Meridiano de sangue

Meridiano de sangue Cormac McCarthy




Resenhas - Meridiano de Sangue


147 encontrados | exibindo 16 a 31
2 | 3 | 4 | 5 | 6 | 7 | 8 |


LaAs183 30/04/2022

"A lei moral é uma invenção da humanidade para destituir de seus direitos os fortes em favor dos fracos."
Tive muita dificuldade de imersão na história, muitas vezes me senti perdida devido a densidade e pelo estilo de escrita do autor. Mas consigo compreender mesmo assim a grandiosidade e relevância desse livro e a quantidade de camadas que ele possuí. Um verdadeiro estudo da crueldade/brutalidade humana, retratado de forma explícita e visceral.
Ana Paula Hoffmann 31/05/2022minha estante
????




Douglas 09/12/2013

A loucura pode ser a maior verdade diante dos seus olhos, e você por ser racional demais, deva ser o louco.

Foi exatamente o que aprendi com esse livro, a maneira como se conduz o leitor beirando a mais dura verdade, dura como as rochas do deserto. A verdade ali exposta, o calor a fome e a sede que esses cavaleiros caçadores de escalpos encontram no deserto é quase nada, diante da bruta realidade e da naturalidade da morte diante de seus olhos. Assim como uma fogueira deve se apagar para continuar a jornada, uma vida pode ser tirada para o mesmo. McCarthy acredito que seja um gênio, um pensador como poucos, acredito que o juiz Holden se pareça com ele, ou melhor, que Carty seja muito mais, que Holden seja um pouco de Carty.
A maneira como é exposto os pensamentos de um jeito pouco imaginado sobre o que é a realidade diante de brutos homens que só sabem fazer o seu dever de sobrevivência, um pouco leigos, existe esse contraste do natural e do estranho, do louco e dos "normais" e esse conflito tão gritante no livro. A jornada é dura para os viajantes mas para o leitor também, mas ao mesmo tempo o dever que McCarthy tem de passar o sofrimento desses caçadores diante da mais bruta e impiedosa realidade seja tão forte que isso doa um pouco a quem lê, e a violência subestima a aceitação e talvez a sua aceitação lhe subestime.

Eu que sou ainda mero leitor, não pude enxergar a genialidade por trás disso, esse livro talvez eu devesse lê-lo novamente daqui há alguns anos, não tenho poder em carga literária suficiente para tanto, mesmo sabendo que um escritor como Carthy seja raro ou talvez extinto nos dias de hoje.
Hernani 06/04/2018minha estante
tem razão, revisite ele no futuro... porque 3 estrelas é a coisa mais injusta que se pode fazer com esse livro no skoob. se ajudar, procure uns textos de Harold Bloom sobre o livro, principalmente em Como e por que ler. vai entender diversas referencias que as vezes passam batidas... mas não deixe de relê-lo.




Angelo 29/06/2011

Vida e Morte, Bem e Mal
Cormac McCarthy disse certa vez que não conseguia gostar de autores que não escrevessem sobre os temas de vida e morte. Para ele, somente assim, consegue-se produzir um grande livro. Fiel à sua afirmação, Meridiano de Sangue é um livro sobre a vida e a morte, e também sobre o bem e o mal, juntando-se a uma lista de obras de tirar o fôlego que exploraram essa temática, como Coração das Trevas, Moby Dick e Grande Sertão: Veredas.

Em resumo, neste livro, acompanhamos a saga de um jovem, sem nome e referenciado apenas como 'kid', que se junta a um grupo de caçadores de escalpos em operação na fronteira entre Estados Unidos e México. Entre os vários personagens marcantes do grupo, sobressai a figura do Juiz Holden, um homem albino e sem pelos, de mais de 2 metros de altura, extremamente violento, mas também muito culto e cativante. Embora grande parte da crítica literária, enxerga, na sua criação, inspirações que McCarthy colheu do Capitão Ahab de Moby Dick ou do próprio Satan de Paraíso Perdido, recordou-me ele igualmente Kurtz de Coração das Trevas.

Muito já foi dito sobre o excesso de violência na história e sobre a dificuldade do estilo de escrita de McCarthy. De fato, o livro é extremamente violento; com certeza, o mais violento dos que já li. Também seu estilo seco, a falta de utilização de vírgulas e travessões e uma ambiguidade proposital tornam a leitura um pouco mais difícil, mas nada que se compare a um Faulkner por exemplo. Meridiano de Sangue é um livro que pode ser lido por praticamente todos os leitores adultos com o mínimo de bagagem literária.

