gleicepcouto 23/11/2012 O real significado da palavra “dignidade” em contraste com a sua ausência na vida de milhõeshttp://murmuriospessoais.com/?p=4979
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“Agora mesmo, em todo mundo, 4 mil pessoas por dia estão morrendo de Tuberculose: a maioria delas na África Subsaariana. Ela causa mais mortes prematuras que qualquer outra doença, e essas mortes triplicaram entre 1997 e 2005. Quatro mil pessoas a cada dia. Todos os dias.”
O médico, cientista e escritor Dráuzio Varella é o responsável pelo prefácio de Dignidade! (LeYa) – livro que reúne textos de escritores diversos, que acompanharam de perto a organização Médico Sem Fronteiras (MSF).
Não conhece? Vamos lá, um breve histórico.
Fundada por médico e jornalistas, em 1971, na França, o MSF tem como missão levar assistência médica à população de baixa renda, assim como denunciar casos de ajuda humanitária falha e descaso da opinião pública frente à dura realidade dos menos favorecidos. A organização foi contemplada com o Nobel da Paz em 1999 e atua ao redor do mundo, sem discriminação de etnia, religião ou ideologia política.
No time dos escritores do livro temos gente de peso como o peruano Mario Vargas Llosa, a brasileira Eliane Brum, o italiano Paolo Giordono, a indiana Tishani Doshi, dentre outros. Pode-se perceber na escolha dos participantes a miscigenação cultural, e isso traz algo interessante para a compilação: diferentes pontos de vista, unificados apenas pela sensação de impotência que todos deixaram transparecer.
Traduzir o horror, a miséria, a doença em palavras é muito difícil. Alguns autores preferiram narrar o que presenciaram, como uma reportagem; outros, já preferiram passar sua mensagem em forma de contos, mas baseados em fatos reais.
Como resultado, temos um amplo quadro da situação caótica em muitos países. A gente sempre pensa “Ok, é. Em alguns lugares, a situação está bem crítica.”; mas poucas vezes paramos para analisar isso atentamente, ou por comodismo, ou por falta de interesse, mas basicamente porque... É perturbador. Encarar a dor alheia e nela, o reflexo de que pouco fazemos para minimizar isso, é uma tarefa árdua.
No Congo, o problema é o estupro, não só de adultas, mas também de idosas e crianças. Na Bolívia, a Doença de Chagas dizima famílias a cada geração. Em Bangladesh, dois terços dos casos de mortalidade infantil são causados pela desnutrição. A África do Sul definha com Tuberculose e HIV, onde 17% da população é portadora do vírus. Na Grécia, imigrantes irregulares são tratados como animais, enjaulados.
Esses fatos são chocantes e desconcertantes, ao ponto de quem ler, pensar “Onde estava esses anos todos que não sabia desses ‘detalhes’?”. A reflexão que vem desta pergunta, porém, é frutífera, pois não deixa o leitor limitado a se afundar na culpa de sua própria inércia e ignorância. A reflexão aqui leva-o ao patamar pro-ativo de: "Tenho que ajudar. O que posso fazer a respeito?"
E esse é o grande trunfo de Dignidade!. Além, claro, de fazer conhecer os pormenores da organização MSF, traz à tona uma consciência do que é ser humano e de como muitos nunca vivenciaram o significado pleno da palavra dignidade. O recado é: é preciso abrir os olhos para a situação limite na qual milhões de pessoas estão sujeitas no mundo.
O livro transcende a técnica literária, mas em se tratando dela, não tem nada a perder. Os textos são bem escritos e coesos, mesclando dados e informações, com emoção e humanidade. Dignidade!, por fim, é um must read. É uma sacudida para todos aqueles que muitas vezes pensam que o mundo gira ao redor do próprio umbigo. Como eu, por exemplo.