Daniel 04/04/2018
Uma aula de surrealismo no mundo dos arquétipos (ou quase isso)
Pouco conhecido do grande público, Pericles Prade é um dos nomes mais significativos da literatura fantástica no Brasil. Essa coletânea, publicada originalmente em 1971 e hoje esgotada das livrarias, reúne quinze contos com enredos absurdos, repletos de tons oníricos e fortes cargas de surrealismo.
São histórias curtas, com pouco mais de uma página, cuja estranheza narrativa lembra vagamente o estilo de autores como Murilo Rubiao e José J. Veiga,assemelhando - se com pequenas com fábulas ou contos populares, embora fuja bastante de qualquer classificação possível.
Não há um fio condutor lógico nas narrativas. É inútil tentar interpreta - las de um ponto de vista racional, sendo necessário procurar compreende - las como manifestações do sonho, do caos e Do ilogismo surrealista, tal como num filme de Bunuel ou um quadro de Salvador Dali.
As personagens costumam seguir modelos arquétipos próprios, estabelecendo diálogos e intertextos com as mais diversas culturas e simbologias, evidenciando, numa perspectiva junguiana, um processo de associação inconsciente que dá margem às mais diferentes interpretações. Pequenas sutilezas, desde o nome das personagens e lugares à presença de certos símbolos numéricos (o número 9, o número 7, etc) produzem no leitor uma sensação mista de caos, estranhamento e alienação, sensações que muitas vezes apenas o gênero fantástico é capaz de propiciar.
Mas o que mais impressiona no autor é o caráter quase incomparável de sua obra, de modo que não nenhum outro escritor na literatura brasileira que trate o fantástico com a mesma perspectiva que ele trata, o que faz de Pericles Prade talvez o expoente mais puro da ficção surrealista no país.