spoiler visualizarLuiza 16/05/2013
Quem foi Merlin?
A SAGA DO MAIOR MAGO DA HISTÓRIA CONTADA POR ELE MESMO
"O feiticeiro de contos de fadas, o mago de túnica preta, chapéu pontudo e vara de condão? Ou um rei e profeta das velhas lendas da Bretanha e de Gales? Com toda vivacidade, o colorido e a clareza da ficção moderna, Mary Stewart revive em A CAVERNA DE CRISTAL o mito desse personagem fantástico. Do ponto de vista do próprio Merlin, ficamos sabendo como esse homem, acusado de ser filho do Príncipe das Trevas, condenado à morte como descendente do Demônio, tornou-se guardião do Rei Artur e o arquiteto-mor de sua Bretanha unida."
Após a leitura da encantadora série AS BRUMAS DE AVALON, de Marion Zimmer Bradley, emendei na trilogia escrita por Mary Stewart e narrada por Merlin: A CAVERNA DE CRISTAL ("A original e inigualável recriação do mito de Merlin na Inglaterra medieval do Rei Artur").
"A CAVERNA DE CRISTAL" É O PRIMEIRO VOLUME DA "TRILOGIA DE MERLIN", SEGUIDO DE "AS COLINAS OCAS" E "O ÚLTIMO ENCANTAMENTO".
A história e o ritmo da narrativa são bem diferentes de "As Brumas...", e demorei um pouco para entrar no "clima" do livro (a autora descreve as "cenas" com muitos detalhes e, às vezes, me dispersei, tendo que reler algumas passagens com descrições minuciosas). Mas Mary Stewart escreve bem e adoro tudo sobre o Ciclo Arturiano, por isso acabei curtindo o romance.
Tudo começa na infância de Merlin, quando ele ainda é um bastardo sem importância e é mal tratado por seu tio e avô. Sua mãe negava-se a contar de quem ele é filho e acaba, por fim, fechando-se no Convento de São Pedro...
Sem saber quem é seu pai, Merlin segue sua vida até encontrar-se, ainda garoto, com Galapas. É quando começa seu aprendizado como mago e "curandeiro", já que ele possui a Visão. Após muito aprendizado na gruta de Galapas (que é a tal Caverna de Cristal), chega o momento de sua fuga após a morte de seu avô, rei daquela região.
A fuga desemboca no seu afortunado encontro com Ambrosius que, como ele irá descobrir depois, é seu pai. Merlin torna-se, então, protegido do Grande Rei (seu pai) e prossegue seus estudos, também acompanhando-o em diversas batalhas, enquanto o Grande Rei procura unificar a Bretanha. Merlin não participa das batalhas como guerreiro, mas impunha confiança às tropas de Ambrosius, pois era conhecido por ser um sábio, um mago, alguém com poderes.
Merlin realiza várias façanhas de engenharia e cura, tanto para Vortigern (antes deste morrer) quanto para Ambrosius, o que lhe rende a fama de "Profeta".
Após a morte de Ambrosius, o irmão do Rei (Uther Pendragon) conhece Ygraine e desespera-se de paixão por ela. A história segue somente até o momento em que Uther, já coroado como Grande Rei no lugar do irmão falecido, acata e obedece aos planos de Merlin para encontrar-se com Ygraine (que também o deseja) em Tintagel.
Porém, ao final do encontro dos amantes, Uther parte de Tintagel insatisfeito pois, durante seu encontro com Ygraine, fica sabendo da morte do Duque Gorlois (o marido traído). Por causa dessa "coincidência" (o encontro dos amantes ocorrendo no mesmo momento da morte do duque), Uther rompe relações com Merlin acusando-o de "usar" as pessoas egoisticamente e de ser um "falso profeta", pois ele, como mago, deveria ter previsto a morte de Gorlois, evitando, assim, outras mortes desnecessárias e evitando também o perigoso encontro furtivo - que acabou gerando um bastardo. Ou seja: já que Ygraine desejava Uther igualmente, o encontro furtivo também fora desnecessário, pois Gorlois morrera em batalha e os apaixonados poderiam ter ficado juntos sem traição, gerando um filho legítimo, herdeiro do trono, e não um bastardo, que Uther, em meio à sua revolta, diz que não irá reconhecer...
