karlinismo 18/02/2020
"transbordei, não fiz senão extravasar-me"
Se tivesse eu vos conhecido pelas tempestuosas épocas de minha adolescência, não somente teria vos compreendido, mas feito-o par do meu coração sem companhias. ó Alvaro! ó Pessoa meu, tuas letras me tocam e violentam; cada uma, sem intervalos.
Nunca - nunca! - voltará minh'alma a deitar-se, em "beijada dor", em tão formosa poesia. Tu, Pessoa meu, só é privado da coroa da santidade, pois, dos homens todos comuns, que transitam de um vazio para outro inda mais abismal, só em ti fora concebida a violenta e obscena flor da íntima poesia. Poesia!... que todos bradem esta arte furiosa que vulnera os corações. Fizeste tu, Pessoa meu, dos versos tuas veias e da tinta teu sangue. Encerraste-te nos braços mármores desta antiquíssima senhora, dando-lhe-a tua própria carne e ossos, e assim fundindo-se num Só. Digo eu: tua Poesia! Só tua, Pessoa meu. Absolutamente todos perderam seus encantos ao primeiro compôr teu.
Doloroso homem que tem a inspiração movida pela podridão das chagas. ó sim, todas as feridas decompostas de toda terra pisoteada por homens de mãos sujas e almas soturnas! Estas desabrigadas dores encontraram, por um momento, em vós um lugar. Foste o corte e a faca, o objeto e o membro, o matador e a vítima. No vão do teu ser deste palco e atos a vários.
ó Álvaro, Pessoa meu, feriste-me, feriste-me! E não mais sei como convalescer-me.
Terminei este pequeno livro reconhecendo um par de olhos melancólicos, como manhãs nubladas, numa multidão de proporções oceânicas. Reconheci, sim. E chorei.