Letícia 05/06/2017A proposta da livro é interessante: apresentam-se três histórias distintas que marcam a presença de latinos na imensidão do território estadunidense.
O primeiro personagem é o jovem mexicano Jesús María José Reyes, inspirado num serial killer da década de 90, chamado Ángel Maturino Reséndiz, mais conhecido como The Railroad Killer. Desde sua adolescência Jesús demonstra sinais de marginalização, sua família era pobre, seu pai abandonou-a para atravessar a fronteira com os Estados Unidos para conseguir emprego e enviar dinheiro. Em seguida desapareceu.
Jesús assistia seus primos mais velhos, que já tinham sido presos, roubar transeuntes e os acompanhava quando usavam drogas e visitavam prostíbulos. Um dos rapazes se sentiu ofendido pela rejeição de uma prostituta e decidiu dar uma lição nela acompanhado de um primo e de Jesús. Eles a esperaram em sua casa, onde estupraram-na e Jesús foi especialmente brutal. A descrição dessa cena foi tão forte que ficou na minha cabeça pelo resto do dia e não quero descrevê-la aqui, acaba com o meu humor. O importante é saber que ela é assassinada por Jesús.
Alguns dias depois, o rapaz foge intimidado pelo padre após a confissão do crime. Na cidade fronteiriça de Juárez, é aliciado por uma quadrilha e é encarregado de atravessar carros roubados nos Estados Unidos para o México. Nesse período, os mexicanos emigravam em massa devido à violência da guerra dos cartéis de drogas. Com o tempo, Jesús ganha a confiança do chefe e ele mesmo faz os roubos, mas ele não queria apenas se restringir a carros, seu apetite sexual incluía estupros, e ele o faz com suas namoradas e passou então a estuprar e assassinar no outro lado da fronteira também. Certo dia, invadiu uma casa que pensava estar vazia e, por um descuido seu, não conseguiu impedir que a dona da casa fugisse e ligasse para a polícia. Foi preso pela primeira vez e ficou 6 anos na cadeia. Lá foi estuprado, seu porte era pequeno e poderia ser dominado facilmente por outros presos caso tentasse resistir. Com o tempo, aprendeu a negociar o sexo por proteção.
Na prisão, Jesús acredita ter recebido a visita do Inominável e passa a se declarar um anjo vingador que deve trazer a justiça ao mundo. Quando sai da cadeia, entretanto, tenta evitar confusões e descobre que seu antigo chefe foi morto, o que o motivou a fugir para um pequeno povoado e a começar uma vida pacata. Casou-se e periodicamente atravessava a fronteira para praticar seus crimes, trazendo presentes para sua mulher, que não desconfiava do caráter do marido. Todos os delitos aconteciam próximo às linhas férreas, já que este era o modo que Jesús entrava nos Estados Unidos, por isso foi chamado de The Railroad Killer (O assassino da estrada de ferro), como o assassino da vida real.
Nossa segunda personagem é Michelle, filha de bolivianos que estudava literatura, mas descobriu que sua paixão são as histórias em quadrinhos, não a crítica e falta de criatividade da academia. Nessa história dois personagens secundários são importantes: seu namorado Fabián e seu amigo Sam. Fabián era um jovem acadêmico quando lançou um livro muito bem recebido pela academia que rapidamente virou um sucesso, tornando-se obrigatório no currículo de diversas universidades. Não se sabe se o sucesso precoce foi gatilho para o bloqueio e os vício a que Fabián se entregou, depressão, drogas, frustração, angústia por um amor que supostamente o abandonou. A relação com Michelle era difícil, ela queria ajudá-lo, mas percebeu que fazia pouca diferença na vida dele e na verdade estava se iludindo achando que as coisas voltariam ao normal. Ela também tentava exaustivamente criar uma história sua, original, mas não conseguia.
Sam era apaixonado por Michelle e não aceitava que ela não estivesse interessada nele devido à sua paixão cega por Fabián. Ele também se dedicava à literatura, mas de um modo mais acadêmico. Como passatempo, dirigia um programa de rádio na universidade, onde deixava seu lado acadêmico engessado de lado.
Esta história serve de elo entre as outras duas histórias do livro. Em seu programa, Sam decide fazer um especial sobre serial killers e troca cartas com Jesús na prisão, quando este foi condenado à pena de morte.
Michelle, numa última tentativa de ter uma vida normal ao lado de Fabián vai à uma exposição do desenhista Martín Ramírez, mas a noite não acaba bem.
A história de Martín começa na década de 30, quando vai para os Estados Unidos trabalhar a fim de enviar dinheiro para sua família no México. Quando não conseguiu mais nenhum emprego, é encontrado vagando por uma estação ferroviária e é mandado para um hospital, onde é diagnosticado com demência catatônica. Martín prefere não falar, teme que todos os policiais sejam inimigos que estão perseguindo-o como prisioneiro de guerra, apesar de sua mulher ter se aliado aos federais na guerra que acontecia no México. Essa paranoia o perseguiu pelo resto de sua vida. Ele preferia se comunicar através de imagens, era autodidata e aprendeu a desenhar. Foi enviado a diversos hospitais psiquiátricos até que um professor de psicologia que estudava a arte de doentes mentais encontrou-o e reconheceu seu talento.
A partir daí a obra de Martín tornou-se conhecida através de exposições, embora dê a entender que os créditos tenham ficado majoritariamente com o acadêmico. Ele gostava de desenhar com diferentes materiais, de unir várias folhas para ter um espaço amplo e colar figuras de revista em suas obras. Dos seus desenhos, os meus preferidos são os de trens.
Martín Ramírez é um personagem real, a história foi baseado no que se conhece de sua vida, embora o autor tenha se permitido a liberdade de romancear.
Apesar de ter ficado chocada com a violência de Jesús e o abuso de drogas de Michelle e Fabián, eu indicaria o livro para alguém que goste de histórias de serial killers e tenha mais estômago para a violência.
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