Outro aspecto do livro que pode causar alguma exasperação no leitor é a aparente ausência de uma trama ou argumento pelo qual a história pudesse evoluir. Durante a maior parte do livro, acompanhamos os principais personagens, membros de um grupo de caçadores de escalpos, em sua jornada pelo oeste americano e norte do México, enquanto atacam agrupamentos indígenas e mexicanos, cavalgam, acampam, embebedam-se, voltam a galopar... Ao leitor mais desatento, pode parecer que não há um objetivo ou "ponto" em todo o enredo.

Parece-me, contudo, que onde o livro realmente se mostra é nos detalhes da história, todos recheados de significados mais profundos esperando para serem descobertos. Há claras e obscuras referências à Bíblia, a Moby Dick, a Paraíso Perdido e a várias outras obras de literatura.

Por fim, para aqueles com algum conhecimento de inglês, recomendo duas 'lectures' disponíveis gratuitamente no youtube sobre a obra, e partes de um curso sobre Literatura Americana da Universidade de Yale. Para achá-las, basta pesquisar no youtube pela expressão "Blood Meridian (engl 291)".
Douglas 26/09/2013minha estante
Que show de resenha




Mathias Vinícius 01/02/2024

Um comentário sobre: Meridiano de Sangue
Meridiano de Sangue é uma obra singular que mergulha de forma virtuosa na representação da violência, apresentando-a de maneira crua e visceral ao longo de toda a narrativa. Cormac McCarthy utiliza uma prosa descritiva e sensorial, que atrai o leitor e o transporta para o cenário árido e brutal do Velho Oeste americano.

Podemos dizer que McCarthy se propõe, para este livro, uma reinvenção da mitologia do Oeste americano, baseando-se nos dados históricos dos acontecimentos ocorridos na fronteira entre os EUA e o México no século XIX e envolvendo diversas populações indígenas, como os Apaches, Comanches, entre outros. A história acompanha um garoto sem nome, conhecido apenas como Kid, que é forçado a deixar o lar ainda na infância. Para sobreviver, ele ingressa na gangue brutal do capitão John Joel Glanton, ou simplesmente Glanton, uma companhia de mercenários que, a mando dos governantes locais, atravessa o deserto com a missão de matar o maior número possível de índios e trazer de volta seus escalpos. Glanton é acompanhado pelo juiz Holden, um personagem macabro que nunca dorme e anota em um caderno todas as suas observações cruéis.

Com uma forma única de persuadir o leitor a encarar de frente as feridas mundanas e a complexidade dos seres humanos para explorar temas como moralidade, justiça e redenção. A linguagem coloquial destaca-se na narrativa, enriquecendo os diálogos e guiando sutilmente o enredo autêntico. Além disso, o autor habilmente tece uma teia de simbolismos e metáforas, mergulhando nas profundezas da condição humana e das interações entre os personagens, cujas trajetórias são entrelaçadas em um contexto brutal e implacável, com diversas alusões às passagens bíblicas que adicionam uma camada extra ao texto. Essas referências provocam uma reflexão sobre temas como fé, destino e a natureza do bem e do mal. A escrita imersiva e envolvente convida o leitor a refletir sobre a natureza da violência e da sobrevivência, confrontando-os com nuances sombrias e dilemas morais. Os ditos portentosos presentes na obra contribuem para a atmosfera densa e filosófica do livro, incentivando o leitor a mergulhar mais fundo na complexidade dos temas abordados. "Meridiano de Sangue" é uma leitura desafiadora e profundamente impactante, convidando o leitor a refletir sobre a condição humana e a natureza da violência de forma visceral e inesquecível.

Gostaria de deixar um trecho para instigar a leitura daqueles que ainda pensam em lê-lo:

"O que isso quer dizer, velho?

Cruzem aquele rio com seu exército de flibusteiros e não vão cruzar de volta.

Ninguém quer cruzar de volta. [...] E desde quando isso é da sua conta, velho? O menonita fita as trevas ensombrecidas perante os homens conforme lhe são refletidas no espelho acima do balcão. Vira-se para eles. Seus olhos estão úmidos, fala vagarosamente. A ira de Deus está adormecida. Ficou escondida um milhão de anos antes dos homens e só os homens têm o poder de despertá-la. O inferno não encheu nem a metade. Escutem o que estou falando. Vão levar a guerra criada por um louco a uma terra estrangeira. Vão acordar bem mais que os cães." (Pag.46)

Meridiano de Sangue é uma leitura desafiadora e profundamente impactante, que convida o leitor a refletir sobre a condição filosófica humana e a natureza da violência de forma visceral e inesquecível.
AndrAa58 08/02/2024minha estante
???? parabéns pela resenha. Se não estivesse lendo agora, começaria nesse momento ?