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No livro, li uma passagem sobre o deus Mitra. Nunca havia lido nada a respeito desse deus, cujo culto pagão serviu de base, junto com outros cultos, para a construção da divindade de Cristo da Igreja Primitiva. Realmente, há muitas semelhança entre os dois, como nesta passagem da página 163:
"Eu vira o deus dos soldados, o Verbo, a Luz, o Bom Pastor, o mediador entre Deus e os homens. Eu vira Mitra, que saíra da Ásia, mil anos antes. Ambrosius contou que ele nascera numa caverna, em pleno inverno, sob o olhar dos pastores e o brilho de uma estrela. Nascera da terra e da luz e saltara da rocha com uma faça na mão direita e uma tocha na esquerda. Matara o touro para dar vida e fertilidade à terra com o sangue derramado e então, depois de uma última refeição de pão e vinho, fora arrebatado ao céu. Era o deus da força e da bondade, da coragem e do autocontrole. O deus dos soldados." *(Merlin, narrando as palavras do conde Ambrosius sobre o culto que ele, Merlin, havia testemunhado no dia de sua chegada à Bretanha Menor, domínio de Ambrosius, irmão mais velho de Uther, pg. 163).
Transcrevi outros trechos de gostei muito:
"Penso que só existe um [Deus]. Claro, existem deuses por toda parte: nas colinas ocas, no vento e no mar, na grama sobre a qual andamos, no ar que respiramos e nas sombras manchadas de sangue onde os homens esperam por eles para adorá-los. Mas acredito que existe um que é o próprio Deus, como um grande mar para onde nós, deuses menores, homens e todo o resto, corremos como rios. Todos chegaremos a Ele, no fim." (Merlin, conversando com seu escravo Cadal, pg. 207)
"Tenho notado que é isso o que geralmente acontece com homens que passam a vida caminhando na direção da luz distante de um farol muito alto. Quando alcançam o topo e não há mais para onde subir, só lhes resta alimentar a chama do farol, para que não se apague, sentar-se e envelhecer. O sangue pulsante que os aquecia torna-se inútil, pois existe o calor do fogo do farol." (A Caverna de Cristal, Mary Stewart, pg. 362)
"Tenho notado que é isso o que geralmente acontece com homens que passam a vida caminhando na direção da luz distante de um farol muito alto. Quando alcançam o topo e não há mais para onde subir, só lhes resta alimentar a chama do farol, para que não se apague, sentar-se e envelhecer. O sangue pulsante que os aquecia torna-se inútil, pois existe o calor do fogo do farol." (A Caverna de Cristal, Mary Stewart, pg. 362)
"Eu nunca cessaria de me espantar com as mulheres. Mesmo quem tem o poder não consegue ler-lhes o pensamento. Duquesas e meretrizes são iguais num ponto: não precisam de estudo para enganar. Penso que são dotadas do mesmo instinto dos escravos que vivem com medo, e de alguns animais que ser disfarçam para salvar a vida." (Merlin, observando Ygraine durante a coroação de Uther Pendragon, no livro "A Caverna de Cristal", de Mary Stewart, ambientado na Bretanha do Século V - p. 437)
Obs: achei muito interessante essa passagem do livro, onde Merlin observa a capacidade de Ygraine de "enganar". Infelizmente, é daí que vem essa idéia de que as mulheres são falsas... É fato que às mulheres mentem e enganam muito melhor do que os homens... Muitos homens, ainda hoje, se julgam espertos e enganadores... Mas as mulheres é que são infalíveis na arte da mentira e do disfarce... Mas não é devido a nenhuma falha de caráter, nem isso ocorre porque a mulher é de índole mais fraca do que o homem. A arte de mentir e dissimular é um aprendizado histórico: são anos e anos de perseguição, de tirania, violência, de vidas subjugadas, vidas vividas com medo da agressividade masculina - fosse na rua ou entre quatro paredes. Por isso Merlin fala sobre essa capacidade feminina de dissimular... e achei muito bonito o jeito que ele faz essa observação: mulheres agem como escravos que vivem com medo, ou como animais que se disfarçam para ser proteger. Está aí explicação. Tudo instinto natural de sobrevivência, meus caros..
