FremenJeff 28/01/2024
A épica conclusão do primeiro arco de Duna
"Estou na areia, á brilhante luz do dia, mas não há sol. Então me dou conta de que eu sou o sol. Minha luz emana como um Caminho Dourado. Quando percebo isso, saio de mim. Volto-me, esperando me ver como o sol, mas não sou o sol. Sou uma figura esquemática, o desenho de uma criança com linhas luminosas em ziguezague formando os olhos, e riscos no lugar das pernas e dos braços. Há um cetro na minha mão esquerda e é um cetro de verdade, muito mais detalhado em sua realidade do que a figura esquemática que o está segurando. O cetro se mexe e isso me deixa apavorado. Quando ele se mexe, eu me sinto acordar, mas sei que continuo sonhando. Entendo então que a minha pele está revestida por alguma coisa, uma armadura que se mexe conforme eu me movimento. Não consigo ver essa armadura, mas posso senti-la. E então o terror sai de mim, pois essa armadura me dá a força de dez mil homens."
Terceiro livro de "As Crônicas de Duna" e com ele retorna a complexidadede temas abordados no primeiro livro com maestria, as primeiras páginas são bem confusas, porém com persistência você engata na história e percebe o melhor que ela tem a proporcionar, tornando-se melhor que o segundo sem precisar de muito esforço.
Neste livro outros assuntos são introduzidos de uma forma fenomenal, como por exemplo a mudança de um ecossistema e como isso é perigoso, mostrando um discurso político que fica cada vez mais atual, mesmo tendo sido publicado em 1976, á profundidade de sua trama mostra assuntos cotidianos: O perigo do fim de uma cultura, traições políticas e famílias poderosas lutando pelo o domínio de um império.
Outro conceito que (Está me deixando chocado com a profundidade levantada) é o conceito "transhumanista" de Leto II. Para quem não conhece tal termo, vai uma breve explicação: Transhumanista é uma "nova" psicologia e uma forma de perceber o tempo e de construção de uma identidade coletiva, pois Leto II possui dentro de si toda a memória genérica da humanidade.
O ritmo, depende muito da sua concentração, assim como seus livros anteriores (Principalmente Duna) não é uma obra que você pega na sua estante para "Passar o tempo", exige um grau de concentração mais elaborado pois existem momentos chaves que mostram que este livro é uma nova etapa da história.
E o que falar de Alia? Alia sucumbiu ao poder em uma possessão de um personagem conhecido, temido e perigoso e todos os diálogos envolvendo essa nova percepção são bem construídas.
Quem me conhece também sabe o quanto senti falta de Lady Jéssica em "Messias de Duna" e neste livro aqui, para compensar, temos vários momentos cruciais da trama onde ela está envolvida e seus diálogos e suas percepções mentais continuam fantásticas.
"A dor é uma função dos nervos?, lembrou-se Idaho. ?A dor vem como a
luz chega aos olhos.
Jéssica e Idaho aliando-se a casa Corrino para a queda do império de Alia é outra pegada sensacional na narrativa.
"Mas com livros e fitas só se aprende
que certas coisas podem ser feitas. O verdadeiro aprendizado exige que a pessoa faça essas coisas."
A partir de aqui o caminho dourado que Leto II tanto menciona começa a ser introduzido em uma forma impecável.
"Duna era um gigante contando suas riquezas acumuladas. Era uma entidade
enganadora, ao mesmo tempo bela e grosseiramente feia. A única moeda que
seus mercadores conheciam realmente era o pulso de seu próprio poder, não
importando como esse poder pudesse ter sido adquirido."
"Eu lhes digo que aprendam que o crescimento e a morte de um governo têm sua evidência no crescimento e na morte de seus cidadãos."
A figura do pregador retorna novamente após a "Morte de Leto II" com uma pregação poderosa e perigosa e que faz Alia temer o rumo de tal heresia.
"? Eu articulo o mito e o sonho! ? gritou o Pregador. ? Sou o médico que
faz o parto e anuncia que a criança nasceu. E no entanto venho até vocês num
tempo de morte. Será que isso não os perturba? Eu devia sacudir suas almas!"
"Ahhh, a mensagem deles é clara: abandonem a certeza! ? E repetiu
num grito estentóreo: ? Abandonem a certeza! Essa é a ordem mais profunda
da vida. É disso que se trata a vida. Nós somos uma sonda rumo ao desconhecido,
à incerteza."
E finalmente,após tanta desconfiança de Alia e de outros personagens, o Pregador trata Alia como sua "irmã", quero vê algo mais desenvolvido sobre essa informação, porém, confesso que fiquei chocado e maravilhado com o momento da "revelação".
"Existir é destacar-se, sobressair na paisagem. Vocês não estão pensando ou realmente existindo, a menos que se disponham a arriscar, até mesmo sua sanidade mental, no julgamento de suas próprias existências.
Demorei para construir um texto com minhas impressões para este livro, pois, com As Crônicas de Duna, a trama possuí seu próprio ritmo característico de Frank Herbert para a imersão e compreensão ao o que ele deseja apresentar. E finalmente o arco deste livro criou um profundo entendimento, de fato, ele possui uma estrutura de fim de trilogia, mas também, de início de um jogo por poder mais denso.
"O princípio e o fim são um só - continuou Leto. - Você vive no ar e não o vê. Uma fase se encerrou. Desse final brota o começo de seu oposto. Assim, teremos Krazilec. Tudo retorna depois, em forma alterada."