Pedrex 15/02/2012
Vamos começar por um dado: a Bíblia é o livro (ou os livros) mais lido de toda a História, assim como o mais discutido. Grandes inteligências se desenvolveram e apresentaram seu vigor por meio da leitura e análise da Sagrada Escritura. Só para citar alguns exemplos, temos: Agostinho de Hipona, um dos maiores filósofos da História; Isidoro de Sevilha, considerado um dos primeiros enciclopedistas do mundo; Tomás de Aquino, um dos principais construtores do pensamento ocidental, entre outros (a lista seria infindável, pois teríamos que contar os nomes de Blaise Pascal, Isaac Newton, Alberto Magno, etc.).
Outro dado: a Bíblia é o livro que mais gerou opiniões apaixonadas até os nossos dias. Muitos ficam escandalizados com a rusticidade de sua linguagem em alguns livros, principalmente nos quais está prescrita a Lei Hebraica, com suas punições violentas, e nos outros que descrevem as guerras de Israel e os massacres que as acompanham, como Josué, Juízes e 1 e 2 Samuel. Não é de se impressionar. Agostinho de Hipona e Jerônimo em princípio também consideraram a rusticidade desse livro aberrante. No entanto, nem por isso deixaram de se apaixonar por ele, a ponto do último citado ter o fôlego de traduzi-lo inteiro para o latim, consultando versões em grego e hebraico e dedicando sua vida a esse trabalho.
E então, chegamos ao terceiro e último dado: a Bíblia é o livro que revolucionou a vida de um número de pessoas que nenhum outro até hoje pôde ou poderá alcançar (incluindo, obviamente, o autor desta resenha). Desde as pessoas mais simples, como a ralé que o cínico Celso (séc. II) afirma constituir a Igreja, até as mais instruídas, como os já citados Agostinho e Tomás de Aquino, mas também Gregório de Nissa, Orígenes, Anselmo de Canterbury, um número infindável de almas foram transformadas pelo contato com a Palavra de Deus. Isso porque ela não foi unicamente lida, mas também ouvida, seja liturgicamente ou familiarmente.
No entanto, o contato de uma coletânea de livros milenares com o secularismo contemporâneo gera distorções apaixonadas. Muitos, esquecendo que a Bíblia, apesar de sua diversidade estilística e cronológica, constitui uma unidade na pessoa de Cristo, lançam juízos anacrônicos sobre seu texto. E, de certa forma, possuem o seu ponto. Quem não se escandalizaria se hoje uma sociedade aplicasse uma lei que manda apedrejar uma mulher que foi estuprada na cidade por não pedir ajudar? Mas justamente aí está a questão: a Bíblia não relata, nesse ponto, o hoje, mas o ontem, com suas próprias características culturais-jurídicas. Seria o mesmo que fazermos de Aristóteles um proscrito por defender a escravidão.
A Bíblia, como o enxergaram Justino de Roma e Orígenes, Agostinho de Hipona e Jerônimo, possui um centro, o qual na verdade se encontra em todos os livros "periféricos", por assim dizer: Cristo e Sua mensagem sobre um Deus de amor que, para a salvação dos homens, não hesita em entregar Seu próprio Filho ao sofrimento e à morte. Ora, dirão alguns, um Deus de amor que dita uma lei tão cruel como a hebraica? A resposta é sim e não. Um Deus tão amoroso e tão infinitamente sábio que, sabendo que o povo que Ele escolheu não está pronto para receber a mensagem de amor que lhe reserva para o futuro, tolera seus costumes rudes e violentos, como um pai sábio que tolera algumas atitudes de seu filho arteiro sabendo que ainda não está preparado para receber o ensinamento sublime que lhe reserva. Pensando de forma absurda, qualquer um de nós que estivesse no lugar de Deus e buscasse aplicar as idéias modernas para aquele povo, não teria sido ouvido, teria se irado e levado aqueles de "cerviz dura" ao extermínio, causando, assim, o fracasso da História da Salvação. No entanto, ainda bem que, como está na Sagrada Escritura, a sabedoria dos homens é loucura para Deus, enquanto que a loucura deles é Sua sabedoria.
Sem mais, a Bíblia é, como diz o título de um filme, "a maior história de todos os tempos", tanto em tamanho quanto em grandeza, pois Seu autor é o único que podemos dizer que é realmente Único (o trocadilho, por incrível que pareça, não foi planejado). Ponto final.