arqueofarias 26/02/2023

Um livro bem difícil de terminar pra mim. Apesar de eu entender o porquê de ser um clássico e a importância da temática da narrativa - o extermínio de grupos originários nos EUA - , a história em si não me prendeu. Eu senti que estava andando em círculos- assim como a travessia dos personagens kkkkk - e não acontecia muita coisa. Me parecia uma repetição de eventos.
Me lembrou muito grande sertao veredas, inclusive - que eu acho muito bom, apesar de eu ainda não o ter finalizado.
Enfim, não funcionou pra mim. Mas é um livro muito importante e necessário para o entendimento desse contexto de devassamento na história norteamericana.
Krishna.Nunes 14/08/2023minha estante
Acontece que se você achou que ele é um livro sobre o extermínio de populações originárias nos EUA, você não entendeu o livro. Esse é apenas o cenário. O livro poderia se passar em qualquer cenário de brutalidade e violência, seja ele medieval ou de guerra, sem perder sua essência.
Meridiano de sangue faz enormes referências a Paraíso perdido, A divina comédia, Fausto e principalmente à Bíblia. Tudo isso delimita nele um contexto filosófico que, se você já não conhece previamente, dificilmente apreciará as nuances do romance. Aí só sobrará violência gratuita e repetição de cenas sem propósito.




Campos 06/08/2023

Não é para mim
Sei que muita gente gosta do autor, mas para mim não funcionou. Um texto arrastado, com falas enormes, e cenas de crueldade com animais sem sentido algum, sei que fazem parte de um contexto histórico. Mas para mim nada funcionou
Krishna.Nunes 14/08/2023minha estante
Meridiano de sangue faz enormes referências a Paraíso perdido, A divina comédia, Fausto e principalmente à Bíblia. Tudo isso delimita nele um contexto filosófico que, se você já não conhece previamente, dificilmente apreciará as nuances do romance. Aí só sobrará violência gratuita, como você mesmo disse.




Carlos_Pena 09/01/2014

Um dos melhores livro q li
Mas um grande trabalhado foi o do tradutor;
comentários(0)comente



Newton Nitro 15/07/2013

O Realismo Brutal do Velho Oeste!
Blood Meridian é um anti-western, um gênero de literatura americana do velho oeste, criado a partir dos anos 60, que questiona o romantismo e os ideias dos romances clássicos de bangue-bangue optando pelo realismo para mostrar a brutalidade e a realidade desse período. Blood Merdian é um dos melhores (se não o melhor) exemplo desse tipo de literatura.

200px-CormacMcCarthy_BloodMeridian

Escrito pelo Cormac McCarthy (o mesmo escritor de “A Estrada” e “No Country for Old Man”, que viraram filmes muito inferiores aos originais) e publicado em 1985, Blood Meridian contra a história de um adolescente, chamado apenas de “the kid” e suas experiências com a brutal gangue de Glanton, um grupo histórico de caçadores de escalpo que aterrorizaram e massacraram índios e mexicanos nas fronteiras entre os Estados Unidos e o México, nos anos de 1849 a 1850. O romance foi considerado pela revista Time um dos 100 melhores livros de língua inglesa entre 1923 a 2005.

Blood-Meridian-by-Sean-Lewis

Um dos principais temas do livro é a natureza guerreira do homem, a inescapável força que leva o homem a viver em um estado de perpétua guerra. Esse é um dos livros mais violentos que já li, mas a violência é parte da descrição realista do período. Cormac foi corajoso ao expor esse período da história americana, questionando as próprias bases da “ética do cowboy”, presente até hoje. Gostaria muito de ler romances revisionistas como esse sobre a história do Brasil, que é tão sangrenta quanto a norte-americana.

glanton

O livro também fala sobre a brutalidade e a violência gerada pelo avanço da civilização nas áreas selvagens, contrastando a visão de mundo contemporânea com as tradicionais. Um dos personagens, o Judge, parece ser a encarnar o espírito materialista,racional e científico do século vinte, de uma maneira brutal e sem nenhum traço de humanismo

O Juiz!
O Juiz!
O estilo de Cormac é uma arte em si. Usando de maneira maestral um narrador onisciente, seu estilo é seco mas ao mesmo tempo lírico,especialmente na descrição de paisagens. O livro tem característics cinematográficas, não existe mergulho na mente dos personagens, os eventos são mostrados por fora, como em um filme. Os personagens revelam suas personalidades através de suas ações.



