Zé - #lerateondepuder 01/02/2020
Imortalidade
A Imortalidade é, por assim dizer, um romance um tanto quanto complexo, profundo não por palavras rebuscadas, mas pela abordagem de diversos temas, principalmente filosóficos, que seu escritor procura apresentar, sendo descrita de forma não linear, indo e voltando às histórias de seus personagens. Desgostoso por sua obra de 1983 tornar-se uma aclamada adaptação para o cinema (dirigido por Philip Kaufman, 1988), Milan escreve um livro que dificilmente será visto em alguma tela de cinema, composto por sete partes, onde o autor descreve alguns personagens, bem como a vida de Johann Wolfgang von Goethe e seu relacionamento com Bettina Brentano, referenciando a imortalidade das pessoas. Por incrível que pareça, Kundera ainda consegue a proeza de criar em algumas partes, diálogos post mortem que Goethe terá com o venerado escritor americano Ernest Miller Hemingway, elencando a imortalidade de cada qual.
Quanto aos personagens, em linhas gerais, teremos: Agnes, protagonista, formada em matemática, mas que trabalha com informática e é casada com Paul, tendo uma filha, Brigite; Paul, advogado, despedido de um programa de rádio, casado com Agnes e, depois de morte desta, com a sua irmã, Laura; Laura, irmã de Agnes, formada em música, separada, tem como amante, Bernardo, 10 anos mais moço, mas vai acabar a trama com Paul, após a morte solitária de Agnes, em um acidente; Brigite, filha de Paul e Agnes, jovem que tem grande intimidade, principalmente com o pai, irá sair de casa com o casamento de Laura e Paul, mas regressando com uma filha, após ser abandonada pelo namorado; Bernardo, amante mais moço de Laura que trabalha em uma rádio; Professor Avenarius, personagem com quem o narrador parece conversar sobre o tempo presente e sobre o desenvolvimento do livro; e Rubens, pintor de excelentes caricaturas, quando jovem, mas frustrado por não conseguir cursar a universidade de Belas Artes.
Na primeira parte, a personagem Agnes é inserida na trama, com o narrador justificando que a idealizou, baseando-se em uma idosa em que repara nadando em uma academia de ginástica. Era casada e mãe de uma filha, atarefada pelo trabalho, usando o sábado para realizar tarefas que não conseguia durante a semana, dentre estas ir à sauna e conversar com amigas, ouvindo as coisas do cotidiano. Ao sair da sauna, lembrou-se da infância e da conversa com seu pai sobre Deus, que nos tinha criado como um programa de computador implacável, nos deixando ao bel prazer, como que abandonados.
A segunda parte começa com a descrição de um momento cotidiano histórico com personagens ligados a Goethe. Um casal jovem que se hospeda em sua casa e uma mulher jovem que se insinua para um Goethe de mais de sessenta anos, trazendo ciúmes à sua esposa, uma vez que essa jovem tem muito mais tempo de vida que a mulher do escritor, ou seja, tem mais mortalidade. Segue com a história de Bettina e Goethe, ressaltando a questão intrínseca da morte e da imortalidade, destacando que Bettina gostava disso em Goethe. Essa história deve se basear nas cartas verídicas que Bettina Brentano trocou com Goethe. É aqui que Goethe faz suas reflexões sobre sua imortalidade. Pouco depois, aparece sua relação com Beethoven e, finalmente uma conversa sua com Ernest Hemingway, claro que ambos já mortos, criticando como foram tratadas suas respectivas imortalidades, muito por conta de suas obras.
Já a terceira parte retoma à Agnes, tocando na questão do gesto de despedida que ela havia desistido de fazer, para não se parecer com a secretaria de seu pai. Só que agora, ela escreve sua irmã mais nova Laura, observando esse gesto em Agnes. Fala de Laura, sua irmã mais nova que se apaixona por seu marido Paul, mas acaba se casando, porém, não pode ter filhos. Agnes tinha uma vida muito boa, mas Laura tinha uma vida nem tão boa, o que fez com que a Agnes cuidasse de Laura. As diferenças entre a sexualidade das irmãs são comentadas nessa parte. Laura é totalmente sexual, mas Agnes, nem tanto. Fala, também, da pretensa relação de Laura, mais velha, com Bernardo Bertrhand. Destaca alguns tópicos para comentar e refletir, como a IMAGOLOGIA, a questão da imagem que substitui o conjunto de ideias, nem sempre representa a realidade dos fatos.
Seguindo com a quarta parte, começa o julgamento de Goethe, com o testemunho de três personalidades. O narrador irá descrever que o amor de Bettina foi falso, por ter sido imposto a Goethe. Assim, tenta descrever o sentido do amor, segundo Bettina, uma virtude suprema. Cita o homo sentimentalis, um ser que valoriza os sentimentos, desenvolvido na história da civilização europeia, tão racional, e descreve o amor do coração e alma dos Cristãos. Conta a horrível morte de Agnes e como Paul fica fragilizado, recebendo de Laura um apoio incondicional.
Começa a quinta parte, citando Agnes que lia poemas de Rimbaud e continua falando sobre a teoria do acaso, pois não existe uma lógica no destino das pessoas. Conversa com o Professor Avenarius, sobre a intenção de não deixar que seu livro se transformasse um uma adaptação para filme e que este livro deveria se chamar Insustentável Leveza do Ser. Termina, voltando à morte de Agnes no hospital sem revelar o motivo, tendo Paul e Brigite chegado 15 minutos depois de seu falecimento.
A sexta parte começa o personagem Rubens, com o narrador descrevendo como é um horóscopo e qual sua relevância para nossa vida limitada. Fala sobre o tempo, o relógio que percorre o círculo e volta a posição anterior, como se fosse o eterno retorno. Vai contando que as pessoas como Rubens passam por fases e que ele vive naquele momento, o período da verdade obscena. É uma passagem bem erotizada de Rubens e suas amantes referenciadas apenas pela letra inicial do nome.
A sétima parte finaliza com a conversa com o Professor Avenarius sobre apostas de sair com celebridades. Depois, junta-se um certo Paul e conversam sobre sinfonias, aparecendo Laura e Brigitte, que volta para casa depois de ser abandonada pelo namorado com um filho. E acaba o romance, como se o narrador tivesse tido conversas com seus personagens, esclarecendo que o narrador, na verdade, não era Kundera, mas mais um dos personagens fictícios.
Foi um desafio descrever uma obra que tem tão poucas resenhas e, neste caso, a intenção foi a de comentar a história com um pouco mais de detalhes, até mesmo para elucidar a quantidade de aspectos tão díspares tratados neste romance. Esta edição resenhada trata-se da tradução de Teresa Bulhões e Anna Andrada, da Editora Nova Fronteira, RJ, de 1990 de 262 páginas. Ela pode ser encontrada para ser baixada em LelivrosLove, disponível em: http://lelivros.love/book/baixar-livro-a-imortalidade-milan-kundera-em-pdf-epub-e-mobi/, acesso em: 01 fev. 2020.
Por fim, a Imortalidade que Kundera aborda é aquela que deixamos depois de nossa morte ou nossas histórias talvez contadas pelas pessoas que ficam. O autor classifica que a preocupação com a própria imagem é a incorrigível imaturidade do homem e que você pode até mesmo dar fim à sua vida, mas nunca a sua imortalidade. Foi por este livro que entendi uma das interpretações do título A Insustentável Leveza do Ser. Significa que o ser, as pessoas, podem assumir ou alternar diversos papéis, uma vez que estes não se sustentam. São, muitas vezes, leves demais.
Paz e Bem!
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