voandocomlivros 08/05/2022
"O crítico Boris Eikhenbaum formulou, por volta de 1920, uma tese provocativa: as famosas crises de Tolstói, tão alardeadas pelo próprio autor, não seriam de natureza religiosa, mas criativa, nascidas do esgotamento de práticas e gêneros levados à perfeição pelo grande narrador. Isso teria acontecido na década de 1860, quando Tolstói se voltara para a pedagogia e para as histórias infantis; o mesmo valeria para a crise seguinte: Anna Kariênina marcara o ápice do romance familiar, como Guerra e Paz assinalara o ponto alto do romance histórico oitocentista. Essa consumação e esse esgotamento estariam na raiz da crise e o interesse subsequente de Tolstói pela literatura doutrinária, pelas vidas de santos, pela narrativa popular e, de maneira geral, pela narrativa breve..."
Nessas crises criativas citadas por Eikhenbaum, Tolstói conseguia extrair o melhor de seu trabalho literário. "Padre Sérgio" é um desses resultados fenomenais, uma novela curta, mas não corrida. Tem poucas personagens, é fluida e tem uma sutileza escancarada sobre a Igreja e vida monástica que se misturam em críticas e salvação.
"QUANTO MENOS IMPORTÂNCIA DAVA À OPINIÃO DAS PESSOAS, MAIS FORTEMENTE SENTIA A PRESENÇA DE DEUS."
O Príncipe Stiepan Kassátski sempre foi determinado e alcançava tudo que almejava, quando, de repente, resolveu abrir mão de tudo e se tornar o padre Sérgio. Enquanto a história vai se desenrolando, vamos refletindo sobre os impasses do protagonista e entendendo seus verdadeiros anseios.
Fazendo um grande contraste da vida em sociedade com o mundo eclesiástico, o Tolstói consegue imprimir nas páginas de "Padre Sérgio" todos seus últimos pensamentos em vida.
Essa foi uma novela que me encantou e muito me fez refletir. Mas não posso deixar de destacar a "Resposta à resolução do Sínodo de 20-22 de fevereiro de 1901 e às cartas recebidas nessa ocasião" que está no final dessa edição, também foi escrita pelo Tolstói e é simplesmente de uma genialidade sem igual. Sério! Só enriqueceu essa edição que já estava impecável.
Deixo aqui um pedacinho da "Resposta à resolução do Sínodo...":
"COMECEI POR AMAR MINHA FÉ ORTODOXA MAIS QUE MINHA TRANQUILIDADE, DEPOIS PASSEI A AMAR O CRISTIANISMO MAIS QUE MINHA IGREJA, AGORA AMO A VERDADE MAIS QUE TUDO NO MUNDO. E ATÉ AQUI A VERDADE PARA MIM COINCIDE COM O CRISTIANISMO, COMO O ENTENDO. PROFESSO ESSE CRISTIANISMO E, À MEDIDA QUE O PROFESSO, VIVO TRANQUILO E FELIZ, E TRANQUILO E FELIZ VOU ME APROXIMANDO DA MORTE."
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