Henrique Fendrich 20/01/2019
Uma literatura fortíssima
Esses orientais me surpreendem cada vez mais. Li “Contos Coreanos”, coletânea de 1985 com escritores mais modernos das duas Coreias (imagine só, ler escritores da Coreia do Norte!). São dez 10 contos, 6 do sul e 4 do norte.
Encontrei uma literatura fortíssima, intensa, essencialmente dramática. Situações mal resolvidas entre familiares perfazem boa parte dos contos. Questões econômicas, pobreza e miséria são pano de fundo de vários deles também. A infância rende textos maravilhosos, permeados por uma vívida poesia. E há um exemplar essencialmente psicológico, “K”, da sul-coreana Han Mahl-sook, além de um conto surrealista, “O outro quarto”, do sul-coreano Choi In-ho.
Um dos que mais gostei foi o de Ha Kem-Chan, “O sofrimento de duas gerações”, sobre um veterano de guerra que não tinha um braço e que esperava a volta do seu próprio filho de uma guerra em que perdeu uma perna.
O único que aparece com dois contos é o norte-coreano Hwang Soon-won e é justamente ele o mais poético dos escritores. Ele lida com o tema da infância de uma maneira muito tocante. Em “Estrelas”, por exemplo, um menino se afasta da irmã depois que disseram que ela se parecia com a falecida mãe, coisa que ele não podia aceitar. Pirraças entre um menino e uma menina fazem parte do seu outro conto, “Aguaceiro”, mas levando a uma doce aproximação entre eles que termina de forma trágica”. “Tempo de camélias”, do sul coreano Kim Yu-jung, é da mesma linha, com dois adolescentes que ficam se provocando, coisa que, como se sabe, é outra maneira de dizer que se gostam.
“Sonho abandonado”, do norte-coreano Son Chang-sup, é também uma história de dramas familiares que inclui cenas de violência. O sul-coreano Cho Sun-jak, em “Tapume pintado”, também oferece momentos fortíssimos, pois, afora as sugestões de zoofilia, um dos personagens matava cachorros para restaurantes. É um conto cheio de misérias, e não só financeiras, mas também morais.
Os outros contos são “A rocha”, de Kim Tong-ni, do sul, que também trata de uma degradação familiar, “Batatas”, de Kim Tong-in, do norte, em que se vê a miséria obrigando os personagens a rebaixar seus padrões morais, também contos “fortes”, bom adjetivo para esses coreanos.