José Martino Escritor 18/07/2010Sobre Relíquias de Casa Velha de Machado de AssisOutra alegria que Machado de Assis teve em 1906, foi ver publicado o seu livro Relíquias de Casa Velha. Editado pela Livraria Garnier, foi posto à venda no mês de fevereiro e reunia trabalhos antigos do escritor entre poesia, contos, ensaios e peças teatrais. Depois que Carolina falecera, Joaquim Maria pouco produziu e praticamente ausentou-se dos jornais, escrevendo apenas no Almanaque Brasileiro Garnier. Isto explica em parte o motivo pelo qual ele não recolhera nas Relíquias de Casa Velha textos novos, com exceção do Soneto a Carolina. Na advertência do livro, procurava explicar o título que lhe dera:
“Uma casa tem muita vez as suas relíquias, lembranças de um dia ou de outro, da tristeza que passou, da felicidade que se perdeu. Supõe que o dono pense em as arejar e expor para teu e meu desenfado. Nem todas serão interessantes, não raras serão aborrecidas, mas, se o dono tiver cuidado, pode extrair uma dúzia delas que mereçam sair cá fora.
Chama-lhe à minha vida uma casa, dá o nome de relíquias aos inéditos e impressos que aí vão, idéias, histórias, críticas, diálogos, e verás explicados o livro e o título. Possivelmente não terão a mesma suposta fortuna daquela dúzia de outras, nem todas valerão à pena de sair cá fora. Depende da tua impressão, leitor amigo, como dependerá de ti a absolvição da má escolha.”
O livro abre-se com o famoso poema dedicado a Carolina. De inspiração camoniana, alguém já disse que através dele Machado chorou à esposa em estilo quinhentista. Seja como for, a crítica considera este soneto como um dos mais perfeitos escrito pela pena do poeta. Mário de Alencar, em carta a Machado de Assis datada de 26 de fevereiro de 1906, exprimiu o seu encantamento pelo livro e, sobretudo, por este comovente soneto. Chega mesmo a colocar seu mestre acima de Camões:
“Gostei muito de todas as Relíquias, muito e muito, mas a página melhor é o soneto “A Carolina”. Lembra-se do que me disse uma vez a respeito de “Alma minha gentil que te partiste?” que tinha a simplicidade sublime de um recado mandado ao céu. É o que eu compreendo e sinto melhor que ao outro. Li-o, reli-o e o tenho de cor.”
O livro foi um grande sucesso de vendas, tanto que no mesmo ano de 1906, saiu uma segunda edição, praticamente idêntica à primeira. A única diferença está no colofão, junto ao índice, onde consta que a primeira edição fora impressa em outubro de 1905 e a segunda em fevereiro de 1906. Além do soneto “A Carolina”, o livro reunia os seguintes trabalhos de Machado: os contos “Pai contra mãe”, “Maria Cora”, “Marcha Fúnebre”, “Um capitão de voluntários”, “Suje-se gordo”, “Umas férias”, “Evolução”, “Pílades e Orestes”, “Anedota do cabriolé”; algumas páginas críticas e comemorativas como “Gonçalves Dias”, “Um livro”, “Eduardo Prado”, “Antônio José” e as comédias “Não consultes médico” e “Lição de botânica”.
Também este livro não recebeu muita atenção por parte da imprensa. A primeira resenha crítica apareceu a 23 e 24 de fevereiro de 1906 em A Notícia, trazendo o pseudônimo de J. dos Santos (Medeiros e Albuquerque). Dizia que o lançamento de um livro de Machado era sempre uma festa para a literatura nacional. Depois, afirmava que o livro era composto por relíquias não muito velhas, uma vez que o estilo já pertencia à fase decisiva do escritor. Resumia dois contos, que lhe pareceram superiores aos demais: “Pai contra mãe” e “Maria Cora”. Finalmente, abordava de passagem as comédias, alegando que se tratavam de fantasias engraçadas, que se prestavam mais à leitura do que à encenação.
A 14 de março daquele ano, era a vez de Leopoldo de Freitas dedicar uma crítica elogiosa a Joaquim Maria. Publicada no Diário Popular de São Paulo, o articulista dizia que o escritor reunira “lindas relíquias”, as quais não faltavam “vigor nem espirituosa beleza”. Um terceiro artigo crítico saiu na revista Os Anais, dirigida por Domingos Olímpio, que havia sido derrotado no ano anterior para ocupar a vaga de José do Patrocínio na Academia Brasileira de Letras. O trabalho, que apareceu a 15 de março de 1906, era assinado com o pseudônimo de Nunes Vidal, e encobria o nome de Nestor Vítor. A crítica, também simpática ao livro e ao escritor, começava por filiar Machado ao “humor inglês”, embora contestasse que este estivesse presente em suas últimas obras. Dizia que o livro refletia uma “leve ironia”, um dos hábitos do autor. Concordava que havia trabalhos de primeira ordem, como a “Anedota do cabriolé” e “Maria Cora”, que ele julgava um conto muito arguto e de “boa psicologia, muito humano e, no fundo, muito simpático, muito emocional”. Fecha sua crítica, citando as duas comédias, que “parecem terem sido feitas principalmente para salão e com o fim de agradar mais as moças, acabando uma e outra em casamento”.
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Do Livro MEMORIAL DO BRUXO - CONHECENDO MACHADO DE ASSIS
do escritor José Antonio Martino
Maiores informações sobre este livro aqui no Skoob
ou no blog http://machadodeassis-memorialdobruxo.blogspot.com