Toni 12/11/2019
Este livrinho traz duas conferências proferidas por Saramago. A primeira, “Democracia e universidade”, aconteceu em 2005 na Universidade Complutense de Madrid e é, de fato, um texto inédito do autor aqui no Brasil. A segunda, “Verdade e ilusão democrática”, foi lida em dois momentos: em 1998, numa conferência organizada pela Cátedra Júlio Cortázar, na Universidade de Guadalajara, México; e em 2003, por ocasião das Conferências de La Moneda em Santiago do Chile. Hoje, este segundo texto pode ser encontrado também no Último caderno de Lanzarote: o diário do ano do Nobel.
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Não será novidade pra quem já leu os romances do autor, ou conhece algumas de suas declarações, a condenação tácita que Saramago faz do mercado financeiro, “o poder autêntico [...] no qual não se vota, que está num lugar não assinalado, a pressionar, a exigir, a mandar”. Para ele, nossa (iludida) noção de democracia está o tempo todo sendo contestada pelas injustiças sociais e pelos caminhos exploratórios (de recursos naturais e pessoas) reproduzidos por governos que deveriam ser, etimológica ou gregamente falando, do povo e para o povo. Basta ver, e reparar. Saramago propõe, portanto, a “aprendizagem da cidadania” e o abandono das utopias como percurso para a criação do cidadão bom, tomado aqui não apenas como o cumpridor de leis, mas sobretudo como alguém que “tem espírito crítico, que não se resigna, que não aceita que as coisas sejam assim, ou assim sejam vistas apenas porque alguém decidiu”.
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Há muitas críticas que podemos fazer à proposta de Saramago de se desenvolver mais profundamente a cidadania no nível universitário. A mais evidente delas é a inexistência de qualquer relação entre o aperfeiçoamento intelectual e o desenvolvimento de um olhar genuinamente preocupado com o outro e seus direitos. Saramago, no entanto, não fala para dar respostas, mas para levantar a dúvida, a instabilidade, e desassossegar o ideal de democracia ao qual vivemos agarrados mas que só funciona para benefício de uma minoria.