Léo 18/01/2017
Incrível, escrita formidável, enredo fantástico
O artigo de hoje mais uma vez traz a apresentação de um livro nacional, e cá entre nós, que livro! Diário de um Exorcista, escrito pelos autores Renato Siqueira e Luciano Milici é realmente surpreendente, e merece ter o seu devido reconhecimento em todo o canto desse país, pois não se trata de uma abordagem comercial, percebe-se a valiosa amostra real, histórica e elucidativa do assunto, e tudo isso sem forçar um assanhamento no leitor, pois a excitação pela leitura acontece como uma arte, algo decerto muito agradável e espontâneo. Diante disso, como não me sentir extremadamente louco, faminto e — irremediavelmente — perturbado com o enredo? Os autores usam dos artifícios reais para apresentar como tema, um assunto para muitos — assombroso —, mas, ao mesmo tempo, enriquecedor, que, com certeza, deixa até o mais cético dos leitores, aterrorizado ao máximo. Nem tanto na questão de sentir o medo durante a leitura, mas a inquietação na alma é garantida. Para os mais curiosos, as informações são valiosas e caem como uma luva, e se tratando de um nacional, é ainda mais impressionante, não por duvidar da capacidade dos nossos queridos companheiros de letras e cinema, mas justamente pela combustão na língua daqueles que questionam os recursos e qualidade do que é nosso. Há como se achar surpreso, assim como me encontro agora, também por razões do conjunto — livro e filme — que os autores produziram. E lembre-se desde agora para todo o sempre, ''As portas de entrada para a influência demoníaca são as falhas morais''.
Que escrita formidável! Que forma maravilhosa e atraente de narrar os fatos! Que capacidade de envolver e marcar o leitor! Quanta informação adquirida a respeito dos temas exorcismo, possessão, demônios, paranormalidade e sobrenatural! Um livro onde a beleza e harmonia se encontram justamente naquilo que há de mais impuro em cada indivíduo, seus desejos mundanos e medos, as portas de entrada para receber entidades em suas próprias matérias. É incalculável o cerne de pensamentos e toda a gama de abstração que o leitor atinge durante o processo de leitura, que não é simplesmente um ato passageiro e de entretenimento, torna-se desde o início uma verdadeira e perigosa viagem junto aos protagonistas afim do conhecimento, convencimento e até mesmo vingança. ''Os terrores que presenciei são indescritíveis e inacreditáveis. As pessoas normais gabam-se da tecnologia e da segurança que a razão lhes dá, mas não sabem a real natureza do mundo. O mal existe, está encarnado e quer destruir a raça humana''.
O velho embate entre o bem e o mal, o real e o sobrenatural, Deus e o diabo é bem discutido no mundo desde épocas mais antigas, e eu sempre persegui bastante esse tópico. O que dizer sobre esse diário, hein!? Ainda não estou acreditando que encontrei um livro que reúne frações literárias de assuntos e gêneros que eu sou apaixonado: a começar pela religiosidade e historicidade; a qualidade dessa parcela histórica do livro é fabulosa, jornadeando por volta das décadas de 50 e 60, relembrando períodos como o início da Ditadura Militar, a Copa de 50, a postura da jovem guarda e o princípio de uma leve quebra do conservadorismo católico no país. Depois, ainda me deparo — por boa parte do enredo — com marcas predominantes da beleza do mundo infanto-juvenil; a facilidade nos diálogos das personagens e a presença desses elementos infantis é um tempero necessário para a obra, que estimula ainda mais a leitura. E pra terminar, claro, o bom conhecido caráter do terror; o modelo é preciso, arrebatador e — sensual — a todo o tempo.
A ideologia do meio sobrenatural embrulha-se aos personagens, o que não poderia ser diferente, visto que a escala dos relatos — baseados em fatos reais — sobre possessões e exorcismos fica cada vez mais interessante e perigosa, como uma nuance demoníaca, prestes a explodir por todos os cantos e apoderar-se das mais fracas e propensas almas.