O livro possui muitas cenas fortes, com todo o tipo de brutalidade e violência imaginável. O velho oeste de Cormac parece uma terra pós-apocalíptica, ecoando os mesmos cenários do The Road (este sim pós-apocalíptico). A degeneração do oeste selvagem a partir do contato das tribos com a civilização europeia é impressionante e ficou de fora dos tradicionais filmes do velho oeste. E como esse imaginário faz parte da alma americana, fica mais fácil de entender o belicismo americano ao ver como foi a colonização do país.



Esse é um livro fenomenal, fantástico e que merece várias leituras. A crueldade e a frieza dos personagens contextualizam as cenas de violência de uma maneira que impressiona.



Fica a recomendação!
comentários(0)comente



Pedro 12/04/2018

Na árida fronteira entre Estados Unidos e México, um jovem é recrutado por mercenários contratados pelo governo para exterminar o maior número possível de índios. Ao perseguir os temidos apaches, a gangue de colecionadores de escalpos aos poucos se desvia do propósito original da expedição, e o grupo se vê perdido entre desconfianças, intrigas e carnificinas. Neste sanguinário faroeste de Cormac McCarthy, a fundação de um país surge entre os delírios de grandeza e a ambição desmedida de homens sem honra, para os quais a violência prescinde de justificativa. Com uma linguagem dura e personagens inesquecíveis, McCarthy mostra as entranhas da História, na qual civilização e barbárie se confundem, e sua descrição da brutalidade nos espanta por detalhar uma violência que até hoje não pode ser inteiramente compreendida.
comentários(0)comente



Toni Nando 28/04/2018

Cruel
Livro muito forte, recheado de horrores, mas com um enredo sensacional. Vale a pena
comentários(0)comente



Willian.Silva 16/11/2024

A guerra, a santidade e a supremacia do homem
A ditadura do judiciário, a tirania dos justos se arborizam diante dos espectros tangenciados por direções equilateras ao mesmo tempo distintas ante a uma persona dantesca funcionando como uma lanterna "as avesas" objetivicadora sobre a humanidade.
comentários(0)comente



Nilza Russo 03/07/2019

Violento, mas valioso
Acabei a leitura de Meridiano de Sangue, do McCormac.
Foi muito difícil. Houve momentos em que eu quis abandonar a leitura.
É o livro mais violento que eu já li na vida.
Não dá para gostar de ter lido este livro. Não é um livro gostável. Como poderia?
Mas concluir a leitura dá um gosto de pequena batalha vencida. Ganha-se uma chave para refletir muitas questões e, de quebra, observa-se com perplexidade uma das personagens mais intrigantes da literatura recente: o aterrorizante juiz Holden.
Embora pareça aventuresco, o ritmo é lento, assim como é lenta a jornada das personagens a cavalo no deserto inóspito, em meio à carestia e violência extrema, um estado de guerra, na oeste americano do século XIX.
Não é um livro de redenção, as descrições são realistas e chocantes (com linguagem direta, porém não vulgar). Há momentos poéticos, ainda que enregelantes.
O livro já é um grande clássico norte-americano, sem sombra de dúvidas.
comentários(0)comente



phddelavia 16/02/2020

Sangue como suco
Jamais imaginei que leria uma carnificina
tão gigantesca e cruel. É muita maldade banalizada num livro só, não no sentido ruim, veja bem. É de fato um livro carregado de péssimas sensações, mas lindamente bem escrito. Preciso reler esse livro para entender tudo que há por trás do que está explícito. Vale a leitura, mas cuidado, o sangue jorra das páginas.
comentários(0)comente



Magasoares 27/03/2020

Sangrento
Uma verdadeira estória de faroeste, com muito sangue... e bota sangue nisso!!! Acho que nunca tinha lido um livro com pessoas tão sanguinárias e más.
comentários(0)comente



Leonardo 04/07/2011

Literatura é uma arte
Disponível em: http://catalisecritica.wordpress.com

Desde que li “Como e Por Que Ler”, do crítico literário Harold Bloom, aguardava com ansiedade o momento de ler Meridiano de Sangue, de Cormac McCarthy. O crítico aponta a obra como uma das maiores do século XX, uma verdadeira obra de arte. Como falei em um dos meus primeiros posts no blog, não gosto de começar a ler um autor pela sua mais aclamada obra. Assim, acabei comprando “A Estrada” e posteriormente “Onde os velhos não têm vez”. Conscientemente comecei a criar uma aura de expectativa em torno de Blood Meridian. Agora, que estou finalmente lendo, posso afirmar que não houve qualquer frustração. Além do encantamento natural com o que esse americano escreve (não foi diferente com os outros dois livros), descobri algo que deveria ser óbvio para mim: a escrever é uma arte!

