Alex 09/05/2014Comprei o livro com um certo aborrecimento (era o único que abordava o conflito), pois, ao folheá-lo, vi que iria encontrar em suas páginas um retrato em preto e branco do conflito: um ditador malvado que reprime um povo em busca de liberdade e democracia. Enquanto que na verdade a Síria é uma colcha de retalhos étnica: drusos, alauítas, critãos, curdos, xíitas, sunitas, dividem espaço (importante lembrar que grande parte da população apóia Al-Assad, que foi eleito em 2007 por meio de referendo para um mandato de sete anos); e que não se trata de uma guerra entre "tropas fiéis a Al-Assad" x Exército Livre da Síria (ELS). Só oposição síria está segmentada em mais de mil facções, cada uma com interesses próprios, e, nesta data (9/5/2014), o ELS praticamente se tornou irrelevante na guerra, com grupos jihadistas poderosos, como a Al Nusra e o EIIL, sendo os protagonistas.
Mas acabou que o autor não se preocupou em retratar os meandros diplomáticos e políticos do conflito (sobre aspectos geopolíticos do conflito, recomendaria o livro "A Segunda Guerra Fria" do brasileiro Luiz Moniz Bandeira, ou sites especializados, como o Asia Times Online), mas buscou demonstrar o sofrimento de cada pessoa com a qual se deparou, esteja em qualquer um dos lados. Cada um tinha uma história a compartilhar: a perda do emprego com o qual sustentava a família; a perda de familiares (pela morte ou pela opção política); alistamento obrigatórios... Portanto, o livro não pretende ser uma reportagem de política internacional com reportagem em campo, mas um relato da experiência pessoal do autor durante a semana que passou na Síria. E o consegue. Klester desenvolve uma narrativa objetiva, empolgante, e envolvente, que nos faz também querer saber sempre o que está por vir (embora já saibamos que o autor e seus registros encontram-se são e salvos, ou do contrário não teríamos o livro).
Talvez pela riqueza de detalhes, em que descreve com precisão sons, ambientes, pessoas, gostos e cheiros, além de uma narrativa extremamente bem estruturada e linear, podemos sentir um pouco de sua angústica em cada expectativa frustrada, em cada interrogatório... Mas também sentimos um pouco de sua felicidade ao descobrir, no inferno, o amor, a devoção, e a solidariedade de desconhecidos para com desconhecidos. Quando terminei o livro pude sentir um alívio sincero e agradeci a Deus por viver livre em um país como o Brasil.
Como foi escrito ainda durante o conflito, capítulos decisivos da guerra ficaram de fora, como a guerra interna entre os rebeldes; o ataque químico há poucos metros de onde inspetores da ONU estavam hospedados (que muitos relatam ter sido uma falsa bandeira para provocar a intervenção dos EUA, que, à véspera de ocorrer, foi impedida pela diplomacia russa) e a conquista de cidades importantes pelo governo (enquanto lia o livro, os últimos rebeldes deixavam o centro de Homs, sitiado há quase dois anos). Terminamos o livro na esperança de que um dia possamos ler um posfácio tratando sobre a reconstrução do país e o reencontro de Klester com Amman, Walid e Adnan.