spoiler visualizarIgor_Resenha 19/11/2023
Um livro para jovens entenderem a vida adulta
Nunca ouvi falar do autor ou do título, contudo fui obrigado a compra-lo. Dentre todos os livros, sua capa era a única que parecia uma obra de arte que deveria estar em alguma caserna. Dois militares montados (sem expressão facial) com os rostos voltados ao deserto (amarelo e monótono) sem se distanciarem da fortificação. A arte era um resumo perfeito do livro. Minha ignorância foi então remediada, passei a conhecer Dino Buzzati e O Deserto Dos Tártaros... e não só isso, passei também a recomenda-los
Na minha opinião há livros de momento, que outras pessoas que não estão naquele momento ou estado emocional podem até ler e gostar, mas que a verdadeira explosão mental só vem para pessoas que estão naquela faze. Então, se você é um jovem adulto não deixe de ler este livro....ele vai te fazer amadurecer e entender um pouco mais da vida em 170 páginas. Digo isso com conhecimento de causa, muitas vezes senti o que Giovanni Drogo sentiu durante sua jornada, mas não tinha ninguém para conversar com medo de ser julgado. A vida adulta tem outro sabor, tem outro ritmo etc. Cabe a você saber aproveitar ou desperdiçar essa fase que passa rápido.
Acompanhamos Drogo se despedindo de sua antiga vida, da família e da sua casa – aqui o personagem já experimenta um sentimento diferente na partida que não sentia enquanto sonhava com este momento, o triunfo deu lugar tristeza. Agora é um oficial formado pela Academia Militar e deve se apresentar no forte Bastiani, onde foi designado a servir. Ninguém conhece o tal forte. Aos poucos vamos descobrindo que é uma fortificação muito antiga, de pouca importância militar e isolada (sem belas mulheres e sem diversão alguma) .... a última fronteira. Giovanni, apesar da camaradagem do Capitão Ortiz, passa a não querer ficar nesse fim de mundo e pede ajuda ao Major Matti. No final, decidem juntos que Drogo vai ficar quatro meses no forte até o próximo exame médico, o qual iria lhe reder a baixa do serviço sem afetar sua carreira militar.
A rotina no forte começa e Drogo entra no ritmo do forte. Os ajudantes do alfaiate (Prosdocimo) avisa que deve ter cuidado para não ser contagiado pelo forte e ficar ali a vida toda – como muitos militares. O mito do levante dos Tártaros consumia muitos ali. Algo que ocorria desde o Coronel Filimore que cunhou tal mito e atribuiu uma importância ao Forte Bastiani uma relevância que só existia na sua cabeça.
Após quatro meses, o médico aparece... já ciente da situação de Giovanni, mas algo no oficial mudou. Ele desiste de desistir. Nesse momento, todos o parabenizam pela decisão e inflando seu ego. A rotina retoma no forte.
Após alguns anos é avistado um cavalo negro no deserto. Esse acontecimento levanta suspeitas e boatos e culmina na morte de um jovem soldado (Lazzari). Contudo nada acontece. O tempo passa e traz certa novidade consigo. Um grupo de soldados é avistado vindo do Norte. Seriam os Tártaros? Haveria guerra? O comunicado da Vossa Excelência diz o contrário, são apenas militares dos Estados do Norte em uma patrulha de reconhecimento e demarcação das fronteiras. Contudo, urge que os militares do forte conquistem o topo de uma das montanhas para assegurar vantagem militar sobre os estrangeiros. A jornada é intensa, por fim, os estrangeiros chegam primeiro ao cume. Mas, para o oficial Angustina, aquele é o grande momento, em que heróis podem surgir e morrer como mártir. Assim, Angustina já exausto pela atividade de subir a montanha sem equipamentos adequados se entrega ao frio e morre.
Já cumprido quatro anos no forte, Drogo pede férias para voltar a cidade e descansar. Em sua cidade tudo mudou, seus amigos estão em trabalhos importantes e estão sem tempo para conversar. Sua casa não lhe transmite a mesma sensação de aconchego, mesmo que seu quarto esteja do mesmo jeito que havia deixado. Nem a relação com a sua mãe é a mesma. Nem a mulher com que pretendia casar desperta os mesmos sentimentos de antes. Drogo experimenta uma sensação de descolamento da sociedade e do cotidiano da cidade. Sua única realidade é forte. Sua sociedade é formada pelos colegas do forte. Apesar disso, Giovanni até tenta falar com o general para ser transferido para algum regimento da cidade. Mas, descobre que nem tudo era o que parecia, o forte, de acordo com o novo regulamento, deveria passar por um corte de pessoal e muitos oficiais já haviam feito pedidos de transferência. Ou seja, Drogo havia sido enganado todos esses anos...todos ali sabiam que o forte seria reduzido, mas precisavam de jovens oficiais para manter a estrutura mínima. E os Tártaros eram usados como mitos para fisgar o ego dos jovens militares – fazer parte de algo maior....de algo importante é o sonho de todos.
Ao voltar ao forte percebe o corte de pessoal e as despedidas dos oficias se tornam um evento cada vez mais comum. Contudo, há uma novidade no horizonte, um ponto no deserto chama a atenção de Simeoni. Será que os estrangeiros do Norte estariam construindo uma estrada para facilitar o deslocamento de tropas e o ataque ao forte? Logo os boatos são silenciados. Nada ocorre durante muitos anos. A estrada é construída e concluída diante dos olhos do forte. O forte já não é mais o mesmo após mais de 15 anos (nem Drogo). Após todo este tempo, Giovanni está velho, magro e doente. Quando Vossa Alteza manda reforços para o forte e o ataque parece iminente.... Drogo é convidado/chutado do forte para dar espaço a gente nova, mesmo sendo o segundo em comando. Toda sua vida esperando por aquele momento e nada. É tratado como um moribundo oficial....sem o menor respeito pela sua história de vida e tudo que já fez pelo forte. No final, Drogo morre sozinho em um lugar desconhecido, mas como herói da sua própria história.
“o tempo passou tão veloz que a alma não conseguiu envelhecer”