Mas isso é mais do que óbvio! É tremendóbvio! Entretanto… Explico:

Um dos meus grandes sonhos é escrever bem algum dia. Não sei se conseguirei. Mas é uma meta, trabalharei para isso. Eu me desanimava enormemente, todavia, quando lia algum texto genial, como algumas passagens indescritíveis e mágicas de Faulkner, de Santo Agostinho ou do próprio McCarthy, apenas para citar exemplos de autores que li bem recentemente. ”É um dom”, eu pensava, e como tal, você nasce com ele ou nasce sem ele. Não se ganha depois de crescido. No máximo, se eu não tenho esse dom, posso desenvolver bem a técnica da escrita, adquirir bagagem com muita leitura e escrever bem, ou até mesmo MUITO BEM. Mas escrever essas coisas que esses gênios escrevem… Jamais.

Até que comecei a ler Meridiano de Sangue à luz da crítica de Harold Bloom. Vejam abaixo algumas passagens emblemáticas do romance:

- Descrevendo o ambiente do deserto, ameaçado por uma tempestade:

“Ao longe pequenos arquipélagos escuros de nuvem e o vasto mundo de areia e arbustos abreviado ao mergulhar no vazio sem margens acima onde aquelas ilhas azuis estremeciam e a terra ficava incerta, gravemente adernada e fixava o curso através dos matizes de rosa e das trevas, além da aurora rumo à mais remota chanfradura do espaço.” (uh?)

- Advertência de um velho religioso:

“A ira de Deus está adormecida. Ficou escondida um milhão de anos antes dos homens e só os homens têm o poder de despertá-la. O inferno não encheu nem a metade. Escutem o que estou falando. Vão levar a guerra criada por um louco a uma terra estrangeira. Vão acordar bem mais que os cães.”

- Quando kid, o protagonista, está de saída de sua terra natal:

“Só agora a criança se despe enfim de tudo que foi. Suas origens tornam-se remotas como seu destino e nunca mais outra vez por mais voltas que o mundo dê haverá plagas tão selvagens e bárbaras a ponto de pôr à prova se a matéria da criação pode ser moldada à vontade do homem ou se o seu próprio coração não é uma argila de outro tipo.”

Lendo esse tipo de construção entendi que a literatura é uma arte. Não há dom que faça uma pessoa sentar e escrever aquilo que está na primeira citação, sobre o deserto. De jeito nenhum. E aí entendi, ao comparar com outras artes. Um pintor pode desenhar um rosto perfeitamente, mas seu trabalho só vai se tornar imortal, ele só vai ser reconhecido como um gênio à medida que ele trouxer personalidade à sua obra, quando ele encher seu desenho, mesmo um rosto somente, de significados. Lembrei da análise que já vi do quadro de Rembrandt, “A volta do filho pródigo”. Cada detalhe abre margem para interpretações diversas. É uma mãe mais fina que a outra, é a sandália de lado, a cabeça raspada, o olhar do pai, enfim: Rembrandt não pegou o seu dom e disse: vou pintar um velho abraçado a seu filho. Ele pensou nessa imagem e parou, refletiu, calculou, mediu; teve trabalho, investiu tempo, lapidou a sua obra e fez dela uma obra-prima.

Da mesma forma um escultor: ele não tem que só ter o dom de transformar a pedra bruta em algo belo. Antes ele imagina e constrói, em sua mente, a imagem do que ele vai construir. Pensa cada detalhe, cada lasca de pedra tirada tem um porquê.

Vendo as frases que citei, tenho a mesma impressão: o velho McCarthy não tem um “insight” gigantesco, senta, e escreve tudo aquilo. Não se trata também, é óbvio, de simplesmente escolher palavras difíceis (chanfradura, adernadas, plagas) e sair distribuindo-as ao longo do texto. Percebe-se uma sonoridade, uma beleza plástica. Ele pinta, esculpe as frases, e assim, constrói o romance. Tudo é pensado, cada palavra, cada vírgula omitida, cada palavra diferente, tudo isso faz com que o romance não apenas conte uma história, mas tenha um ritmo durante a leitura, uma poesia, uma graça especial.

Literatura é uma arte. Obrigado, Cormac McCarthy!
comentários(0)comente



147 encontrados | exibindo 16 a 31
2 | 3 | 4 | 5 | 6 | 7 | 8 |


Utilizamos cookies e tecnologia para aprimorar sua experiência de navegação de acordo com a Política de Privacidade. ACEITAR