''Infelizmente, ao dar meia-volta com minha bicicleta, vislumbrei o que mais se aproximava, em minha mentalidade infantil, da descrição de 'o vale das sombras e da morte'. Havia muita escuridão, sombras e silhuetas que aguardavam meu retorno. O caminho de volta parecia muito mais assustador que o de ida e ainda pesava o fato de eu não ter meu pai nas proximidades para gritar por socorro.''
O estudo pormenorizado e sistemático a respeito dos demônios — a demonologia — é parte fundamental nas referências citadas na obra para o teor instrutivo e torna-se muito bem aceita e até mesmo precisa para o entendimento de todo o processo de evolução do enredo. A trajetória do padre Lucas e seus demais amigos padres exorcistas nas batalhas obscuras e fatigantes contra as entidades diabólicas — entre elas, demônios como Ben-Abaddon e Alus-Mabus, o segundo, existente desde a Idade Média —, são muito bem descritas e façanhosas. ''Decidi, naquela tarde, com 12 anos, na missa de sétimo dia, que me tornaria padre. Dedicaria minha vida a estudar e combater aquelas forças que... me rodearam e amedrontaram...''. Sem dúvida, para os mais interessados ao gênero, Diário de um Exorcista é obrigatório para a coleção, e certamente uma obra que marca, e que mesmo depois de anos após leitura, a narrativa jamais deixará de ser parte da lembrança do leitor.
''Desnecessário descrever as mudanças políticas, sociais e culturais que o Brasil e o mundo sofreram naquele famoso ano que jamais terminou. Ouvia falar de perseguidos ideológicos, tortura, militares e protestos...''. A política é alusão clara a época descrita no enredo dos autores e traz à tona rememorações sombrias do nosso país, tão sombrias quanto a temática, que por casualidade, se assimilam quanto aos seus processos embaraçosos. Quanto às possessões, garanto que não deixam a desejar os quadros apresentados em Diário de um Exorcista. As boas e já conhecidas cenas anteriormente já vistas até mesmo nos cinemas, também ganham vida e caráter quando escritas pelos 'caras'. Não que sejam descrições tão incomuns assim, mas sancionam realmente. ''Paula cravou as unhas nos ombros do marido que gritou de dor... uivou como um lobo... Com a cabeça erguida como um animal que clama pela Lua, Paula exibiu, em seu pescoço, o mesmo nome que gritou, escrito com arranhões feitos por la mesma... / ... Em gargalhadas e ganidos, Lúcia abriu os braços e começou a flutuar coma cabeça caída e os olhos brancos. Em seguida, virou a cabeça para baixo e passou a gemer.''
O capítulo de minha preferência é intitulado de 'Pedro e a cruz'. Nele, há indícios fortes da escuridão, solidão, perdição e sofrimento eterno em meio às profundezas do inferno. É um capítulo que sem dúvida pode ser lido separadamente e entendido sem problema algum como um conto de terror. Toda a simetria gótica e taciturna que envolve os mais bizarros momentos clássicos do gênero, se agrega na alma do leitor e o leva a ruminar sobre o fim, sobre a eternidade, sobre as entranhas do inferno e sobre a existência das divindades.
Num conjunto geral, em relação ao livro, tenho a agradecer a Editora Évora, que mais uma vez nos presenteia com uma publicação nacional extraordinária, e também aos autores, pela sensibilidade, talento e maestria em conduzir um enredo de assunto tão pesado, com a facilidade e entusiasmo que somente aqueles que amam as letras, conseguem. Saio dessa viagem, com a fé renovada e cheio de novos conhecimentos. Fica a dica para que os seguidores do Marcas Literárias possam conhecer também o filme 'Diário de um Exorcista - Zero' lançado pela Europa Filmes. Já pelo trailer é fácil imaginar que o que será exibido é mais que uma mera ficção, é literalmente uma obra de arte do terror nacional.
''O mundo agora se encontra na terceira onda de demônios a acessar a Terra. advindos das cidadelas infernais. Trabalham nas sombras e só se revelam após destruírem famílias. Dificultam ao máximo os exorcismos por só serem expulsos pela verdadeira fé. Muitas vezes caminham entre humanos por anos sem que ninguém saiba de sua presença. Infiltram-se em grupos militares, políticos e religiosos, sempre com projetos polêmicos que trarão confusão e morte...''
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