável e meu humor azedou com ele. Fez uma completa birra, até bater o peu bateu tal qual uma criança! E após essa coisa da Jo realmente rejeitar o pedido dele, a amizade tão forte dos dois perdeu o brilhou, o que é realista, mas não deixa de ser meio triste. Me deu a impressão que ele era amigo só porque pensou que tinha chances com ela e, como viu que não tinha, foi-se. Isso somada com a atitude insuportável dele em ver que não é correspondido me faz me perguntar como diabos teve gente falando que é uma pena não terem terminados juntos. Livramento pra Jo! Ela ia ser a mãe e não a esposa desse homem, tenho certeza disso.
Pensei então que Jo ficaria solteira, mas então apareceu Baehr. E meu deus, que casal RUIM. Ele é insuportável de entendiante, quase dormi nas cenas dele. Além disso, a dinâmica professorXaluno não é minha praia porque acho chato, então só fez eu azedar ainda mais pra esses dois. Tentei dar chance, mas meu deus que casal SEM GRAÇA, nada neles faísca!!! Enfim, de longe o pior casal do livro simplesmente porque é um tédio.
Já li que Jo era para terminar solteira, mas acabou casada por pressão editorial e do público e por isso parece em cima da hora. Também já li que a mudança de Laurie para Baehr foi uma resposta para a insistência dos leitores em querer ver Laurie e Jo juntos. Sinceramente, não faço a menor ideia se alguma dessas versões é real ou se há outra versão ou se no fim tudo ocorreu como era para ter acontecido. Se foi planejado desde o começo, então é uma escolha duvidosa mesmo. Se foi por puro ranço da galera que queria Laurie e Jo, então é infantil. Se foi questão de pressão editorial, aí é entendível.
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OBRAS MENCIONADAS
- Undine e Sitram, ambos livros de Friedrich de la Motte Fouque (Jo menciona querer lê-los)
- Macbeth, de William Shakespeare (Jo menciona enquanto ensaiam após ser comparada com Shakespeare)
- O Peregrino, de John Bunyan (primeiro livro que as meninas leem, dado pela mãe como presente de Natal)
- O Herdeiro de Redclyffe, de Charlotte M. Yonge (Jo aparece chorando enquanto lê)
- Ensaios do Belsham. Não fala o nome completo, mas pelo que pesquisei deve ser William Belshman (dito na parte que conta a rotina de Jo com a Tia March).
- O Vigário de Wakefield, de Oliver Goldsmith (Jo lê para Tia March).
- A Cabana do Pai Tomás, de Harriet Beecher (Jo menciona)
- Ivanhoe, de Walter Scott (Meg aparece lendo)
- Charles Dickens tem suas obras mencionadas e, em um capítulo, as meninas brincam seguindo ideias de As Aventuras do Sr. Pickwik.
- Hamlet, de William Shakespeare (Jo menciona a Laurie após ouvir que ele faz esgrima)
- Evelina, de Fanny Burney (Jo pensa na obra após ler seus contos no jornal)
- Patronage, de Maria Edgeworth (menção a um personagem)
- Life of Samuel Johnson, de Boswell (Jo dizer querer ler)
- The Prince of Abissinia: A Tale, de Johnson (menção quando vão falar com o Sr. Laurence)
- Andarilho, de Samuel Johnson (mesmo caso do de cima)
- The Toodles, de William Burton (usado para comparar um dos personagens com Laurie)
- David Copperfield, de Charles Dickens (menção de Laurie)
- Nicholas Nickleby, de Charles Dickens (personagem Mantalini mencionado)
- O Mercador de Veneza, de William Shakespeare (personagem Shylock mencionado)
- Maud, de Alfred Tennyson (usado de comparativo)
- The Doom of Devergoil, de Walter Scott (Laurie canta uma música)
- Soldadinho de Chumbo, de Hans Anderson (carta da Jo)
- Autores: Platão, Homero e Milton (carta da Jo)
- Sartor Resartus, de Thomas Carlyle (enquanto Jo pensa em roupas)
- Morte de Wallenstein, de Schiller (Bhaer lê)
- Os Anos de Aprendizado de Wilhelm Meister, de Goethe (personagem mencionado)
- Oliver Twist, de Charles Dickens (personagem mencionado)