"A estrela de Uther brilhava com tanta intensidade, ele era uma figura tão fascinante, que o povo de Londres o perdoaria, mesmo que ele estuprasse a esposa do amigo em público. Seria mais difícil perdoarem Ygraine por tê-lo rejeitado." (A Caverna de Cristal de Mary Stewart,.438)
Obs: neste trecho, fica bem claro a mentalidade da época. O estupro não era considerado crime. Já li em alguns livros, inclusive, que essa deferência e esse respeito enaltecedor dos cavaleiros para com as damas é pura fantasia dos romances de cavalaria: a verdade é que, não raro, eles estupravam sempre que tinham oportunidade ou quando sentiam um impulso incontrolável - e consideravam absolutamente natural, inerente à natureza do macho. Estupravam, às vezes, até mesmo em público, especialmente se se tratasse de mulheres humildes ou "da vida". Violavam sem escrúpulos. O homem medievo (e mesmo os de antes, claro), em muitas culturas, considerava-se o proprietário do corpo da mulher (alguma semelhança com os dias de hoje não é mera coincidência). Além disso, culpavam as mulheres de usarem feitiços que os incendiava internamente com desejos incontroláveis. Nada era "culpa" deles. A mulher era a "grande feiticeira" de modo geral, o veículo por onde fluíam os pecados do mundo...
"Se Uther entrar no castelo, deitar-se com Ygraine e depois for assassinado no leito, declaro diante de Deus, Cadal, que o fato terá tanta importância quanto uma gota dessa água espumante. Um rei nascerá dessa noite de amor e seu nome será um escudo para os homens, até que esta terra maravilhosa desapareça no mar que a sustenta e as pessoas a deixem para viver entre as estrelas. Acha que Uther é rei, Cadal? Não. É apenas um regente, servindo no lugar do que partiu antes dele e no lugar do que virá depois: o rei do passado e o do futuro. Esta noite ele é ainda menos do que isso. É apenas um instrumento e Ygraine a vasilha. E eu... sou um espírito, uma palavra, algo feito de ar e escuridão. Não posso evitar de fazer o que estou fazendo, assim como o junco não pode evitar que o vento de Deus o dobre. Você e eu, Cadal, somos indefesos como folhas mortas na água dessa enseada." (Merlin falando a Cadal, seu servo, no momento em que Uther se dirigia ao castelo de Tintagel para encontrar-se com Ygraine e concretizar a paixão de ambos, em "A Caverna de Cristal", de Mary Stewart, p. 445)
"Mitra, Apolo, Artur, Cristo... Pode chamá-lo como quiser. Faz diferença como os homens possam chamar a luz? Será sempre a mesma luz e os homens precisam dela para viver. Só sei que Deus é a fonte de toda a luz que já iluminou o mundo, que seus desígnios atravessam a terra e passam por todos nós como um grande rio, que não podemos parar, nem desviar. Só podemos beber dele, durante a vida, e a ele entregar nossos corpos, quando morrermos." (Merlin falando a Uther Pendragon, quando este deixa Tintagel, revoltado, sabendo que gerou um bastardo com a duquesa da Cornualha, Ygraine, no exato momento da morte de seu marido Gorlois - "A Cavera de Cristal", de Mary Stewart, p. 463)
OBS: Embora a maior parte das ilustrações retrate um Merlin idoso e de longas barbas brancas, neste livro tudo acontece com Merlin ainda jovem. Ele está na casa dos vinte anos quando Uther deixa o Castelo de Tintagel após seu encontro furtivo com Ygraine.